Acessibilidade / Reportar erro

Confiabilidade intra e interobservador da análise cinemática angular do quadril durante o teste sentar e alcançar para mensurar o comprimento dos isquiotibiais em estudantes universitários

Resumos

CONTEXTUALIZAÇÃO: O teste sentar e alcançar (TSA), utilizado para mensurar flexibilidade da coluna lombar e músculos isquiotibiais (IT), é mais adequado quando realizado concomitante à mensuração do ângulo da articulação do quadril (AAQ). OBJETIVO: Avaliar a confiabilidade intra e interobservadores do TSA na mensuração do comprimento dos IT por meio da análise cinemática angular. MÉTODO: Participaram 50 universitários (X= 21,5 anos; DP= 1,5) sem alterações musculoesqueléticas. Foram utilizados: banco padrão do TSA com porta para avaliar a ação dos gastrocnêmios no TSA e câmera fotográfica digital posicionada sobre um tripé. Marcadores cutâneos foram posicionados na: espinha ilíaca ântero-superior e trocânter maior. Realizaram-se duas aquisições de imagem: uma com porta fechada - PF e outra, aberta - PA. Para testar a confiabilidade intra e interobservadores foram utilizados: coeficiente de correlação intraclasse (CCI) - efeito aleatório com um fator - e teste de concordância de Bland e Altman (d = diferença média entre as medidas) com os respectivos intervalos de confiança de 95% (IC 95%). RESULTADOS: Os testes de confiabilidade intra-observador do AAQ foram: CCIpf = 0,97 - IC95% [0,95;0,99] e Bland e Altman d = -0,02 - IC95% [-0,11;0,07]; CCIpa= 0,98 - IC95% [0,96;0,99], d = -0,01 - IC95% [-0,11;0,08]. Para confiabilidade interobservador: CCIpf =0,96 - IC95% [0,94;0,98] e d = -0,07 - IC95% [-0,19;0,03]; CCIpa=0,96 - IC95% [0,93;0,98] e d = -0,06 - IC95% [-0,19;0,52]. CONCLUSÃO: Os testes intra e interobservador (PF e PA) da avaliação do AAQ, pela análise cinemática, apresentaram alta confiabilidade. A técnica é de fácil aplicação (necessita apenas do banco TSA padrão e câmera fotográfica) e fornece à prática clínica um método confiável para mensurar os IT pela cinemetria.

biomecânica; articulação de quadril; exame físico; reprodutibilidade dos testes


BACKGROUND: The sit-and-reach test (SRT) is used to measure the flexibility of the lumbar spine and hamstring muscles and is better when the hip joint angle (HJA) is measured concomitantly. OBJECTIVE: To assess the intra and interobserver reliability of the SRT for measuring hamstring muscle length through angular kinematic analysis. METHOD: Fifty university students (X= 21.5 years; SD= 1.5) without musculoskeletal abnormalities took part. A standard SRT bench with a door (to assess the action of the gastrocnemius muscles) and a digital photographic camera positioned on a tripod were used. Skin markers were placed on the anterosuperior iliac spine and greater trochanter. Two images were recorded: one with the door closed (DC) and another with the door open (DO). To test the intra and interobserver reliability, the intraclass correlation coefficient (ICC) (random effect with one factor) and the Bland and Altman concordance test (d= mean difference between measurements) were used, with the respective 95% confidence intervals (95% CI). RESULTS: The intraobserver reliability of the HJA test was: ICCdc= 0.97 (95% CI [0.95;0.99]) and Bland and Altman d = -0.02 (95% CI [-0.11;0.07]); ICCdo = 0.98 (95% CI [0.96;0.99]), d = -0.01 (95% CI [-0.11;0.08]). For the interobserver reliability: ICCdc= 0.96 (95% CI [0.94;0.98]) and d = -0.07 (95% CI [-0.19;0.03]); ICCdo= 0.96 (95% CI [0.93;0.98] and d = -0.06 (95% CI [-0.19;0.52]. CONCLUSION: The intra and interobserver reliability tests (DC and DO) for HJA assessment using kinematic analysis showed high reliability. The technique is easy to apply (only requiring a standard SRT bench and a photographic camera) and provides a reliable method for measuring hamstring muscles using kinematic analysis in clinical practice.

biomechanics; hip joint; physical examination; test reproducibility


ARTIGOS CIENTÍFICOS

Confiabilidade intra e interobservador da análise cinemática angular do quadril durante o teste sentar e alcançar para mensurar o comprimento dos isquiotibiais em estudantes universitários

Cardoso JRI; Azevedo NCTII; Cassano CSII; Kawano MMI; Âmbar GII

IUniversidade Estadual de Londrina, Centro de Ciências da Saúde, Departamento de Fisioterapia, Londrina, PR Brasil

IIFisioterapeuta

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Jefferson Rosa Cardoso Hospital Universitário Av. Robert Kock, 60 CEP 86038-440, Londrina, PR - Brasil e-mail: jeffcar@hotmail.com

RESUMO

CONTEXTUALIZAÇÃO: O teste sentar e alcançar (TSA), utilizado para mensurar flexibilidade da coluna lombar e músculos isquiotibiais (IT), é mais adequado quando realizado concomitante à mensuração do ângulo da articulação do quadril (AAQ).

OBJETIVO: Avaliar a confiabilidade intra e interobservadores do TSA na mensuração do comprimento dos IT por meio da análise cinemática angular.

MÉTODO: Participaram 50 universitários (X= 21,5 anos; DP= 1,5) sem alterações musculoesqueléticas. Foram utilizados: banco padrão do TSA com porta para avaliar a ação dos gastrocnêmios no TSA e câmera fotográfica digital posicionada sobre um tripé. Marcadores cutâneos foram posicionados na: espinha ilíaca ântero-superior e trocânter maior. Realizaram-se duas aquisições de imagem: uma com porta fechada – PF e outra, aberta – PA. Para testar a confiabilidade intra e interobservadores foram utilizados: coeficiente de correlação intraclasse (CCI) – efeito aleatório com um fator – e teste de concordância de Bland e Altman (d = diferença média entre as medidas) com os respectivos intervalos de confiança de 95% (IC 95%).

RESULTADOS: Os testes de confiabilidade intra-observador do AAQ foram: CCIpf = 0,97 – IC95% [0,95;0,99] e Bland e Altman d = -0,02 – IC95% [-0,11;0,07]; CCIpa= 0,98 – IC95% [0,96;0,99],d = -0,01 – IC95% [-0,11;0,08]. Para confiabilidade interobservador: CCIpf =0,96 – IC95% [0,94;0,98] e d = -0,07 – IC95% [-0,19;0,03]; CCIpa=0,96 – IC95% [0,93;0,98] e d = -0,06 – IC95% [-0,19;0,52].

CONCLUSÃO: Os testes intra e interobservador (PF e PA) da avaliação do AAQ, pela análise cinemática, apresentaram alta confiabilidade. A técnica é de fácil aplicação (necessita apenas do banco TSA padrão e câmera fotográfica) e fornece à prática clínica um método confiável para mensurar os IT pela cinemetria.

Palavras-chave: biomecânica, articulação de quadril, exame físico, reprodutibilidade dos testes.

INTRODUÇÃO

O teste sentar e alcançar (TSA), proposto inicialmente por Wells e Dillon na década de 50, é comumente utilizado para mensurar a flexibilidade da coluna lombar e dos músculos isquiotibiais (IT)1. O interesse em se pesquisar os músculos IT e a mensuração de seu comprimento é devido às possíveis disfunções e lesões causadas pela alteração de sua flexibilidade. Além das lesões do próprio músculo, há alterações biomecânicas que levam a disfunção fêmuro-patelar, pubalgia, dor lombar, tendinite e desvios posturais2-8.

Acredita-se que alguns fatores possam alterar o resultado do TSA: diferenças de proporções entre comprimento dos membros superiores e inferiores, mobilidade da coluna vertebral e a abdução escapular1,9-12. Diferentes TSA e suas modificações foram estudados no intuito de se eliminar esses fatores12-19. Todos levam em consideração o alcance dos dedos no ponto mais distante e não o ângulo formado pela articulação do quadril (AAQ), o que, supostamente, poderia predizer o comprimento dos IT. O comprimento dos músculos IT pode ser mensurado pelo ângulo de inclinação do sacro e da pelve em relação ao solo. Isto representa uma mensuração indireta do AAQ9. O mesmo teste pode ser utilizado para mensuração da flexibilidade da coluna lombar, mas alguns estudos demonstram baixa correlação entre ambos, o que sugere a sua não realização com este objetivo11,15.

Para a mensuração do AAQ, utiliza-se a cinemetria. Esta utiliza um conjunto de métodos que busca medir os parâmetros cinemáticos do movimento, isto é, posição, orientação, velocidade e aceleração. Um dos sistemas possíveis para obter medidas cinemáticas é baseado em câmeras de vídeo ou fotográficas, que registram a imagem do movimento e, então, por meio de programas específicos, são calculadas as variáveis de interesse20. Por meio da cinemetria é possível obter as fotografias que fornecem um registro e, posteriormente, podem ser comparadas com outras fotos e facilitar a interpretação dos achados relativos ao processo de intervenção21. Portanto, a análise do AAQ, por meio da cinemetria, possibilita o avaliador verificar o comprimento dos IT e, assim, prevenir e tratar as disfunções que o seu encurtamento pode causar.

Na prática clínica é imprescindível o uso de métodos confiáveis, uma vez que a utilização de métodos de avaliação observacionais e visuais são subjetivos e podem comprometer os resultados dos programas que envolvem intervenção. Todo instrumento ou método de avaliação deve ser avaliado quanto a sua confiabilidade, isto é, a capacidade do instrumento avaliar, em momentos diferentes, a mesma medida, seja envolvendo o mesmo avaliador ou não22. Assim, um instrumento confiável mede fenômenos de forma fidedigna, seqüenciada, acurada e previsivelmente sem alterações. Se uma avaliação funcional ou qualquer teste não é confiável, o estado inicial do paciente ou o efeito do tratamento poderá ser modificado. Estudos de confiabilidade na área de reabilitação são necessários para assegurar que o erro envolvido na mensuração seja reduzido e para detectar mudanças no que está sendo mensurado23.

Alguns estudos sobre o TSA e suas variações (testes modificados) utilizaram o teste de confiabilidade. Estes demonstraram resultados de alta confiabilidade, porém todos utilizaram para a análise estatística somente o coeficiente de correlação intraclasse14-15,17. Por existirem problemas como a influência da magnitude da variação entre-sujeitos, não demonstração de indicação do valor obtido, erro na medida e não possibilidade de ser interpretado clinicamente, este teste deveria ser usado em conjunto com o teste de Bland e Altman24, no qual os dados são interpretados e visualizados de forma objetiva em conjunto com as diferenças das variações (diferença média das medidas e seus intervalos de confiança de 95%)23. Deste modo, o presente estudo teve como objetivo avaliar a confiabilidade intra e interobservadores da mensuração do ângulo da articulação do quadril durante o TSA por meio da análise cinemática angular.

METODOLOGIA

A amostra de conveniência foi composta por 50 indivíduos (18 homens e 32 mulheres), sedentários ou não, estudantes universitários. Como critério de inclusão, todos deveriam ser sadios e ter idade entre 19 e 25 anos. Como critérios de exclusão, nenhum voluntário deveria apresentar dor, alteração postural evidente, distúrbios musculoesqueléticos em coluna ou membros superiores e inferiores. O projeto e o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido foram submetidos ao Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Estadual de Londrina (CEP 058/04) e aprovados por ele.

Para a realização do teste, foi utilizado o banco padrão do teste sentar e alcançar (banco de Wells)1, que consiste em uma caixa de madeira medindo 30,5 cm x 30,5 cm x 30,5 cm, com um prolongamento de 23 cm para o apoio dos membros superiores dos sujeitos. Sobre a face superior da caixa e do prolongamento, há uma escala métrica de 50 cm que permite determinar o alcance do indivíduo. No banco padrão, durante o teste, a planta dos pés do participante coincide com o 23º cm da fita métrica. No local do apoio plantar, na caixa, foi construída uma abertura (porta) de 27 cm de altura x 27 cm de largura. Esta porta, quando aberta, possibilita eliminar a influência dos músculos gastrocnêmios durante o teste, fato que poderia subestimar o alcance máximo dos voluntários quando estes músculos encontram-se encurtados. As referências anatômicas utilizadas, trocânter maior do fêmur e espinha ilíaca ântero-superior (EIAS), foram localizadas e demarcadas com marcadores cutâneos opacos para orientar as medidas nas imagens.

Uma câmera fotográfica digital, com resolução de 5.1 megapixels foi posicionada e calibrada sobre um tripé fixo de 72 cm de altura, a 202 cm do plano de fundo. Os participantes tiveram imagens adquiridas durante a realização do teste em duas condições: (a) com porta fechada (PF) e (b) com porta aberta (PA). A seqüência de aquisição das imagens em relação aos tipos de teste foi aleatorizada. As fotos foram registradas no mesmo local e horário do dia.

Os testes registrados contaram com o posicionamento dos sujeitos no banco com marcadores adequadamente posicionados na superfície. Após este procedimento, com quadris em flexão, joelhos em extensão e a planta dos pés em contato ou não com a caixa, na marca do 23º centímetro da escala, foi solicitado que o participante realizasse inspiração profunda e, durante a expiração, flexionasse o tronco para frente com a intenção de alcançar a máxima distância possível. Para um controle sobre possíveis deslocamentos laterais dos indivíduos durante o teste, os membros superiores estavam alinhados com a fita métrica do banco, com uma mão sobreposta à outra (padronizou-se o dedo médio da mão direita sobre o da esquerda). A foto foi registrada nessa posição tanto com a porta aberta quanto fechada, de acordo com o resultado da aleatorização. O alcance máximo dos dedos médios era determinado como pontuação do TSA, e o AAQ foi calculado por meio do programa Suite CorelDRAW®, versão 11. O comprimento dos músculos IT foi mensurado pela análise do ângulo de inclinação do sacro e a pelve em relação a horizontal na posição final do TSA9. Para isso, obtiveram-se duas retas que formaram o ângulo: uma entre os marcadores da EIAS e o trocânter maior do fêmur e, a outra, uma reta horizontal que passa pelo trocânter maior (Figuras 1 e 2).



Os dois avaliadores avaliaram as mesmas 100 fotos (duas por participante – uma com PF e a outra PA), simultaneamente, em dois computadores independentes (interobservador). Para avaliação intra-observador, as mesmas fotos foram avaliadas com intervalo de cinco dias.

As variáveis (antropométricas e o valor do AAQ com a porta fechada e aberta) foram testadas quanto à distribuição de normalidade e são apresentadas de forma descritiva (X= média e DP= desvio-padrão) por satisfazerem os pressupostos necessários. Para o teste de confiabilidade intra e interobservadores, foram utilizados: Coeficiente de Correlação Intraclasse - CCI (efeito aleatório – um fator) e o teste de concordância de Bland e Altman24. O CCI= 1 indica uma alta confiabilidade (considerada ausência de erro), enquanto CCI= 0 indica nenhuma reprodutibilidade. O intervalo de confiança de 95% para cada valor do CCI foi calculado21. Incluem-se no teste de concordância de Bland e Altman24: a diferença média entre as medidas () e seus respectivos intervalos de confiança de 95% (IC 95% para ), o desvio-padrão da diferença da média (DP ) e os limites de concordância. Quanto mais próximo de zero a distribuição dos valores do teste de Bland e Altman, mais alta é a concordância23. Foram utilizados os programas estatísticos SPSS® (versão 11.5) e MedCalc® (versão 8.1.0.0).

RESULTADOS

Os dados antropométricos da amostra (n= 50) foram: idade entre 19 e 25 anos (X= 21,5 anos; DP= 1,5), massa corporal entre 41,5 e 92 kg (X= 60,8 kg; DP= 11,3), estatura entre 1,48 e 1,99 (X= 1,67 m; DP= 0,10) e índice de massa corpórea (IMC) entre 13,1 e 26,9 (X= 21,3; DP= 2,9). Quanto à prática de atividade física, 18 (36%) participantes a realizavam regularmente (no mínimo três vezes por semana). Destes, 11 (61,1%) são homens e sete (38,9%) mulheres.

Na Tabela 1, encontram-se os valores dos ângulos (AAQ) e do alcance (TSA) com a porta fechada e aberta para toda a amostra.

Na Tabela 2, constam os valores do teste de confiabili-dade intra e interobservador da análise do ângulo da articulação do quadril com a porta fechada e aberta. Todos os valores analisados mostraram alta confiabilidade (CCI entre 0,96 – 0,98) e (Bland e Altman24 entre - 0,01 e - 0,07) tanto intra como interobservadores.

DISCUSSÃO

No presente estudo foi feita uma porta no banco de Wells1 para que, quando aberta, os gastrocnêmios pudessem ficar livres. A disposição dos mesmos em posição de alongamento, ao realizar o teste padrão (pés fixos contra a porta fechada – dorsifletidos a 90º), pode levar a um falso positivo de IT encurtados, pois, ao fletir o tronco à frente, o participante pode referir tensão em região posterior da perna, interferindo no resultado final do teste. Mantendo os tornozelos livres, os músculos gastrocnêmios estarão isolados, não interferindo no resultado devido a um possível encurtamento. Isto confirma a afirmação de Kendall et al.10 sobre os músculos biarticulares em que os mesmos devem estar livres sobre uma articulação de modo a obter a melhor amplitude de movimento possível sobre outra articulação.

O teste de confiabilidade intra-observador apresentou alta confiabilidade (intervalo de cinco dias), tanto no teste realizado com a porta fechada (CCI= 0,97) quanto no realizado com porta aberta (CCI= 0,98). O mesmo ocorreu no teste para confiabilidade interobservador, realizado em ambientes diferentes por dois avaliadores treinados (CCI= 0,96 e CCI= 0,96, respectivamente). Os resultados obtidos comprovaram boa aplicabilidade da técnica e facilidade no cálculo dos valores do ângulo da articulação do quadril pelos avaliadores. Os marcadores cutâneos de fácil visualização e a mensuração do ângulo feita de forma simples contribuem de forma significativa com a técnica cinemática.

Em um estudo que utilizou o Chair Sit-and-Reach Test (uma das variações do TSA), foi proposta uma análise da confiabilidade interobservador. Participaram 76 voluntários (34 homens e 42 mulheres), com média de idade de 70,5 anos, que foram avaliados em dias diferentes com um intervalo de dois a cinco dias. O resultado encontrado mostrou alta confiabilidade (r= 0,92 para homens e r= 0,96 para mulheres)17. Em um outro estudo de confiabilidade interobservador, foram avaliados 46 meninas e 42 meninos, com idade entre 11 e 15 anos, com o Back Saver Sit-and-Reach Test (neste teste, cada perna é avaliada separadamente)15. Os resultados foram: CCI= 0,97 para os meninos (para ambos os lados) e CCI= 0,97 para perna direita e CCI= 0,96 para esquerda entre as meninas, o que indica alta confiabilidade. Porém, os autores não citam se houve intervalo entre os testes15. O estudo de Hui e Yuen14, com o Modified Back-Saver Sit-and-Reach Test, também mostrou ter uma alta confiabilidade interobservador, com uma amostra de 96 mulheres e 62 homens com idade entre 17 e 41 anos. O resultado foi: CCI= 0,96 para perna esquerda e CCI= 0,97 para perna direita. Estes estudos analisaram a confiabilidade apenas interobservador e usaram somente o coeficiente de correlação intraclasse (CCI) ou o coeficiente de correlação de Pearson (r) para esta análise. No presente estudo, foram realizadas a confiabilidade intra e a interobservadores da análise da cinemática angular (por meio da fotografia) e não da repetição do teste como nos estudos acima.

Cornbleet et al.9 avaliaram 410 crianças (211 meninas e 199 meninos) entre cinco e 12 anos. Dos estudos analisados, este foi o único a considerar a interferência dos fatores antropométricos, mobilidade da coluna e a abdução escapular no resultado do TSA. Os autores discutiram a idéia de que a posição final do TSA pode ser usada para a mensuração do AAQ e isto reflete um real comprimento dos músculos IT. Para isto, utilizaram um inclinômetro posicionado verticalmente ao sacro, alinhado na altura das espinhas ilíacas póstero-superiores. O valor médio do ângulo encontrado foi de 75º (DP= 10º) para os meninos e 85º (DP= 10º) para as meninas. Isto corrobora os resultados encontrados no presente estudo, no qual o gênero feminino apresentou maior flexibilidade, porém, as médias dos ângulos foram inferiores. Para toda a amostra, encontrou-se uma média de 81º (DP= 11º), o que corresponde a um comprimento normal de IT como Kendall et al.10 preconizam (80º). Os autores analisaram a confiabilidade interobservador com os primeiros 20 voluntários e, assim como outros autores, utilizaram apenas o coeficiente de correlação intraclasse (CCI), tendo como resultado uma alta confiabilidade (CCI= 0,98).

Em um outro estudo25, com proposta diferente do TSA, também foi realizada a confiabilidade intra e interobservadores da análise de uma mesma fotografia. Foram avaliadas três diferentes técnicas de mensuração da flexão anterior de tronco (Chaffin modificada, Whistance e o Marcador perpendicular) em 20 voluntários, com média de idade de 21,5 anos (DP= 2,2). Neste estudo, foi demonstrada alta confiabilidade intra-observador para as três técnicas (entre 0,94 e 0,95). Para a confiabilidade interobservadores, a técnica de Chaffin modificada apresentou confiabilidade moderada (CCI= 0,54), enquanto as demais técnicas apresentaram alta confiabilidade (CCI entre 0,97 e 0,99). A confiabilidade moderada da técnica de Chaffin modificada é justificada pela alta mobilidade de uma das referências anatômicas (rotação interna de ombro encobrindo o marcador) e dos segmentos na realização da técnica.

Muitos estudos que encontram alta confiabilidade interobservador não vêem importância na análise da confiabilidade intra-observador. Porém, é importante registrar o quanto uma técnica é confiável para um mesmo avaliador em um outro momento. A própria análise da confiabilidade necessita de dois testes estatísticos (CCI e Bland e Altman24, neste estudo, por exemplo), pois o CCI isoladamente não promove informação suficiente sobre a confiabilidade das medidas devido a: influência da magnitude da variação entre-sujeitos; não demonstração de indicação do valor medido ou suas variações; erro na medida e impossibilidade de ser interpretado clinicamente. Por outro lado, o teste de Bland e Altman24 fornece um gráfico no qual o tamanho e a amplitude das diferenças nas mensurações podem ser interpretados facilmente, erros ou outliers. Além disso, este método apresenta os valores do intervalo de confiança para a diferença da média e os limites de concordância. Estes dados, respectivamente, indicarão os erros nas mensurações e podem relacionar a aceitabilidade clínica23.

A limitação encontrada no teste foi o movimento do marcador cutâneo, desde a sua demarcação até a posição final do TSA. Alguns participantes, ao se movimentarem durante o teste, permitem que o marcador migre do local exato da referência anatômica, o que obriga a realização de um novo teste com a exata remarcação. Outra limitação consiste nas diferenças anatômicas dos participantes, como a altura de EIAS e a profundidade do trocânter maior, além dos fatores antropométricos. Isto exige dos avaliadores bom conhecimento de anatomia palpatória. Uma outra dificuldade para realização do registro das fotos foi a necessidade de o voluntário ficar com os dois pontos de referência anatômica visíveis, sendo, portanto, necessário o uso de trajes com duas peças para mulheres, por exemplo.

O TSA com a mensuração do AAQ, por meio da cinemetria, pode ser feito em qualquer ambiente onde possa ser montado um pequeno estúdio de avaliação. Para isso, deve-se utilizar um banco de Wells1 padrão e uma câmera fotográfica para registro das fotos. Esta técnica promove uma confiável e simples mensuração do comprimento dos IT quando o avaliador usa a posição final do TSA (flexão anterior máxima do tronco) com o tornozelo livre e registra o AAQ.

CONCLUSÃO

A alta confiabilidade intra e interobservador encontrada, neste estudo, foi decorrente da fácil aplicação da técnica e análise dos resultados. Deste modo, a avaliação do AAQ, por meio da análise cinemática angular, demonstra ser uma modalidade confiável e reprodutível de se avaliar os músculos IT, o que possibilita, para a prática clínica, prevenir e estabelecer um tratamento precoce e adequado.

Agradecimentos: à Fisioterapeuta Ana Paula R. G. Cardoso, pela contribuição na elaboração do projeto; à Professora Denise da Vinha Ricieri, pelo apoio técnico e às acadêmicas Beatriz I. R. de Oliveira, Marcela C. Bôer e Maria A. B. Pessan, pela ajuda no recrutamento dos voluntários e organização do local.

Recebido: 15/05/2006

Revisado: 26/01/2007

Aceito: 22/03/2007

  • 1. Wells KF, Dillon EK. The sit and reach: a test of back and leg flexibility. Res Q Exerc Sport. 1952;23:115-8.
  • 2. Lee D, Drez D, Miller MD. Orthopaedic sports medicine: principles and practice. 2Ş ed. Philadelphia: Saunders; 2002.
  • 3. Witvrouw E, Danneels L, Asselman P, D'Have T, Cambier D. Muscle flexibility as a risk factor for developing muscle injuries in male professional soccer players. Am J Sports Med. 2003; 31:41-5.
  • 4. Witvrouw E, Bellemans J, Lysens R, Danneels L, Cambier D. Intrinsic risk factors for the development of patellar tendonitis in an athletic population a two year prospective study. Am J Sports Med. 2001;29:190-5.
  • 5. Hartig DE, Henderson JM. Increasing hamstring flexibility decreases lower extremity overuse injuries in military basic trainees. Am J Sports Med. 1999;27:173-6.
  • 6. Woods C, Hawkins RD, Maltby S, Hulse M, Thomas A, Hod-son A. The football association medical research programme: an audit of injuries in professional football analysis of hamstring injuries. Br J Sports Med. 2004;38:36-41.
  • 7. Busquet L. As cadeias musculares. 1Ş ed. Piracicaba: Skin Direct Store; 2001.
  • 8. Barlow A, Clarke R, Johnson N, Seabourne B, Thomas D, Gal J. Effect of massage of the hamstring muscle group on perfor-mance of the sit-and-reach test. Br J Sports Med. 2004;38: 349-51.
  • 9. Cornbleet S, Woolsey N. Assessment of hamstring muscle length in school-aged children using the sit-and-reach test and the inclinometer measure of hip joint angle. Phys Ther. 1996; 76:850-5.
  • 10. Kendall FP, McCreary E, Provance PG. Músculos: provas e funções. 4Şed. São Paulo: Manole; 1995.
  • 11. Jackson A, Baker A. The relationship of the sit-and-reach test to criterion measures of hamstring and back flexibility in young females. Res Q Exerc Sport. 1986;57:183-6.
  • 12. Hoeger WWK, Hopkins DR. A comparison of the sit-and-reach and the modified sit and reach in the measurement of flexibility in women. Res Q Exerc Sport. 1992;63:191-5.
  • 13. Lemmink KAPM, Kemper HCG, de Greef MHG, Rispens P, Stevens M. The validity of the sit-and-reach test and the modified sit-and-reach test in middle-aged to older men and women. Res Q Exerc Sport. 2003;74:331-7.
  • 14. Hui SSC, Yuen PY. Validity of the modified back-saver sit-and-reach test: a comparison with other protocols. Med Sci Sports Exerc. 2000;32:1655-9.
  • 15. Patterson P, Wilksten DL, Ray L, Flanders C, Sanphy D. The validity and reliability of the back-saver sit-and-reach test in middle school girls and boys. Res Q Exerc Sport. 1996;67: 448-51.
  • 16. Minkler S, Patterson P. The validity of the modified sit-and-reach test in college-age students. Res Q Exerc Sport. 1994;65: 189-92.
  • 17. Jones CJ, Rikli RE, Max J, Noffal G. The reliability and vali-dity of a chair sit-and-reach test as a measure of hamstring flexibility in older adults. Res Q Exerc Sport. 1998;69:338-43.
  • 18. Hui SC, Yuen PY, Morrow JR, Jackson AW. Comparison of the criterion-related validity of sit-and-reach tests with and without limb length adjustment in Asian adults. Res Q Exerc Sport. 1999;70:401-8.
  • 19. Baltaci G, Un N, Tunay V, Besler A, Gerçeker S. Comparison of three different sit-and-reach test for measurement of hamstring flexibility in female university students. Br J Sports Med. 2003;37:59-61.
  • 20. Amadio AC, Costa PHL, Sacco ICN, Serrão JC, Araújo RC, Mochiziki L, et al. Introdução à análise do movimento humano descrição e aplicação dos métodos biomecânicos de medição. Rev Bras Fisioter. 1999;3:41-54.
  • 21. Chen YL. Accuracy and repeatability of the stick marker tech-nique for external measurement of the sacral angle during trunk flexion. Int J Ind Ergon. 2000;26:101-7
  • 22. Rosner B. Fundamentals of biostatistics. 5Ş ed. Duxbury: Thonsom Learning; 2000.
  • 23. Rankin G, Stokes M. Reliability of assessment tools in reha-bilitation: an illustration of appropriate statistical analyses. Clin Rehabil. 1998;12:187-99.
  • 24. Bland JM, Altman DG. Statistical methods for assessing agreement between two methods of clinical measurements. Lancet. 1986;1:307-10.
  • 25. Sato TO, Vieira ER, Gil Coury HJC. Análise da confiabilidade de técnicas fotométricas para medir a flexão anterior de tronco. Rev Bras Fisioter. 2003;7;53-9.
  • Endereço para correspondência:

    Jefferson Rosa Cardoso
    Hospital Universitário
    Av. Robert Kock, 60
    CEP 86038-440, Londrina, PR - Brasil
    e-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      27 Fev 2008
    • Data do Fascículo
      Abr 2007

    Histórico

    • Aceito
      22 Mar 2007
    • Recebido
      12 Maio 2006
    • Revisado
      26 Jan 2007
    Associação Brasileira de Pesquisa e Pós-Graduação em Fisioterapia Rod. Washington Luís, Km 235, Caixa Postal 676, CEP 13565-905 - São Carlos, SP - Brasil, Tel./Fax: 55 16 3351 8755 - São Carlos - SP - Brazil
    E-mail: contato@rbf-bjpt.org.br