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Efeitos cardiotóxicos resultantes da interação da risperidona com diuréticos tiazídicos

Cardiotoxic effects resulting from the interaction between risperidone and thiazide diuretics

Resumos

Antipsicóticos atípicos têm sua ação em doses que podem produzir efeitos colaterais importantes. A risperidona é o antipsicótico atípico de nova geração mais utilizado na atualidade e seu uso está associado a tratamento de esquizofrenia, transtornos psicóticos, episódios de mania e nos distúrbios de comportamento, entre outros. Os efeitos adversos mais importantes estão relacionados ao sistema nervoso central e autônomo, sistema endócrino e sistema cardiovascular. Neste último, pode haver efeitos inotrópicos negativos e alterações no eletrocardiograma, como prolongamento do intervalo QT, podendo causar taquicardia e arritmias. Relatamos um caso de um homem de 48 anos com história de delírio persecutório após ser ameaçado no trabalho, que estava sendo tratado com risperidona e paroxetina. Por não haver melhora, suas doses foram aumentadas e o paciente apresentou alargamento do intervalo QTc, com diminuição da amplitude da onda T e aumento da onda U, e hipocalemia. Além disso, o paciente era hipertenso e estava em uso de hidroclorotiazida. A risperidona tem o potencial de bloquear o componente rápido do canal cardíaco de potássio e isso prolonga o processo de repolarização dos ventrículos, podendo causar torsade de pointes, morte súbita e arritmias. Já a hidroclorotiazida causa hipocalemia, provocando alterações na contração e relaxamento do miocárdio. Houve interação medicamentosa grave entre duas drogas com potencial arritmogênico, o que levou às alterações no eletrocardiograma e produziu sintomas danosos ao paciente. A troca do antipsicótico atípico para um típico e da hidroclorotiazida por um diurético que não causa hipocalemia trouxe melhoras ao paciente.

Antipsicóticos atípicos; hipopotassemia; QT; arritmias


Atypical antipsychotics have their actions in doses that can cause important side effects. The risperidone is the new generation atypical antipsychotic most widely used these days and it is related to the treatment of schizophrenia, psychotic disorders, manic episodes and behavioral disorder, among others. The most significant side effects are associated with the central and autonomic nervous system, endocrine system and cardiovascular system. Considering the latter, negative inotropic effects and changes on eletrocardiograma can occur, with QT-interval prolongation, which can cause tachycardia and arrhythmias. We reported a case of a 48 years old man with history of persecutory delusion after being threatened at work, treated with risperidone and paroxetine. Since there was no improvement, the doses were increased and the patient showed QTc-interval prolongation, with a T-wave amplitude decrease and an increase on the U-wave, in addition to hypokalemia. Besides, the patient was hypertensive and was using hydrochlorothiazide. Risperidone has the potential to block the fast component of the cardiac potassium channel and it extends the repolarization process of the ventricles, which can lead to torsade de pointes, sudden cardiac death and arrhythmias. Also hydrochlorothiazide can cause hypokalemia, with disturbances on the myocardium depolarization and repolarization. There was a serious drug interaction with two potentially arrhythmogenic drugs, which led to the alterations on the electrocardiogram and generated hurtful symptoms to the patient. The shift of the atypical antipsychotic to one typical and of the hydrochlorothiazide to a diuretic that does not cause hypokalemia brought improvements to the patient.

Antipsychotic agents atypical; hypokalemia; QT; arrhythmias


INTRODUÇÃO

O aspecto comum aos antipsicóticos considerados atípicos é a capacidade de promover a ação antipsicótica em doses que produzam com menos frequência os sintomas extrapiramidais1Komossa K, Rummel-Kluge C, Schwarz S, Schmid F, Hunger H, Kissling W, et al. Risperidone versus other atypical antipsychotics for schizophrenia. Cochrane Database Syst Rev. 2011;19(1):CD006626.,2Mathews M, Muzina DJ. Atypical antipsychotics: new drugs, new challenges. Cleve Clin J Med. 2007;74:597-606., tais como o parkinsonismo secundário, a distonia aguda, a discinesia tardia e a síndrome neuroléptica maligna3Divac N, Prostran M, Jakovcevski, Cerovac N. Second-generation antipsychotics and extrapyramidal adverse effects. Biomed Res Int. 2014;656370.. No mercado brasileiro, estão disponíveis diversos tipos, entre eles a clozapina, a risperidona, a olanzapina, a quetiapina, o aripiprazol, entre outros. A risperidona, um dos antipsicóticos de nova geração atualmente mais utilizado, é um derivado benzisoxazólico, com forte efeito bloqueador de receptores D2 e 5-HT2, sendo eficaz nos sintomas positivos e nos negativos da esquizofrenia1Komossa K, Rummel-Kluge C, Schwarz S, Schmid F, Hunger H, Kissling W, et al. Risperidone versus other atypical antipsychotics for schizophrenia. Cochrane Database Syst Rev. 2011;19(1):CD006626.,2Mathews M, Muzina DJ. Atypical antipsychotics: new drugs, new challenges. Cleve Clin J Med. 2007;74:597-606.. A risperidona também é indicada no tratamento de outros transtornos psicóticos, nos episódios de mania, nos distúrbios de comportamento em crianças, adolescentes e idosos. Além disso, pode ser usada como auxiliar no tratamento do autismo e no transtorno obsessivo-compulsivo1Komossa K, Rummel-Kluge C, Schwarz S, Schmid F, Hunger H, Kissling W, et al. Risperidone versus other atypical antipsychotics for schizophrenia. Cochrane Database Syst Rev. 2011;19(1):CD006626.,2Mathews M, Muzina DJ. Atypical antipsychotics: new drugs, new challenges. Cleve Clin J Med. 2007;74:597-606.,4Gardner DM, Baldessarini RJ, Waraich P. Modern antipsychotic drugs: a critical overview. CMAJ. 2005;172(13):1703-11..

Apesar da expectativa de causarem menos efeitos colaterais, os antipsicóticos atípicos podem apresentar outros efeitos adversos. Entre os mais importantes estão aqueles relacionados ao sistema nervoso central e autônomo, ao sistema endócrino e ao sistema cardiovascular, assim como distúrbios metabólicos (ganho de peso, hiperlipidemia, resistência à insulina e diabetes mellitus tipo 2). Em função desses últimos efeitos, os pacientes que utilizam tais medicações devem ser rigorosamente monitorados, visto possíveis complicações metabólicas e suas repercussões2Mathews M, Muzina DJ. Atypical antipsychotics: new drugs, new challenges. Cleve Clin J Med. 2007;74:597-606.,5Goodman & Gilman. As bases farmacológicas da terapêutica. 11.ed. Editora McGrallHill; 2006. p. 757-69..

Quanto aos efeitos cardiovasculares dos antipsicóticos, estes são diversos. Entre os principais estão a hipotensão, o prolongamento dos intervalos QT, o prolongamento do intervalo PR, a atenuação das ondas T, a depressão do segmento ST e, por fim, a taquicardia e arritmias cardíacas graves, além da morte súbita4Gardner DM, Baldessarini RJ, Waraich P. Modern antipsychotic drugs: a critical overview. CMAJ. 2005;172(13):1703-11.

Goodman & Gilman. As bases farmacológicas da terapêutica. 11.ed. Editora McGrallHill; 2006. p. 757-69.

Khasawneh FT, Shankar GS. Minimizing cardiovascular adverse effects of atypical antipsychotic drugs in patients with schizophrenia. Cardiol Res Pract. 2014;2014:273060.
-7Zareba W, Lin DA. Antipsychotic drugs and QT interval prolongation. Psychiatr Q. 2003;74(3):291-306.. Apesar das descrições, ainda não há consenso na literatura quanto ao seu manejo, principalmente com relação à retirada ou não da medicação6Khasawneh FT, Shankar GS. Minimizing cardiovascular adverse effects of atypical antipsychotic drugs in patients with schizophrenia. Cardiol Res Pract. 2014;2014:273060..

Nesse contexto, este artigo tem como objetivo apresentar um relato de caso sobre o uso de risperidona associado a hidroclorotiazida e consequente hipocalemia, o que causou prolongamento do intervalo QT.

RELATO DE CASO

Um homem de 48 anos, policial, apresentava história de delírio persecutório há seis meses após sofrer ameaças no trabalho. Realizava ritual para sair e entrar em casa, assim como tinha horários para observar a janela e passou a desconfiar de praticamente qualquer pessoa que andasse nas redondezas. Há dois anos, após ameaças no trabalho, passou a apresentar revivência do episódio traumático (pesadelos e lembranças frequentes), esquiva de locais que lembravam as ameaças (determinadas ruas, determinados bairros) e passava a agir de forma antecipada a possíveis reações de cidadãos investigados (frequentes agressões, saques precoces de arma, acompanhado de taquicardia e tremores). Também era portador de hipertensão arterial em uso de hidroclorotiazida, 50 mg ao dia e dislipidemia. Prescreveram-se paroxetina, 20 mg ao dia, e risperidona, 1 mg ao dia, sob hipótese de transtorno psicótico e transtorno do estresse pós-traumático. Por não melhorar, após quatro semanas, a risperidona foi ajustada para 2 mg e, após mais quatro semanas, para 3 mg ao dia. O paciente apresentou melhora do quadro e ficou estável por cinco meses. Entretanto, passou a apresentar tontura, mal-estar e palpitações. Nos exames realizados, verificaram-se: cloro 99,1 mEq/L (VR. 98 – 110 mEq/L); potássio 2,9 mEq/L (VR. 3,5 – 5,5 mEq/L); magnésio 2,20 mEq/L (VR. 1,58 – 2,56 mEq/L).

O eletrocardiograma demonstrou alargamento do intervalo QTc, porém associado à diminuição da amplitude da onda T e ao aumento da onda U. O exame de potássio sérico indicou hipocalemia e o magnésio encontrava-se normal. Com a troca de hidroclorotiazida por enalapril e a troca da risperidona por haloperidol, houve melhora dos sintomas e do traçado eletrocardiográfico.

DISCUSSÃO

Reações adversas a medicamentos são responsáveis por significativa morbidade e mortalidade, possivelmente representando até um valor estimado de 100 mil mortes por ano. Pacientes psiquiátricos têm risco aumentado de morte súbita, que pode ser ainda maior por efeitos indesejados de fármacos antipsicóticos administrados sozinhos ou em combinação com outras drogas que contribuem para prolongamento do intervalo QT. O aumento da incidência de polifarmácia requer do clínico a atenção para efeitos secundários dos medicamentos e suas interações, podendo ocorrer eventos fatais. Nesse sentido, o prolongamento do intervalo QT tem sido reconhecido como um efeito colateral de muitos medicamentos comumente usados, incluindo drogas antidepressivas e antipsicóticos7Zareba W, Lin DA. Antipsychotic drugs and QT interval prolongation. Psychiatr Q. 2003;74(3):291-306..

O intervalo QT é um parâmetro mensurado pelo eletrocardiograma de superfície que corresponde ao período que vai desde o início da despolarização até o final da repolarização ventricular5Goodman & Gilman. As bases farmacológicas da terapêutica. 11.ed. Editora McGrallHill; 2006. p. 757-69.. Os valores superiores aos recomendados pela literatura revelam o prolongamento significativo do intervalo QT – a síndrome do QT longo, uma desordem da condução elétrica do miocárdio que altera a repolarização ventricular e, consequentemente, aumenta a vulnerabilidade para o desenvolvimento de taquiarritmias ventriculares do tipo torsade de pointes e morte súbita8Maior AS, Barbosa PRB, Barbosa Neto O, Mota GR, Marocolo Júnior M. Canais iônicos de potássio associados à síndrome do QT longo adquirido. Rev Bras Cardiol. 2011;24(1):42-51.. A síndrome do QT longo pode apresentar origem congênita ou adquirida, com alterações nas propriedades dos canais iônicos de potássio, seja na sua cinética de ativação e inativação seja na densidade da corrente iônica ou mesmo em sua estrutura, resultando no prolongamento do tempo de repolarização ventricular8Maior AS, Barbosa PRB, Barbosa Neto O, Mota GR, Marocolo Júnior M. Canais iônicos de potássio associados à síndrome do QT longo adquirido. Rev Bras Cardiol. 2011;24(1):42-51..

A presença do prolongamento do intervalo QT está relacionada a vários fatores de risco, dentre eles: altas doses de um antipsicótico e/ou antidepressivo conhecido por afetar canais de potássio; tratamento com droperidol, pimozida, sertindole ou tioridazina; doenças cardíacas, como isquemia do miocárdio, disfunção ventricular esquerda ou hipertrofia, antecedentes de torsaide pointes, bradicardia, extrassístoles ventriculares e bloqueio cardíaco; insuficiência renal ou hepática; níveis séricos reduzidos de K+, Ca+2 ou Mg+2; sexo feminino e idade avançada9Chadwick B, Waller DG, Edwards JG. Potentially hazardous drug interactions with psychotropics. Adv Psychiatr Treat. 2005;11:440-9..

O relato mostrou paciente em uso de risperidona e de hidroclorotiazida. Esse antipsicótico atípico bloqueia o canal iônico cardíaco que transporta o componente rápido da corrente de potássio retificadora retardada1010 Crouch MA, Limon L, Cassano AT. Clinical relevance and management of drug-related QT interval prolongation. Pharmacotherapy. 2003;23:881-908.. Essa inibição prolonga o processo de repolarização dos ventrículos do coração, podendo causar torsades de pointes e morte súbita cardíaca, além de outras arritmias1010 Crouch MA, Limon L, Cassano AT. Clinical relevance and management of drug-related QT interval prolongation. Pharmacotherapy. 2003;23:881-908.. O diurético em uso provoca a hipocalemia e, durante esse evento, o canal iônico muda a conformação para um estado menos condutor, aumentando o prolongamento do intervalo QT. Dentre vários fármacos que prolongam o intervalo QT, os diuréticos, como a indapamida, podem estar relacionados com esse efeito, apesar de os estudos serem ainda escassos. O principal mecanismo para esse efeito é a hipocalemia1010 Crouch MA, Limon L, Cassano AT. Clinical relevance and management of drug-related QT interval prolongation. Pharmacotherapy. 2003;23:881-908..

A hidroclorotizida é um diurético que age nos túbulos renais promovendo algumas alterações na concentração de eletrólitos no organismo, como a perda do potássio e de magnésio5Goodman & Gilman. As bases farmacológicas da terapêutica. 11.ed. Editora McGrallHill; 2006. p. 757-69.. Níveis séricos adequados de potássio estão associados à proteção cardiovascular, uma vez que esse íon pode agir inibindo a formação de radicais livres no endotélio vascular, a agregação plaquetária e a trombose arterial1111 Franse LV, Pahor M, Di Bari M, Somes GW, Cushman WC, Applegate WB. Hypokalemia associated with diuretic use and cardiovascular events in the Systolic Hypertension in the Elderly program. Hypertension. 2000;35:1025-30.. Dessa forma, a hipocalemia, causada pelo uso contínuo de diuréticos tiazídicos, associa-se a alterações cardiovasculares, como prejuízos na contração e relaxamento do miocárdio, alteração da resposta do miocárdio à hipóxia, arritmias e morte súbita1212 Ahmed A, Zannad F, Love TE, Tallaj J, Gheorghiade M, Ekundayo OJ, et al. A propensity-matched study of the association of low serum potassium levels and mortality in chronic heart failure. Eur Heart J. 2007;28(11):1334-43..

A hipopotassemia pode ser evidenciada no eletrocardiograma por meio de uma onda T achatada, depressão no segmento ST e aumento de amplitude da onda U, com prolongamento do intervalo QT1313 Unwin RJ, Luft FC, Shirley DG. Pathophysiology and management of hypokalemia: a clinical perspective. Nat Rev Nephrol. 2011;7(2):75-84.. Com o uso de diuréticos, a hipomagnesemia está usualmente associada à hipocalemia, e alterações eletrocardiográficas ocorrem em função da hipopotassemia. A maioria dos pacientes com hipopotassemia e com QT aumentado tem associada uma hipomagnesemia1414 Barcellos GA, Barcellos PT. Manifestações eletrocardiográficas de doenças não cardíacas. Rev da Soc De Card RS. 2011;19(21):1-7..

É evidente que, ao se combinar duas drogas que bloqueiem o componente rápido dos canais de potássio, o risco de prolongamento do intervalo QT e de arritmias também aumenta substancialmente7Zareba W, Lin DA. Antipsychotic drugs and QT interval prolongation. Psychiatr Q. 2003;74(3):291-306.,1515 Shah RR. Drug-induced prolongation of the QT interval: regulatory dilemmas and implications for approval and labeling of a new chemical entity. Fundam Clin Pharmacol. 2002;16:147-56.. Assim, pode-se dizer que os fatores que geram o prolongamento do intervalo QT são múltiplos e não exclusivos de uma droga administrada. A maioria dos pacientes em uso de antipsicótico que são acometidos por torsade de pointes e posteriormente por morte súbita cardíaca tem fatores de risco estabelecidos, como idade avançada, sexo feminino, hipocalemia e doença cardiovascular7Zareba W, Lin DA. Antipsychotic drugs and QT interval prolongation. Psychiatr Q. 2003;74(3):291-306.,1515 Shah RR. Drug-induced prolongation of the QT interval: regulatory dilemmas and implications for approval and labeling of a new chemical entity. Fundam Clin Pharmacol. 2002;16:147-56..

Outra questão é que o paciente estava em uso de paroxetina. A paroxetina é antidepressivo inibidor seletivo da recaptação da serotonina, sendo um importante inibidor de CYP2D6 e 2C9. Estudos mostram que essa medicação pode aumentar o nível de risperidona, o que poderia contribuir para piorar os efeitos tóxicos desses antipsicóticos atípicos1616 Soares OT. Interações medicamentosas em psiquiatria. FMUSP. 2014. Disponível em: http://www.ipqhc.org.br/pdfs/Psico.pdf. Acesso em: 29 out, 2014.
http://www.ipqhc.org.br/pdfs/Psico.pdf...
. Porém, a troca por haloperidol não considerou tal mecanismo enzimático, sendo no futuro um fator a ser considerado no monitoramento de possível recorrência do prologamento do intervalo QT1717 Victor W, Vieweg MD. New generation antipsychotic drugs and QTC interval prolongation. Prim Care Companion J Clin Psychiatry. 2003;5(5):205-15.. No caso, a literatura é consensual quanto ao maior risco pelo somatório de fatores no uso de mais de uma medicação com efeito cardiotóxico4Gardner DM, Baldessarini RJ, Waraich P. Modern antipsychotic drugs: a critical overview. CMAJ. 2005;172(13):1703-11.

Goodman & Gilman. As bases farmacológicas da terapêutica. 11.ed. Editora McGrallHill; 2006. p. 757-69.

Khasawneh FT, Shankar GS. Minimizing cardiovascular adverse effects of atypical antipsychotic drugs in patients with schizophrenia. Cardiol Res Pract. 2014;2014:273060.
-7Zareba W, Lin DA. Antipsychotic drugs and QT interval prolongation. Psychiatr Q. 2003;74(3):291-306..

Na literatura, recomenda-se primeiramente abordar os fatores secundários antes de se pensar na troca da medicação. Entretanto, observamos que no caso clínico optou-se pela troca por haloperidol por orientação do cardiologista. Justificou-se a mudança, visto que as alterações eletrocardiográficas relacionadas ao uso de antipsicóticos se devem a diversos fatores e que não há consenso da literatura quanto a qual medicação tem maior ou menor risco. Até mesmo fatores genéticos podem estar envolvidos no surgimento de tal síndrome com medicações1818 Adkins DE, Aberg K, McClay JL, Bukszár J, Zhao Z, Jia P, et al. Genomewide pharmacogenomic study of metabolic side effects to antipsychotic drugs. Mol Psychiatry. 2011;16(3):321-32.. Apesar de o haloperidol apresentar maior frequência de efeitos cardíacos, é importante salientar que também é um dos mais prescritos. Ao se fazer o ajuste para proporção, nota-se que a taxa de incidência é semelhante ou até menor que outros antipsicóticos atípicos. Além disso, o haloperidol trata-se de medicação efetiva para sintomas psicóticos, com maior número de pesquisas e cuja molécula tem menores efeitos que outros receptores8Maior AS, Barbosa PRB, Barbosa Neto O, Mota GR, Marocolo Júnior M. Canais iônicos de potássio associados à síndrome do QT longo adquirido. Rev Bras Cardiol. 2011;24(1):42-51.. Da mesma forma, o risco de morte súbita cardíaca tende também a ser maior naqueles que usaram antipsicóticos atípicos1919 Honkola J, Hookana E, Malinen S, Kaikkonen KS, Junttila MJ, Isohanni M, et al. Psychotropic medications and the risk of sudden cardiac death during an acute coronary event. Eur Heart J. 2012;33(6):745-51.. Por fim, o paciente era portador de dislipidemia, e antipsicóticos atípicos também estão relacionados a maiores efeitos metabólicos.

Assim, foram utilizadas duas drogas com potencial arritmogênico, e o paciente começou a apresentar tontura, mal-estar e palpitações. O eletrocardiograma demonstrou alargamento do intervalo QT, porém associado à diminuição da amplitude da onda T e ao aumento da onda U. O exame de potássio sérico indicou hipocalemia e o magnésio normal. O paciente do relato não estava com hipomagnesemia e estava em uso de hidroclorotiazida, o que ocasionou a hipocalemia. A hipocalemia promove achatamento de onda T e onda U proeminente, mas só prolonga QT quando há hipomagnesemia. Dessa forma, o paciente em questão apresentou diminuição na concentração sérica de potássio, o que pode explicar a diminuição da amplitude da onda T e aumento da onda U verificada no eletrocardiograma. Porém, o paciente também apresentou alargamento do intervalo QT, apesar de não ter apresentado hipomagnesemia. Assim, optou-se pela troca das duas medicações, pelos riscos cardiotóxicos apresentados2020 Roden DM. Drug-induced prolongation of the QT interval. N Engl J Med. 2004;350:1013-22..

CONCLUSÕES

O caso sugere uma interação medicamentosa grave entre a hidroclorotiazida, responsável pela diminuição da amplitude da onda T e aumento da onda U, e a risperidona, a qual aumentou o intervalo QT. Temos uma associação que pode ser grave: o diurético causou diminuição do potássio, o que produz efeito cardiovascular danoso, que se associou ao efeito cardiotóxico da risperidona. Essa interação promoveu as alterações no eletrocardiograma e os sintomas do paciente. Com a troca do antipsicótico e do diurético tiazídico para um antipsicótico típico e anti-hipertensivo que não causa a hipocalemia, respectivamente, houve melhora do quadro.

Os efeitos cardiotóxicos dos antipsicóticos atípicos, em especial da risperidona, são frequentes e devem ser considerados nos pacientes que utilizam tal medicação. A interação com diuréticos tiazídicos e inibidores seletivos é de extrema importância. Sugere-se que o monitoramento do paciente por meio da dosagem de potássio sérico e eletrocardiograma deva ser feito de rotina, assim como potenciais interações relacionadas ao bloqueio do citocromo P450. Entretanto, a análise de cada caso deve considerar a presença de múltiplos fatores e suas repercussões na tomada da decisão.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2014

Histórico

  • Recebido
    8 Jul 2014
  • Aceito
    31 Out 2014
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