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Segurança do paciente na administração de medicamento intramuscular em pediatria: avaliação da prática de enfermagem

Seguridad del paciente en la administración de medicamentos intramusculares en pediatría: evaluación de la práctica en enfermería

Resumo

OBJETIVOS

Avaliar a prática de Enfermagem quanto à administração de medicamento por via intramuscular na pediatria.

MÉTODOS

Descritivo, observacional, quantitativo, desenvolvido mediante 327 observações da administração de medicamento intramuscular em um hospital pediátrico de nível secundário em Fortaleza-Ceará. Para as observações utilizou-se um check-list composto por 25 ações: cinco realizadas antes da administração de medicamentos, quatorze durante e seis após o procedimento.

RESULTADOS

Constatou-se que nenhuma das ações desenvolvidas antes do procedimento de administração de medicamento intramuscular alcançou desempenho satisfatório. Para as ações realizadas durante o procedimento, averiguou-se desempenho satisfatório em seis ações (42,8%). Na etapa após o procedimento identificou-se desempenho satisfatório em três ações (50%).

CONCLUSÕES

Foram identificadas fragilidades que interferem na consolidação de práticas de segurança na administração de medicamento intramuscular em pacientes pediátricos.

Palavras-chave:
Enfermagem pediátrica; Injeções intramusculares; Segurança do paciente

Resumen

OBJETIVO

Evaluar la práctica de enfermería en cuanto a la administración de medicamentos por vía intramuscular en pediatría.

MÉTODO

Observacional, cuantitativo, desarrollado a través 327 observaciones de la administración de medicamentos intramusculares en un hospital pediátrico de nivel secundario, en Fortaleza-CE. Para las observaciones, se utilizó un check-list compuesto por 25 acciones: cinco realizadas antes de la administración de medicamentos, catorce durante su ingesta, y seis después del procedimiento.

RESULTADOS

se constató que ninguna de las acciones desarrolladas antes del procedimiento de la administración de medicamentos intramusculares logró un desempeño satisfactorio. Para las acciones realizadas durante el procedimiento, se verificó un desempeño satisfactorio en seis acciones (42,8%). En la etapa después del procedimiento se identificó un desempeño satisfactorio en tres acciones (50%).

CONCLUSIÓN

se identificaron debilidades que interfieren en la consolidación de las prácticas de seguridad en la administración de medicamentos intramusculares en pacientes pediátricos.

Palabras clave:
Enfermería pediátrica; Inyecciones intramusculares; Seguridad del paciente

Abstract

OBJECTIVE

To evaluate the nursing care regarding the intramuscular medication administration procedure in pediatrics.

METHODS

It was an observational and quantitative study performed in a pediatric hospital located in the city of Fortaleza, in Ceará, Brazil. The data collection was carried out through the observation of 327 intramuscular medication administration procedures. An observational checklist composed by 25 steps was used to collect data. The performance of the 25 steps of the checklist was divided as follows: (1) five steps were applied before the procedure of intramuscular medication administration; (2) fourteen steps during the procedure; (3) six steps after the procedure.

RESULTS

It was found that none of the five steps carried out before the intramuscular medication administration procedure were satisfactory performed. Regarding the fourteen steps applied during the procedure, six of them were satisfactory performed (42.8%). With regards to the six steps applied after the procedure, three of them were satisfactory performed (50%).

CONCLUSIONS

Fragilities that negatively impact the intramuscular medication administration procedures in pediatric patients were identified in this study.

Keywords:
Pediatric nursing. Injections; intramuscular. Patient safety

INTRODUÇÃO

A segurança do paciente em meio hospitalar tem gerado um amplo debate de repercussão mundial. Nos últimos anos têm sido crescente as iniciativas para a promoção da segurança e da melhoria da qualidade na assistência à saúde, gerando a otimização dos resultados nos diversos serviços de saúde oferecidos à sociedade11 Oliveira RM, Leitão IMTA, Silva LMS, Figueiredo SV, Sampaio RL, Gondim MM. Estratégias para promover segurança do paciente: da identificação dos riscos às práticas baseadas em evidências. Esc Anna Nery. 2014;18(1):122-9..

A Organização Mundial da Saúde (OMS), em preocupação com a segurança do paciente, elaborou mecanismos para a melhoria na qualidade do cuidado a fim de proporcionar a segurança do paciente. Com isso, foram criadas seis metas internacionais de segurança do paciente: identificar os pacientes corretamente; melhorar a efetividade da comunicação entre profissionais da assistência; melhorar a segurança de medicações de alta vigilância; assegurar cirurgias com local de intervenção correto, procedimento correto e paciente correto; reduzir o risco de infecções associadas aos cuidados de saúde; e reduzir o risco de lesões aos pacientes, decorrentes de quedas22 Cavalcante AKCB, Rocha RC, Nogueira LT, Avelino FVSD, Rocha SS. Cuidado seguro ao paciente: contribuições da Enfermagem. Rev Cubana Enferm. 2015;31(4):1-13..

A partir da criação das metas internacionais, o Ministério da Saúde do Brasil aprovou e instituiu seis Protocolos Básicos para a Segurança do Paciente: identificação do paciente; prática de higiene das mãos em serviços de saúde; cirurgia segura; prevenção de úlcera por pressão; prevenção de quedas; e segurança na prescrição, uso e administração de medicamentos33 Ministério da Saúde (BR). Portaria n° 1.377 de 9 de julho de 2013 Aprova os Protocolos de Segurança do Paciente. Diário Oficial da União [da] República Federativa do Brasil. 2013 jul 10;150(131 Seção 1):47.-44 Ministério da Saúde (BR). Portaria n° 2.095 de 24 de setembro de 2013 Aprova os Protocolos de Segurança do Paciente. Diário Oficial da União [da] República Federativa do Brasil. 2013 set 25;150(186 Seção 1):113.. Neste estudo será contemplado o protocolo de segurança na prescrição, uso e administração de medicamentos, pois mesmo com a implementação desses protocolos, ainda é evidente a presença de erros no processo de administração de medicamentos, os quais podem ser prejudiciais ao paciente, aos familiares, aos profissionais e ao serviço de saúde55 Ministério da Saúde (BR), Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Anexo 03: protocolo de segurança na prescrição, uso e administração de medicamentos. Brasília (DF); 2013..

A segurança do paciente apresenta um desafio ainda maior quando se refere à pacientes pediátricos, por se tratar de uma população mais vulnerável ao erro de medicação devido as suas características fisiológicas peculiares e a indisponibilidade de formas farmacêuticas adequadas no mercado, sendo isso notório ao ser constatado que cerca de 80% dos fármacos destinados para uso em adultos são comercializados para administração em crianças, incluindo recém-nascidos66 Baptista SCF. Análise de erros nos processos de preparo e administração de medicamentos em pacientes pediátricos [dissertação]. Rio de Janeiro (RJ): Fundação Oswaldo Cruz; 2014.-77 Harada MJCS, Chanes DC, Kusahara DM, Pedreira MLG. Segurança na administração de medicamentos em pediatria. Acta Paul Enferm. 2012;25(4):639-42..

O sistema de medicação consiste em ações planejadas e implementadas pelos profissionais de saúde a fim de restabelecer ou manter a saúde por meio do uso de fármacos, compreendendo, para isso, quatro processos: prescrição, dispensação, distribuição e administração88 Matias EO. Avaliação da prática de enfermagem no processo de administração de medicamento intravenoso na pediatria [dissertação]. Fortaleza (CE): Universidade Federal do Ceará; 2015.. Na realidade brasileira, a equipe de Enfermagem é legalmente responsável pela administração de medicamentos, que é compreendida como ato de dar ou aplicar ao paciente um medicamento previamente prescrito, correspondendo à última etapa do sistema de medicação, ou seja, a oportunidade final de prevenir um erro no processo de tratamento do paciente99 Abreu DPG, Santos SSC, Silva BT, Ilha S. Responsabilidades éticas e legais do enfermeiro em relação à administração de medicamentos para pessoas idosas. Rev Enferm Cent O Min. 2015;5(3):1905-14..

Estudos demonstraram que os erros que ocorrem durante a administração de medicamentos, podem ser evitáveis, o que torna potencial o sistema de medicação quanto à promoção da segurança do paciente, relacionando automaticamente à equipe de Enfermagem1010 Silva LD, Camerini FG. Análise da administração de medicamentos intravenosos em hospital da rede sentinela. Texto Contexto Enferm. 2012;21(3):633-41.. Esse fato é ainda mais impactante quando se trata da assistência em pediatria, visto que uma revisão sistemática acerca de erros de medicação em crianças evidenciou que o processo de administração de medicamentos foi o que apresentou maior frequência de erros, com taxa de 72 a 75%, sendo assim um desafio para toda instituição e equipe de saúde promover mudanças na cultura organizacional que permitam a reestruturação dos processos e a criação de estratégias de segurança, a fim de reduzir, até um mínimo aceitável, riscos e danos desnecessários associados à assistência77 Harada MJCS, Chanes DC, Kusahara DM, Pedreira MLG. Segurança na administração de medicamentos em pediatria. Acta Paul Enferm. 2012;25(4):639-42..

A administração de medicamentos injetáveis por via intramuscular (IM) é uma das práticas mais exercidas no cotidiano da Enfermagem. O uso das injeções por via IM nas unidades de urgência e emergência é muito comum para o alívio da dor, ou mesmo para obtenção de resultados terapêuticos mais rápidos. Isso envolve uma complexa série de considerações e de decisões relativas ao volume de solução injetada, ao medicamento a ser ministrado, à técnica, à escolha do local e do equipamento; além de considerações quanto à idade dos pacientes, compleição física e condições pré-existentes1111 Oliveira LF, Junqueira PS, Silva MR, Souza MM, Teles AS, Junqueira ALN. Ensaio clínico controlado randomizado: região ventro glútea, local alternativo para aplicação da benzilpenicilina benzatina G. Rev Eletrôn Enferm. 2015;17(4):1-7.-1212 Agac E, Gunes UY. Effect on pain of changing the needle prior to administering medicine intramuscularly: a randomized controlled trial. J Adv Nurs. 2011;67(3):563-8. .

É necessário estar atento aos diversos riscos que envolvem o processo de administração de medicamentos por meio da via intramuscular, como dor persistente no local, endurecimento, diminuição da sensibilidade, dano tecidual (lesão de nervos), hematomas, abscessos, reações alérgicas, lesões de necrose tecidual, contratura de grupos musculares, fibrose e até perda de amplitude de movimentos articulares1313 Portela JL, Piva JP. Midazolam versus diazepam para tratamento de estado de mal epiléptico em emergência pediátrica. Sci Med. 2011;21(4):184-90..

Portanto, para melhor aplicabilidade do processo de administração de medicamentos intramuscular na pediatria busca-se responder ao seguinte questionamento: como é realizada a técnica de administração de medicamento intramuscular na prática da Enfermagem pediátrica?

Acredita-se que a prática de Enfermagem na execução do processo de administração de medicamentos pela via intramuscular na pediatria apresenta divergências com o que é recomendado pela literatura científica no que se refere à técnica, à escolha do músculo e às orientações pré e pós-procedimento1414 Conselho Regional de Enfermagem de São Paulo (BR). Parecer COREN-SP 039/2012 - CT. PRCI n° 100.075/2012. Aplicação de injeção intramuscular. São Paulo; 2012..

Assim, teve-se como objetivo avaliar a prática da equipe de Enfermagem quanto ao desempenho do processo de administração de medicamentos por via intramuscular.

MÉTODOS

Trata-se de um estudo observacional, de abordagem quantitativa, desenvolvido em um hospital pediátrico de atenção secundária da rede municipal de Fortaleza-CE.

Nos estudos com delineamento transversal, as medições são realizadas em um único momento, não havendo período de acompanhamento, sendo úteis quando se deseja descrever variáveis e seus padrões de distribuição. Quando a abordagem é quantitativa, os resultados se apoiam em dados estatísticos, o que designa o caminho matemático de examinar o objeto de estudo1515 Polit DF, Beck CT. Fundamentos de pesquisa em enfermagem: métodos, avaliação e utilização. 7. ed. Porto Alegre: Artmed; 2011..

Foram realizadas 327 observações sistemáticas do processo de administração de medicamento por via intramuscular em crianças atendidas na referida instituição e que atenderam aos seguintes critérios de inclusão: ter idade < 10 anos, ter prescrição médica de medicamento para administração pela via intramuscular e ser realizada a administração do medicamento pela via intramuscular por um membro da equipe de Enfermagem na referida instituição.

Participaram do estudo 11 profissionais de Enfermagem que atuavam na unidade de administração de medicamentos por via intramuscular ou no setor de emergência da referida instituição, sendo um enfermeiro e dez técnicos de Enfermagem, que atenderam aos critérios de inclusão: ser profissional de Enfermagem que atue no processo de administração de medicamento por via intramuscular e estar em serviço nos dias que foram realizadas as observações. Já os critérios de exclusão foram: estar de férias, licença ou afastado de suas atividades no período da coleta de dados.

A coleta de dados, realizada no período de dezembro de 2014 a maio de 2015, nos turnos manhã, tarde ou noite, em dias aleatórios, contemplando seis turnos por semana, foi realizada por meio da observação não participante, direta e sistemática das ações antes, durante e após a administração do medicamento por meio de um instrumento do tipo check-list constituído por duas partes. A primeira parte do instrumento era composta pelos dados de identificação da criança e os dados referentes ao medicamento prescrito e ao material de escolha. As crianças observadas no processo de administração de medicamentos pela via intramuscular apresentaram as seguintes variáveis: gênero - feminino (43,1%) e masculino (56,9%); idade - lactente (18,8%), toddler (44,9%) e pré-escolar (20,6%); temperatura corporal - hipertérmicos (70,2%) e normotérmicos (29,8%).

A segunda parte era composta por vinte ações, sendo estas: apresentar-se para criança e/ou responsável; explicar o procedimento para criança e/ou responsável; acalmar a criança; conferir o paciente (prescrição ao nome); calçar os equipamentos de proteção individual (EPI) no momento da execução do procedimento (luvas, máscara e gorro); escolher músculo, conforme o seu tamanho e o volume do medicamento a ser administrado; palpar o local selecionado para injeção em busca de edema, sensibilidade ou grânulos; evitar áreas com cicatrizes, hematomas, escoriações ou infecções; posicionar a mão não dominante em local anatômico adequado e segurar o músculo firmemente; injetar rapidamente a agulha a um ângulo de 90°; aspirar a seringa, e se não for aspirado sangue, injetar lentamente o medicamento; retirar, suavemente, a agulha e soltar a pele; aplicar suave pressão ao local; orientar sobre evitar massagem no local; monitorar o paciente quanto à alteração sensorial ou motora no local da injeção ou distal a ele; descartar adequadamente os materiais utilizados durante o procedimento; documentar a administração do medicamento; registrar queixas e/ou reações adversas apresentadas pelo paciente, caso aconteça; e orientar paciente e/ou responsável quanto reações adversas e cuidados, caso necessários55 Ministério da Saúde (BR), Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Anexo 03: protocolo de segurança na prescrição, uso e administração de medicamentos. Brasília (DF); 2013.,1616 Hockenberry MJ, Wilson D. Wong: fundamentos de Enfermagem pediátrica. 8. ed. Rio de Janeiro: Elsevier; 2011..

Para cada ação, existiam quatro alternativas: sim, não, parcial e não se aplica (NA), que deveriam ser assinaladas pelas pesquisadoras no momento da observação do procedimento. Destaca-se que o instrumento foi validado por especialistas na área de saúde da criança quanto à relevância e à clareza dos itens com Índice de Validade de Conteúdo (IVC) superior a 0,8.

Os dados coletados na pesquisa foram armazenados em um banco de dados produzidos no Microsoft Excel do Windows 2010, processados e analisados com a estatística descritiva e de acordo com a literatura pertinente à temática. Para a análise de desempenho dos profissionais em cada ação do processo de administração de medicamentos por via intramuscular, foi adotado como satisfatório o desempenho cujo ponto de corte foi igual ou superior a 70%, conforme estudos anteriores88 Matias EO. Avaliação da prática de enfermagem no processo de administração de medicamento intravenoso na pediatria [dissertação]. Fortaleza (CE): Universidade Federal do Ceará; 2015..

A realização do estudo seguiu os preceitos éticos, respeitando as normas da Resolução nº 466/2012, do Conselho Nacional de Saúde, sendo aprovado pelo comitê de ética sob parecer nº 954.076. Destaca-se que todos os profissionais de Enfermagem e os acompanhantes foram orientados quanto aos objetivos do estudo e concordaram, por meio da assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), em serem observados durante a realização do processo de administração de medicamento intramuscular.

RESULTADOS

A distribuição dos dados acerca do processo de administração de medicamentos pela via intramuscular está exposta pelas ações antes, durante e após o procedimento, conforme as tabelas 1, 2 e 3, respectivamente.

Tabela 1
Distribuição das observações segundo as ações realizadas antes da administração de medicamento intramuscular. Fortaleza, CE, Brasil, 2015

Todas as ações realizadas antes da administração do medicamento foram consideradas insatisfatórias (< 70% de frequência), sendo a com menor incidência de realização a ação de apresentar-se para a criança e/ou responsável, em que esta só foi observada em 0,9% dos procedimentos, o que evidencia um déficit na comunicação entre o profissional e o paciente e/ou acompanhante, podendo desencadear erros durante o processo de administração de medicamento, resultando, consequentemente, em danos.

Tabela 2
Distribuição das observações, segundo as ações durante a administração de medicamento intramuscular. Fortaleza, CE, Brasil, 2015

Durante o procedimento em si, o resultado foi insatisfatório para as ações de escolher o músculo conforme o seu tamanho e o volume do medicamento a ser administrado (35,7%), palpar o local selecionado para injeção em busca de edema, sensibilidade ou grânulos (14,6%) e orientar sobre evitar massagem no local (5,8%).

A ação de evitar áreas com cicatrizes, hematomas, escoriações ou infecções foi realizada em 86,5% dos procedimentos, sendo que em 38,5% das observações a ação não se aplicava pelo fato da criança não apresentar cicatrizes ou hematomas.

Para as ações posicionar a mão não dominante em local anatômico adequado e segurar o músculo firmemente; injetar rapidamente a agulha a um ângulo de 90°; aspirar a seringa, e se não for aspirado sangue, injetar lentamente o medicamento, e se houver sangue, não injetar, retirar a agulha e começar novamente em outro local; retirar, suavemente, a agulha e soltar a pele; e aplicar suave pressão ao local, foram observados respectivamente, 98,7%, 99,0%, 82,5%, e 83,1%, sendo, desta forma, consideradas ações realizadas satisfatoriamente (> 70% de frequência).

Tabela 3
Distribuição das observações, segundo as ações após a administração de medicamento intramuscular. Fortaleza, CE, Brasil, 2015

As ações de monitorar o paciente quanto à alteração sensorial ou motora no local da injeção ou distal a ele (6,1%) e de orientar o paciente e/ou responsável quanto reações adversas e cuidados, caso necessários (7,3%), foram avaliadas como insatisfatórias (< 70% de frequência).

Em relação ao descarte adequado dos materiais utilizados e documentação da administração do medicamento realizada, foram observados em 97,5% e 99,3% das ações, respectivamente. A ação de registrar queixas e/ou reações adversas apresentadas pelo paciente, caso aconteça foi realizada em 99,6% das ações observadas, sendo considerada satisfatória.

DISCUSSÕES

A equipe de Enfermagem, em geral, tem por essência o cuidado ao ser humano, individualmente, na família ou na comunidade, desenvolvendo importantes ações por meio do cuidado, responsabilizando-se pelo conforto, acolhimento e bem-estar dos pacientes.

A administração de medicamento pela via intramuscular é um sistema de medicação que envolve variados processos e quando são realizados de forma indevida e com qualidade da técnica ineficaz ampliam a probabilidade de riscos para a segurança do paciente88 Matias EO. Avaliação da prática de enfermagem no processo de administração de medicamento intravenoso na pediatria [dissertação]. Fortaleza (CE): Universidade Federal do Ceará; 2015.. Quando se trata do paciente pediátrico a segurança do paciente apresenta um desafio ainda maior, pois essa é uma população mais suscetível aos erros de medicação devido as suas características fisiológicas particulares e a indisponibilidade de formas farmacêuticas apropriadas no mercado1717 Baptista SCF. Análise de erros nos processos de preparo e administração de medicamento em paciente pediátrico [dissertação]. Rio de Janeiro (RJ): Fundação Osvaldo Cruz; 2014..

O presente estudo apontou que das 327 observações, apenas em 0,3% os profissionais se apresentaram para as crianças e/ou responsáveis antes do procedimento, em 10,3% realizaram a explicação do procedimento para a criança e/ou responsável, e em 18,3% a criança foi acalmada, o que pode contribuir para a realização inadequada do procedimento, visto que ao esclarecer o que será realizado, o paciente, principalmente o pediátrico, torna-se mais colaborativo e menos ansioso, temeroso e inseguro88 Matias EO. Avaliação da prática de enfermagem no processo de administração de medicamento intravenoso na pediatria [dissertação]. Fortaleza (CE): Universidade Federal do Ceará; 2015..

A comunicação ao paciente é necessária para que ocorra o esclarecimento de questionamentos quanto ao motivo da indicação do fármaco, sua posologia e demais informações necessárias, o que pode auxiliar na prevenção de eventos adversos55 Ministério da Saúde (BR), Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Anexo 03: protocolo de segurança na prescrição, uso e administração de medicamentos. Brasília (DF); 2013.. No contexto pediátrico, a comunicação do procedimento auxilia no preparo físico e/ou emocional, poderá proporcionar a colaboração da criança durante o procedimento, além de evitar complicações durante a realização da administração do medicamento88 Matias EO. Avaliação da prática de enfermagem no processo de administração de medicamento intravenoso na pediatria [dissertação]. Fortaleza (CE): Universidade Federal do Ceará; 2015..

O Food and Drug Administration (FDA) avaliou os relatórios de erros de medicamentos que foram fatais e identificou que 16% das causas desses erros foram atribuídas à falha na comunicação. Portanto, a prescrição é um importante elo de comunicação escrita entre os profissionais de saúde, vista como o início de uma série de eventos dentro do processo de medicação, que resultará em uma administração segura ou não, de uma dose ao paciente1818 Jacobsen TF, Mussi MM, Silveira MPT. Análise de erros de prescrição em um hospital da região sul do Brasil. Rev Bras Farm Hosp Serv Saúde. 2015;6(3):23-6..

A respeito da ação de escolha do músculo conforme seu tamanho e volume do medicamento a ser administrado, foram verificados que em apenas 35,7% das observações os profissionais a realizaram, sendo que o músculo escolhido em 98,8% das ações foi o dorsoglúteo e a faixa de volume predominante foi de até 1,0 ml (68,5%). De acordo com a literatura, o músculo deve ser selecionado não se levando em conta apenas a sua capacidade, mas também a tolerância do paciente ao volume injetado, sendo o músculo dorsoglúteo indicado apenas para crianças com idade > 3 anos e para volumes inferiores a 2,0 ml em crianças com idade < 10 anos. Já para pacientes abaixo dessa faixa etária o músculo recomendado é o vasto lateral da coxa, que comporta até 1,5 ml em < 10 anos de idade1414 Conselho Regional de Enfermagem de São Paulo (BR). Parecer COREN-SP 039/2012 - CT. PRCI n° 100.075/2012. Aplicação de injeção intramuscular. São Paulo; 2012..

O desempenho da ação de descarte adequado do material utilizado durante o procedimento foi considerado satisfatória, estando essa ação presente em 97,5% das observações. Esse dado é importante, pois evidencia que os profissionais estão sujeitos a uma mínima possibilidade de se expor ao material biológico, pois o descarte inadequado do perfurocortante é a segunda causa de acidente de trabalho envolvendo profissionais de Enfermagem1919 Marziale MHP, Santos HEC, Trovó MEM. Consequências individuais e ocupacionais da exposição a material biológico entre trabalhadores de Enfermagem. Rev Enferm UERJ. 2015;23(4):449-54.. Desse modo, a distância entre o local do procedimento e o recipiente de descarte e a sua superlotação pode contribuir para a decisão do profissional pelo reencape, evidenciando a interferência de causas organizacionais no risco ocupacional. Vale lembrar que um setor de urgência e emergência exige condutas imediatas, logo, a estrutura organizacional deve favorecer e promover a segurança88 Matias EO. Avaliação da prática de enfermagem no processo de administração de medicamento intravenoso na pediatria [dissertação]. Fortaleza (CE): Universidade Federal do Ceará; 2015..

Quanto aos atos de documentar o medicamento administrado e de registrar queixas e/ou reações adversas apresentadas pelo paciente, caso elas acontecem, foi possível identificar a execução destas ações em 99,3% e 99,6% das observações, respectivamente. É imprescindível documentar, imediatamente após o procedimento dados importantes, como data, hora, via de administração, local e dose no registro da instituição, pois o registro rápido e correto evita acidentais repetições de administrações. Além disso, o registro adequado de queixas e/ou reações adversas apresentadas pelo paciente é imprescindível para uma boa comunicação interdisciplinar, pois auxilia os profissionais de saúde conhecer a condição do paciente após a administração do medicamento2020 Taylor CR, Lillis C, LeMone P, Lynn P. Fundamentos de enfermagem: a arte e a ciência do cuidado de enfermagem. 7. ed. Porto Alegre: Artmed ; 2014. p. 835.

CONCLUSÃO

O presente estudo permitiu avaliar as ações realizadas pela equipe de Enfermagem antes, durante e após a administração de medicamentos por via intramuscular na pediatria. No que refere aos achados, o estudo evidencia a existência de falhas durante o processo de administração, com destaque para as ações antes do procedimento, que não obtiveram nenhum resultado satisfatório. Com isso, esta pesquisa aponta implicações importantes relacionadas à prática de Enfermagem, o que contribuirá para a melhoria da qualidade de assistência a saúde, resultando em sugestões para implementação de intervenções eficazes para a resolução dos problemas detectados.

Sendo assim, é imprescindível a educação permanente e direcionada aos cuidados de Enfermagem na execução das ações de administração de medicamentos pela via intramuscular, principalmente quanto apresentar-se para a criança e/ou responsável; explicar o procedimento para a criança e/ou responsável; acalmar a criança; conferir o paciente; calçar as luvas no momento da execução do procedimento; escolher músculo conforme o seu tamanho e o volume do medicamento a ser administrado; palpar o local selecionado para injeção em busca de edema, sensibilidade ou grânulos; orientar sobre evitar massagem no local; monitorar o paciente quanto à alteração sensorial ou motora no local da injeção ou distal a ele e orientar o paciente; visto que são etapas essenciais para garantir uma administração segura por meio de uma assistência humanizada a fim de garantir a segurança do paciente.

Diante disto, obteve-se um diagnóstico situacional da equipe de Enfermagem quanto à administração de medicamento pela via intramuscular na pediatria, proporcionando identificação dos principais erros decorrentes da técnica de administração de medicamento, com o propósito de garantir uma assistência de saúde segura para os pacientes, seus familiares, profissionais da saúde, e para o sistema de saúde como um todo. Assim, acredita-se que esta pesquisa colaborará para o aperfeiçoamento da qualidade da assistência à saúde, sucedendo em propostas para implantação de ações efetivas para a resolução das situações constatadas.

Como limitações apresentadas neste estudo, tem-se que a pesquisa foi efetivada por apenas um pesquisador em cada observação e que os procedimentos eram realizados em dois espaços distintos: emergência e sala de medicação intramuscular. Pelo fato da emergência não ser um local exclusivo para administração de medicamentos intramusculares, ou seja, raramente havia o atendimento exclusivo, isso poderia ser um fator de distração durante a observação, além da rotina do ambiente que poderia oferecer viés ao estudo.

Desta forma, ressalta-se a necessidade da realização de novos estudos, em outros contextos, com metodologia diferenciada, visando minimizar os erros na administração de medicamentos na pediatria.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    28 Maio 2018
  • Data do Fascículo
    2018

Histórico

  • Recebido
    17 Jan 2017
  • Aceito
    25 Ago 2017
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