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Avaliação do banco de sementes de uma área em processo de recuperação em cerrado campestre

Evaluation of the seed bank in a campestre cerrado area under recovery

Resumos

Os estudos que tratam da interferência de plantas daninhas em agroecossistemas têm produzido resultados de pesquisa abundantes para campos de produção de grãos e pastagens; contudo, poucos trabalhos relatam o efeito da presença desse grupo de plantas em áreas degradadas isoladas para recuperação. Diante disso, este trabalho teve como objetivo avaliar a influência do banco de sementes no solo no processo de restauração ambiental de uma área representativa de cerrado campestre pela presença de plantas daninhas gramíneas. Para avaliação do banco de sementes, foram selecionados três ambientes: dois degradados e um ambiente-referência (conservado) de cerrado campestre. O procedimento de coleta das amostras de solo ocorreu em duas estações (seca e chuvosa), e as amostras foram avaliadas em 300 dias. Foram verificadas, durante a avaliação, apenas seis espécies nativas, e somente duas com hábito de vida arbóreo. A maior parte das sementes germinadas para os ambientes degradados, em ambas as coletas, foram identificadas como invasoras na área de estudo. Nesse sentido, o banco de sementes do solo local não é suficiente para que haja recuperação por meio da sucessão ecológica dessas áreas, sendo recomendado o uso de técnicas visando acelerar a restauração desses ambientes.

restauração de áreas degradadas; plantas daninhas; Melinis minutiflora


Studies dealing with the interference of weeds in agro-ecosystems have obtained abundant results for grain production fields and pastures. However, few studies have reported the effect of the presence of such a group of isolated plants on degraded areas under recovery. Thus, this study aims to evaluate the influence of the soil seed bank on the process of environmental restoration of a representative area of campestre cerrado due to the presence of weed grasses. To assess the seed bank, three environments were selected: two degraded environments and one reference-environment (preserved) of campestre cerrado. Soil samples were collected in two seasons (dry and wet), and evaluated in three hundred days. During the evaluation, only six native species and only two species with a habit of arboreal life were found. Most of the seeds which were germinated for the degraded environments in both collections were identified as invasive in the study area. In this sense, the local soil seed bank is not considered sufficient for recovery through ecological succession in these areas, and the use of techniques to accelerate the restoration of these environments is strongly recommended.

restoration of degraded areas; weeds; Melinis minutiflora


ARTIGOS

Avaliação do banco de sementes de uma área em processo de recuperação em cerrado campestre

Evaluation of the seed bank in a campestre cerrado area under recovery

Machado, V.M.I; Santos, J.B.II; Pereira, I.M.II; Lara. R.O.III; Cabral, C.M.III; Amaral, C.S.I

IMestres em Ciência Florestal pela Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri – PPGCF/UFVJM,<viniciusfloresta@hotmail.com>, <cristiayamaral@hotmail.com>

IIDocentes permanentes, PPGCF/UFVJM, <barbosa@pq.cnpq.br>, <imarinhopereira@gmail.com>

IIIMestrandos, PPGCF/UFVJM, <rodrigolara1987@hotmail.com>, <mtchells@yahoo.com.br>

RESUMO

Os estudos que tratam da interferência de plantas daninhas em agroecossistemas têm produzido resultados de pesquisa abundantes para campos de produção de grãos e pastagens; contudo, poucos trabalhos relatam o efeito da presença desse grupo de plantas em áreas degradadas isoladas para recuperação. Diante disso, este trabalho teve como objetivo avaliar a influência do banco de sementes no solo no processo de restauração ambiental de uma área representativa de cerrado campestre pela presença de plantas daninhas gramíneas. Para avaliação do banco de sementes, foram selecionados três ambientes: dois degradados e um ambiente-referência (conservado) de cerrado campestre. O procedimento de coleta das amostras de solo ocorreu em duas estações (seca e chuvosa), e as amostras foram avaliadas em 300 dias. Foram verificadas, durante a avaliação, apenas seis espécies nativas, e somente duas com hábito de vida arbóreo. A maior parte das sementes germinadas para os ambientes degradados, em ambas as coletas, foram identificadas como invasoras na área de estudo. Nesse sentido, o banco de sementes do solo local não é suficiente para que haja recuperação por meio da sucessão ecológica dessas áreas, sendo recomendado o uso de técnicas visando acelerar a restauração desses ambientes.

Palavras-chave: restauração de áreas degradadas, plantas daninhas, Melinis minutiflora.

ABSTRACT

Studies dealing with the interference of weeds in agro-ecosystems have obtained abundant results for grain production fields and pastures. However, few studies have reported the effect of the presence of such a group of isolated plants on degraded areas under recovery. Thus, this study aims to evaluate the influence of the soil seed bank on the process of environmental restoration of a representative area of campestre cerrado due to the presence of weed grasses. To assess the seed bank, three environments were selected: two degraded environments and one reference-environment (preserved) of campestre cerrado. Soil samples were collected in two seasons (dry and wet), and evaluated in three hundred days. During the evaluation, only six native species and only two species with a habit of arboreal life were found. Most of the seeds which were germinated for the degraded environments in both collections were identified as invasive in the study area. In this sense, the local soil seed bank is not considered sufficient for recovery through ecological succession in these areas, and the use of techniques to accelerate the restoration of these environments is strongly recommended.

Keywords: restoration of degraded areas, weeds, Melinis minutiflora.

INTRODUÇÃO

A crescente demanda pelos recursos naturais – que é motivo do cenário atual das grandes áreas degradadas em todo o país – tem levado à extinção de várias espécies mesmo antes de elas serem reconhecidas. Constantes processos de corte e queima da vegetação para fins agropecuários, dessecação de grandes áreas com glyphosate e exploração de madeira e minerais alteram a estrutura natural do ecossistema. Segundo Caldato et al. (1996), o que era para ser um processo lento e equilibrado, a ação antrópica alterou esse equilíbrio e acelerou bruscamente o processo de extinção das espécies.

Os estudos que tratam da interferência de plantas daninhas e agroecossistemas têm produzido resultados de pesquisa abundantes para campos de produção de grãos e pastagens, porém poucos trabalhos relatam o efeito da presença desse grupo de plantas em áreas degradadas isoladas para recuperação.

O bioma cerrado tem apresentado maior pressão antrópica, decorrente principalmente da atividade pecuária (Sano et al., 2002). O efeito dessa antropização sobre as espécies encontradas em áreas originalmente sob vegetação de cerrado pode ser analisado sob o ponto de vista ecológico, como as perdas da riqueza das espécies nativas (Felfili & Silva Júnior, 2001), e o de produção agropecuária, na qual as espécies nativas que se mantiveram na área agricultável podem ser consideradas invasoras e, assim, comprometer a produtividade agrícola (Pott et al., 2006).

O principal meio de regeneração das espécies, após um distúrbio, dá-se por meio do banco de sementes do solo. Esse banco atua como um reservatório de diversidade genética vegetal que pode ser usado para restaurar zonas perturbadas ou recuperar espécies da flora que estão em via de extinção (Pérez et al., 2001); todavia, é um recurso que deve ser avaliado quanto à sua composição, para evitar a infestação de plantas exclusivamente ruderais.

O banco de sementes no solo é constituído de todas as sementes viáveis nesse compartimento ou associadas à serrapilheira para uma determinada área num dado momento (Simpson et al.,1989). É um sistema dinâmico, com entrada de sementes trazidas pela chuva de sementes e dispersão, podendo ser transitório, com sementes que germinam até um ano depois do início da dispersão, ou persistente, com sementes que permanecem no solo por mais de um ano. Essa persistência corresponde, segundo Simpson et al. (1989), uma reserva do potencial genético acumulado.

A variabilidade e densidade botânica de um povoamento de sementes no solo, em um dado momento, são o resultado do balanço entre entrada de novas sementes e perda por germinação, deterioração, parasitismo, predação e transporte (Carmona, 1992; Price et al., 1997).

Avaliando a composição do banco de sementes, pode-se predizer a composição inicial da vegetação após um distúrbio. As informações sobre o banco de sementes podem subsidiar investigações sobre três aspectos da vegetação: sua composição, a abundância relativa das espécies recentemente instaladas e o potencial de distribuição de cada espécie (Welling et al., 1988). A composição do banco de sementes é função da composição das sementes produzidas pela vegetação e da longevidade das sementes de cada espécie, sob as condições locais (van der Valk & Pederson, 1989).

A adoção de técnicas de manejo a partir da utilização de banco de sementes pode ser eficaz na restauração de áreas degradadas, porém, para se obter sucesso, é preciso conhecê-lo (Costalonga et al., 2006). No entanto, sua utilização não elimina as incertezas da germinação e sobrevivência das plântulas, uma vez que estas estão associadas às condições ambientais determinantes do sucesso ou não do plano de revegetação (van der Valk & Pederson, 1989).

A perturbação contínua de uma área pode levar ao esgotamento progressivo do banco de sementes, tornando o local com restrições para regenerar na primeira fase da sucessão. Locais muito abertos e ensolarados propiciam a entrada de propágulos de plantas daninhas gramíneas, que impedem a regeneração natural da floresta (Nogueira & Nogueira, 1991). Nóbrega et al. (2009) observam que, em áreas de florestas, capoeiras e pastos perturbados, foi evidenciado que a diversidade de espécies arbóreas no banco de sementes e, principalmente, das espécies dos estádios mais avançados de sucessão foi reduzida.

O presente trabalho teve como objetivo avaliar a influência do banco de sementes do solo no processo de restauração ambiental de uma área perturbada pela presença de plantas daninhas gramíneas, localizada no Alto do Jequitinhonha, Minas Gerais.

MATERIAL E MÉTODOS

A área estudada tem tamanho aproximado de 1 ha e está localizada no município de Diamantina, região do Alto Jequitinhonha, no Complexo da Serra do Espinhaço, Estado de Minas Gerais, situado nas coordenadas geográficas de 18º25'53"S de latitude e 43º60'36"W de longitude, a uma altitude de 1.130 m. O regime climático é tipicamente tropical – Cwb na classificação de Köppen –, caracterizado por verões brandos e úmidos (outubro a abril) e invernos mais frescos e secos (junho a agosto). A precipitação pluvial média anual varia de 1.250 a 1.550 mm e a temperatura média anual situa-se na faixa de 18º a 19 ºC, sendo predominantemente amena durante todo o ano, devido às superfícies mais elevadas dessa serra. A umidade relativa do ar é quase sempre elevada, revelando médias anuais de 75,6%.

A vegetação predominante na área de estudo pode ser caracterizada como cerrado campestre (Ribeiro & Walter, 2008).

A área foi isolada em 2002, procedendo-se posteriormente à restauração ambiental por meio do plantio ao acaso de mudas de espécies exóticas locais (alóctones), como Acacia mangium, Bauhimia variegata, Cedrela fissilis, Ceiba speciosa, Copaifera langsdorffii, Ficus beijamina, Jacaranda mimosifolia, Handroanthus impetiginosus, Handroanthus serratifolius, entre outras, concomitantemente com a semeadura de algumas espécies de gramíneas, como Melinis minutiflora e Urochloa decumbens, com o simples objetivo de recobrir o solo e protegê-lo contra o processo erosivo.

Para avaliação do banco de sementes na área de estudo, foram selecionados três ambientes, sendo dois degradados e um ambiente-referência (conservado) de cerrado campestre, em área adjacente ao estudo. Em cada ambiente foram coletadas 16 amostras com o auxílio de um gabarito (estrutura metálica vazada com 25 x 25 x 5 cm), compondo por amostra um volume total de 0,003125 m³ e uma área de 0,0625 m². As amostras foram acondicionadas em sacos plásticos pretos, identificados por etiquetas, e posteriormente transportadas para o Centro Integrado de Propagação de Mudas da Engenharia Florestal (CIPEF), da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri – UFVJM, onde foram passadas em uma peneira grossa (4,0 mm), para retirar tocos, raízes e torrões, sendo posteriormente homogeneizadas. As amostras de solo foram depositadas em bandejas plásticas de 0,004106 m³, contendo 2,0 cm de areia esterilizada em estufa de secagem com circulação e renovação de ar a 128 ºC por uma hora, e perfuradas para facilitar a drenagem do solo. Em seguida, elas foram acondicionadas em casa de vegetação sob irrigações diárias, controladas no decorrer do experimento, mantendo-se a sua umidade próxima à capacidade de campo. Também foram depositadas dentro da casa de vegetação bandejas controle com areia esterilizada, para verificar a possibilidade de contaminação com sementes externas dentro da casa de vegetação.

A avaliação do banco de sementes do solo foi realizada por meio do método indireto, através da identificação das plântulas originadas da germinação das sementes presentes nas amostras (Baskin & Baskin, 1989).

O procedimento de coleta das amostras de solo para o desenvolvimento do presente estudo ocorreu em duas etapas: estação seca (julho de 2010), com temperatura média máxima mensal de 21,8 ºC e precipitação média de 1,8 mm; e estação chuvosa (dezembro de 2010), apresentando temperatura média máxima mensal de 26,6 ºC e precipitação média de 294,8 mm. Assim, a contagem das plântulas oriundas do banco de sementes do solo foi feita por um período de dez meses, totalizando 22 dias de contagem e 300 dias de avaliação.

No último dia de contagem de ambas as coletas, foi realizada a identificação das plântulas emergidas, por meio de chave botânica, consultas a herbários e literatura.

Para a análise florística do banco de sementes, foram utilizados os seguintes parâmetros: índice de diversidade de Shannon-Weaver (H'), índice de equabilidade de Pielou (J) e índice de similaridade de Sorensen (SO).

A avaliação da emergência das plântulas foi feita durante um período de 100 dias após a instalação do experimento. O índice de velocidade de emergência (IVE) (Nakagawa, 1999) e o tempo médio de germinação (Tm) (Edmond & Drapala, 1965) foram calculados para o banco de sementes de cada ambiente, conforme as expressões descritas a seguir.

em que: IVE = índice de velocidade de emergência; N1 = número de plântulas emergidas na primeira contagem; D1 = número de dias para a primeira contagem; Nn = número de plântulas emersas na última contagem; e Dn = número de dias para a última contagem.

em que Tm = tempo médio necessário para atingir a germinação máxima; e G1, G2 e Gn = número de sementes germinadas nos tempos T1, T2 e Tn, respectivamente.

Os dados de IVE e Tm foram submetidos a testes de normalidade, homogeneidade e variância pelo software Estatística 7.0. As médias de IVE e Tm foram submetidas ao teste de Tukey a 5% de probabilidade.

Os dados foram analisados considerando-se o delineamento inteiramente ao acaso (DIC), em esquema fatorial 3x2, sendo estudado o efeito dos três ambientes utilizados e das duas épocas de coleta do banco de sementes.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Durante a condução do experimento, foi garantida a não contaminação das bandejas avaliadas, uma vez que não foi observada emissão de plântulas nas bandejas controle.

Na Tabela 1, observa-se a relação das espécies encontradas no estudo do banco de sementes e suas respectivas famílias botânicas para os três ambientes, em ambas as épocas de coleta.

Foram encontradas 43 espécies em 17 famílias botânicas para as áreas de estudo, e uma espécie não foi possível identificar. Somente Alternanthera tenella, Hypochoeris brasiliensis, Sida santaremnensis, Microlicia sp., Spermacoce latifola e Lavoisiera sp. são nativas para a área em questão; de todas as espécies listadas, somente Vernonanthura phosphorica e Tibouchina granulosa possuem forma de vida arbórea. A baixa densidade de sementes de espécies arbóreas encontradas no banco de sementes pode ser explicada pelo fato de as áreas em estudo estarem em processo inicial de sucessão ecológica e não possuírem árvores matrizes circundando-as, nem fragmentos conservados no entorno, o que dificulta a dispersão dos frutos. Saulei & Swaine (1988) estudaram o estabelecimento do banco de sementes no solo pela chuva de sementes durante dois anos em Nova Guiné e concluíram que em floresta primária esse banco é constituído principalmente por sementes depositadas por plantas matrizes anteriormente presentes na floresta. Miranda Neto et al. (2010) não constataram a germinação de espécies arbustivo-arbóreas em clareiras testemunha, demonstrando que, possivelmente, as sementes oriundas da chuva de sementes do entorno não estavam conseguindo se estabelecer no local.

Vale ressaltar que existe tendência de redução na densidade de espécies herbáceas no banco de sementes e aumento de sementes arbustivas e arbóreas com o avanço na sucessão em florestas secundárias (Baider et al., 2001; Dalling, 2002), uma vez que, à medida que as espécies arbóreas vão se estabelecendo nesses locais, vão proporcionar maior sombreamento na área; como a maioria das espécies herbáceas é pioneira, estas tendem a desaparecer. Para isso, o enriquecimento desse banco de sementes depende, entre outros fatores, da proximidade com fragmentos conservados no entorno da área, que facilita a dispersão de sementes. Também podem ser adotadas técnicas de semeadura direta no banco de sementes, com espécies arbóreas desejáveis na restauração ambiental, acelerando assim o processo.

Na Tabela 2 encontram-se o número total de sementes germinadas e a densidade total de sementes (sementes m²), no banco de sementes de cada ambiente, para a coleta realizada nos períodos seco (agosto de 2010) e chuvoso (dezembro de 2010).

Para a estação seca, observa-se que 3.019 sementes germinaram no ambiente 1 e 518 no ambiente 2. Já para a estação chuvosa, observa-se que 2.614 germinaram no ambiente 1, 2.771 no ambiente 2 e 75 no ambiente 3. A maior parte das sementes germinadas para os ambientes 1 e 2 (ambientes degradados), em ambas as épocas de coleta, foram identificadas como invasoras na área de estudo; destas, as espécies mais representativas foram Melinis minutiflora, Urochloa decumbens e Cyperus sp. Juntas, as famílias Cyperaceae e Poaceae representam, para as duas estações de coleta, 19,25 e 45,28% dos indivíduos regenerados, respectivamente, contribuindo com 64,03% do total de indivíduos coletados. Características inerentes à sua biologia contribuíram para seu sucesso como invasoras em ambiente de cerrado perturbados ou degradados: são heliófilas e possuem metabolismo C4, sendo adaptadas para colonizar áreas abertas e ensolaradas, como os campos e cerrados brasileiros; têm alta eficiência fotossintética e na utilização dos nutrientes, sobrevivendo em solos menos férteis; apresentam alta taxa de crescimento, rebrotamento e regeneração, além de alta tolerância à herbivoria; sua eficiência reprodutiva se deve ao ciclo reprodutivo rápido, à intensa produção de sementes com alta viabilidade, que formam um banco de sementes denso, à alta capacidade de dispersão por sementes anemocóricas e por reprodução vegetativa e à alta capacidade de germinação. Essas características permitem a essas espécies um comportamento oportunista, que permite a rápida recolonização de áreas antropizadas, possibilitando competir com vantagem e deslocar espécies nativas do cerrado (Coutinho, 1982; Baruch et al., 1985; Pivello et al., 1999).

Em estudo realizado por Rondon Neto et al. (2011), as famílias botânicas com maior número de indivíduos regenerados foram Cyperaceae (54,0%) e Poaceae (23,9%), as quais contribuíram com 77,9% do total de indivíduos.

Segundo Grime (1979), plantas ruderais habitam áreas de alta intensidade de distúrbio, bastante irrigadas e adubadas, possuem rápido ciclo de desenvolvimento, alta produção de propágulos e se caracterizam por sua alta agressividade ao ecossistema. Segundo Souza et al. (2006), a ausência ou não continuidade de um dossel nessas áreas facilita a entrada de sementes de espécies invasoras e sua incorporação no solo.

O número médio de sementes m² encontrado na coleta em período chuvoso, para os ambientes degradados 1 e 2, foi de 3.802,18 e 4.030,55 sementes m², respectivamente. Esses valores são superiores em comparação aos de outros trabalhos com banco de sementes mesmo em área de pasto, como os de Araújo et al. (2001), que encontraram uma densidade de 2.848 sementes m-2 de sementes de gramínea em área de pasto na Amazônia ocidental, e Randon Neto & Silva, que avaliaram o banco de sementes de um remanescente florestal e duas áreas de pastagens, com idades de 17 e 27 anos, no município de Alta Floresta-MT e encontraram densidades de sementes variando de 89 a 448 sementes m-2.

Verifica-se baixa densidade de sementes germinadas para o ambiente 3 (Tabela 2); na coleta da estação seca não houve germinação nele e, para a coleta da estação chuvosa, 38,67% das sementes germinadas foram de espécies nativas para a área de estudo, a saber: Lavoisiera sp., Microlicia sp., Spermacoce latifola e Sida santaremnensis. A baixa densidade de germinação do ambiente 3, comparada à dos demais, pode ser explicada pelo fato de esse ambiente possuir considerável estado de conservação, inibindo a entrada de espécies invasoras na área, como proposto pelo modelo de inibição descrito por Connell & Slatyer (1977). O essencial nesse modelo é que as espécies invasoras iniciais somente serão capazes de colonizar esses ambientes, uma vez que distúrbios locais têm progressivamente levado à morte das espécies nativas (Ward & Jennings 1990). Se os distúrbios são infrequentes, as espécies dominantes ocupam os recursos e eliminam fracos competidores (Connell, 1978).

A menor densidade observada para a estação seca no ambiente 2 (Figura 1) deve-se ao fato de ele possuir menor número de indivíduos de capim-gordura, quando comparado ao ambiente 1. Isso porque, no período da coleta, as plantas de capim-gordura apresentavam-se em pleno estádio de dispersão de sementes; logo, era esperado encontrar maior número de sementes possivelmente viáveis para o ambiente 1.


Na Figura 2 é apresentada a regressão pelo método dos mínimos quadrados ordinários para a germinação cumulativa do número de sementes nos três ambientes, para as duas épocas de coleta. Nota-se que houve inversão no número de sementes germinadas para os ambientes degradados (1 e 2) nas diferentes épocas de coleta, sendo esse fenômeno explicado pela descontinuidade de germinação das espécies entre os ambientes estudados.


A densidade do banco de sementes varia muito de um local para outro, mas tende a ser maior em florestas secundárias, onde o dossel mais aberto possibilita maior densidade de espécies pioneiras, cujas sementes possuem dormência e formam banco persistente (Baider et al., 1999).

Os índices de diversidade de Shannon e o índice de equabilidade de Pielou, para os três ambientes de estudo, são apresentados na Tabela 3. Observa-se maior índice de diversidade de Shannon-Weaver (H') para o ambiente 3 (ambiente-referência), o que indica o seu maior grau de conservação. A equabilidade de Pielou (J'), para o ambiente 3, foi elevada comparada à dos demais ambientes, indicando que nesse ambiente há maior número de indivíduos dominantes para a área estudada.

Apesar da dificuldade de comparações de índices de diversidade, os valores encontrados neste trabalho são similares aos reportados para banco de sementes. Em áreas degradadas de cerrado sensu stricto, Ikeda et al. (2008) encontraram valores de diversidade para áreas de cerrado pós-ocorrência do fogo e área de lavoura de 1,27 e 1,94, respectivamente. Já em remanescente natural de mata ciliar ripária, Nóbrega et al. (2009) encontraram um índice de diversidade de 2,25 e equabilidade de 0,75 – valores próximos aos encontrados para o ambiente 3 (ambiente-referência).

A similaridade entre os ambientes para as diferentes épocas de coleta é mostrada na Tabela 4. Observa-se que não foi possível fazer analogias para o ambiente 3 na coleta da estação seca, pois para ele não houve germinação de nenhum indivíduo. De acordo com Mueller-Dombois & Ellenberg (1974), podem-se considerar duas comunidades floristicamente similares quando o índice de Sorensen é igual ou superior a 0,50, o que foi evidenciado com os valores de 0,810 entre os ambientes 1 e 2 para a coleta da estação seca e de 0,941 entre os mesmos ambientes para a coleta da estação chuvosa. A similaridade entre os ambientes 1 e 2 pode ser explicada pelo fato de eles se apresentarem localizados próximos geograficamente e, também, por suas semelhanças quanto ao histórico de degradação.

O efeito em nível de interação apresentou-se significativo somente para o tempo médio necessário para atingir a germinação máxima (Tm) (Tabela 5); já o índice de velocidade de emergência (IVE) mostrou diferenças significativas para os ambientes e épocas de coleta (estações seca e chuvosa).

Nota-se, nas Tabelas 5 e 6, que o IVE e o Tm para a estação chuvosa diferem significativamente a 5% de probabilidade do IVE e Tm para a estação seca, comprovando a maior emergência das plântulas – principalmente as invasoras – no período chuvoso. Vale ressaltar que as quatro espécies arbóreas identificadas no presente estudo germinaram no banco de semente da coleta da estação chuvosa. Assim, a estação chuvosa é a estação recomendada para a coleta do banco quando se tem o objetivo de utilizá-lo na recuperação de áreas degradadas, porém outros fatores devem ser observados para a tomada de decisão, como o número de sementes de espécies invasoras contidas no banco de sementes.

Na Tabela 6 é apresentado o desdobramento do grau de liberdade da interação entre ambiente e estação de coleta, para a variável Tm do banco de sementes.

Cabe ressaltar que em áreas degradadas com grande presença de gramíneas exóticas, como a do presente estudo, o simples isolamento da área não garante a regeneração natural, sendo necessário proceder ao manejo adequado dessas espécies daninhas e utilizar outros métodos de recuperação para restauração do ambiente. A utilização de um banco de sementes pode ser uma técnica viável, porém ele deve ser avaliado antes do seu uso. Um banco de sementes "rico" em espécies arbóreas pode até mesmo inibir o desenvolvimento das gramíneas exóticas. Em trabalho realizado por Miranda Neto et al. (2010), a cobertura das clareiras com o banco de sementes do solo inibiu o desenvolvimento de Melinis minutiflora.

Conclui-se que o banco de sementes estudado é formado basicamente por espécies herbáceas com caráter invasor, não contendo sementes de espécies arbustivo-arbóreas depositadas. Nesse sentido, o banco de sementes do solo local não é suficiente para que haja recuperação por meio da sucessão ecológica dessas áreas, sendo recomendando o uso de técnicas visando acelerar a restauração desses ambientes.

AGRADECIMENTO

Os autores agradecem à Fundação de Amparo à Pesquisa no Estado de Minas Gerais/FAPEMIG, pelo apoio Financeiro à realização da Pesquisa.

LITERATURA CITADA

Recebido para publicação em 27.6.2012 e aprovado em 16.9.2012.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    17 Abr 2013
  • Data do Fascículo
    Jun 2013

Histórico

  • Recebido
    27 Jun 2012
  • Aceito
    16 Set 2012
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