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Avaliação de métodos de diagnóstico da lesão de cárie

Evaluation of methods for diagnosing dental carious lesions

Resumos

O objetivo deste trabalho foi comparar in vitro a efetividade de três métodos de diagnóstico da lesão de cárie em 26sítios de interesse, dispostos na face palatina de 20 coroas de dentes caninos permanentes de humanos. Quatro examinadores receberam orientação teórico-prática para o diagnóstico, através de três métodos: inspeção visual; táctil (inspeção visual - sonda exploradora com ponta romba); e videoscópico (sistema AcuCam). Para a validação dos dados, os dentes foram seccionados paralelamente ao seu longo eixo por um disco de diamante e analisados histologicamente em um microscópio estereoscópico com aumento de 40X. Diagnósticos compatíveis com o exame histológico apresentaram percentual de acerto no método de inspeção visual de 40,4%, no exame táctil de 38,5% e no videoscópico de 41,3%, resultados que não demonstraram diferença estatisticamente significante. Concluiu-se, pelos resultados obtidos, que os três métodos apresentaram acuidade semelhante no diagnóstico da lesão de cárie; dentre os métodos estudados, o exame ao videoscópio foi o que mais se aproximou do histológico, seguido pelo visual; o mais distante foi o táctil. Constatou-se também uma elevada porcentagem de erro de diagnósticos (59,9%), o que conseqüentemente acarretaria uma conduta terapêutica inadequada

Diagnóstico bucal; Cárie dentária; Cúspide


The objective of this study was to compare in vitro the effectiveness of three methods for diagnosing carious lesions in 26 sites on palatal surfaces of 20 crowns in human permanent cuspids. Four examiners were given theoretical-practical guidance for diagnosis, by means of three methods: visual inspection, tactile (visual inspection - explorer probe with blunt tip); and videoscope (AcuCam System). To validate data, the teeth were sectioned parallel to the long axis with a diamond disk and analyzed histologically in a stereoscopic microscope with X40 magnification. Diagnoses compatible with the histological examination showed a percentile of accuracy of 40.4% for the visual inspection method, of 38.5% for the tactile examination, and of 41.3% for the videoscopic exam, results that did not demonstrate a statistically significant difference. Results obtained led to the conclusion that the three methods presented similar precision in the diagnosis of carious lesions. Of the methods studied, the videoscopic examination came closest to the histologic followed by the visual, and the furthest was the tactile; a high percentage of error in diagnosis (59.9%) was also verified that would consequently engender inadequate therapeutic conduct

Diagnosis, oral; Dental caries; Cuspid


AVALIAÇÃO DE MÉTODOS DE DIAGNÓSTICODA LESÃO DE CÁRIE

EVALUATION OF METHODS FOR DIAGNOSINGDENTAL CARIOUS LESIONS

Eleni Cristina KAIRALLA** Aluna do Curso de Graduação da Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo. Aluna do Curso de Graduação da Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo.** Professor Doutor da Disciplina de Endodontia do Departamento de Dentística da Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo.*** Professor Doutor do Departamento de Materiais Odontológicos e Prótese da Faculdade de Odontologia do Campus de São José dos Campos - UNESP.

José Luiz LAGE-MARQUES*** Aluna do Curso de Graduação da Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo. Aluna do Curso de Graduação da Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo.** Professor Doutor da Disciplina de Endodontia do Departamento de Dentística da Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo.*** Professor Doutor do Departamento de Materiais Odontológicos e Prótese da Faculdade de Odontologia do Campus de São José dos Campos - UNESP.

Sigmar de Mello RODE**** Aluna do Curso de Graduação da Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo. Aluna do Curso de Graduação da Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo.** Professor Doutor da Disciplina de Endodontia do Departamento de Dentística da Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo.*** Professor Doutor do Departamento de Materiais Odontológicos e Prótese da Faculdade de Odontologia do Campus de São José dos Campos - UNESP.

KAIRALLA, E. C. et al. Avaliação de métodos de diagnóstico da lesão de cárie. Rev Odontol Univ São Paulo, v.11, p.27-34, 1997. Suplemento.

O objetivo deste trabalho foi comparar in vitro a efetividade de três métodos de diagnóstico da lesão de cárie em 26sítios de interesse, dispostos na face palatina de 20 coroas de dentes caninos permanentes de humanos. Quatro examinadores receberam orientação teórico-prática para o diagnóstico, através de três métodos: inspeção visual; táctil (inspeção visual - sonda exploradora com ponta romba); e videoscópico (sistema AcuCam). Para a validação dos dados, os dentes foram seccionados paralelamente ao seu longo eixo por um disco de diamante e analisados histologicamente em um microscópio estereoscópico com aumento de 40X. Diagnósticos compatíveis com o exame histológico apresentaram percentual de acerto no método de inspeção visual de 40,4%, no exame táctil de 38,5% e no videoscópico de 41,3%, resultados que não demonstraram diferença estatisticamente significante. Concluiu-se, pelos resultados obtidos, que os três métodos apresentaram acuidade semelhante no diagnóstico da lesão de cárie; dentre os métodos estudados, o exame ao videoscópio foi o que mais se aproximou do histológico, seguido pelo visual; o mais distante foi o táctil. Constatou-se também uma elevada porcentagem de erro de diagnósticos (59,9%), o que conseqüentemente acarretaria uma conduta terapêutica inadequada.

UNITERMOS: Diagnóstico bucal; Cárie dentária; Cúspide.

INTRODUÇÃO

A cárie dentária pode ser conceituada como sendo uma doença multifatorial e crônica, que ocorre quando há um desequilíbrio do processo dinâmico entre a estrutura dentária e o seu meio ambiente, culminando numa desmineralização ácida localizada. Depende, para tanto, da interação de três fatores essenciais: substrato cariogênico (dieta), microbiota bucal cariogênica e estrutura dentária suscetível.

A cárie é um problema importante de saúde pública, por ser causa comum de morbidade, afetando cerca de 90% da população (ARAÚJO; ARAÚJO1, 1984). Esse alto índice decorre da utilização inadequada, pela comunidade, dos meios de prevenção existentes.

O processo de desenvolvimento da lesão de cárie apresenta um longo período latente, de meses a anos, desde as primeiras modificações, que são alterações bastante sutis, até poder ser caracterizado como doença. Sua progressão, após o reconhecimento dos sinais clínicos precoces, se faz lentamente, podendo ser detida ou mesmo revertida através do uso de medidas preventivas.

Baseada nessa capacidade de reversibilidade, a filosofia do tratamento sofreu uma evolução, substituindo o diagnóstico precoce e a restauração imediata pelo diagnóstico precoce e o tratamento não invasivo (PITTS18, 1992).


A realização desse diagnóstico precoce é complexa, pois muitas vezes a lesão só se torna visível quando já se encontra relativamente avançada no exame histopatológico (KIDD11, 1984). A dificuldade pode advir da presença de esmalte aparentemente intacto sobre uma lesão dentinária (KIDD et al.12, 1993), ou ainda da possibilidade de selamento biológico (GALIL; GWINNET10, 1975).

O uso da sonda exploradora, tradicional método de diagnóstico, tem sido considerado um procedimento invasivo (EKSTRAND et al.9, 1987), além de atuar como meio transmissor de microrganismos entre os elementos de uma mesma cavidade bucal (LOESCHE et al.13, 1979).

Busca-se, portanto, melhorar os métodos de diagnóstico da cárie dentária já existentes e desenvolver outros, tais como a transiluminação com fibra óptica (FOTI), radiografias digitais, videoscópio e medida de resistência elétrica (MRE), para que as exigências da nova filosofia de tratamento sejam alcançadas e satisfaçam os recentes modelos epidemiológicos e morfológicos referentes a essa patologia.

Tendo em vista a escassa literatura a respeito dos métodos de diagnóstico da lesão de cárie na face palatina de dentes permanentes anteriores, este estudo propõe-se a avaliar in vitro a efetividade dos métodos de inspeção visual, táctil (inspeção visual associada a uma sonda exploradora com ponta romba) e videoscópico (sistema AcuCam) na face palatina de dentes caninos permanentes de humanos, considerando sua importância no que diz respeito à aplicação de recursos preventivos ao invés de recursos curativos.

MATERIAL E MÉTODO

Foram selecionados 26 sítios de interesse na face palatina de 20 coroas de dentes caninos permanentes humanos, sendo que pelo menos um deles localizava-se na região de cíngulo, apresentando-se como uma mancha aparentemente sem cavidade visível a olho nu.

Realizou-se uma profilaxia, em todas as coroas, com taça de borracha e pedra pomes, e numerou-se aleatoriamente a face vestibular.

Através do "scanner" (HP Scanjet II cx), foi obtida uma imagem da face palatina dos espécimes, onde foram demarcados os sítios a serem analisados - mapeamento dos sítios (Figura 1) -, proporcionando uma melhor visualização e identificação dos mesmos pelo examinador.

Para facilitar o manuseio dos espécimes, estes foram embutidos em um anel de PVC de 1/2polegada e 10mm de altura, em cujo centro foi incluída, com resina acrílica ativada quimicamente, uma haste em L de fio ortodôntico 0,7mm previamente fixada com adesivo à base de cianoacrilato na porção cervical da coroa. Identificou-se a face externa do corpo-de-prova obedecendo a prévia numeração das coroas.

A seguir, os corpos-de-prova foram acondicionados em uma câmara de hidratação, onde os suportes foram posicionados horizontalmente no interior da caixa, acomodando a porção coronária sobre uma camada de algodão embebido em soro fisiológico, mantidos dessa forma até o momento da avaliação.

Os sítios foram avaliados por quatro examinadores (A, B, C, D), cirurgiões-dentistas com dois a três anos de exercício profissional e estagiários do Departamento de Dentística da F.O.U.S.P., que foram previamente calibrados (teórico-prático) com os três métodos empregados, sempre na seguinte seqüência de exame: inspeção visual; táctil (inspeção visual e sonda exploradora com ponta romba) e método videoscópico (AcuCam).

Todas as avaliações foram registradas seguindo critérios padronizados, sendo independentes entre os examinadores e os diferentes métodos, tornando a avaliação isenta de quaisquer possíveis influências, uma vez que somente os autores conheciam a identificação dos dentes. Entre cada exame ocorreu um intervalo de, no mínimo, 48 h.

Métodos de diagnóstico dos sítios

Inspeção visual

Cada examinador recebeu uma cópia do mapeamento dos sítios e uma ficha de exame.

O corpo-de-prova, após ser retirado da câmara de hidratação, foi posicionado sobre a mesa auxiliar do equipo, seco com seringa de ar comprimido e iluminado com o refletor a uma distância entre 15-25cm, para o exame a olho nu.

O diagnóstico de cada sítio, obtido através da inspeção visual, foi registrado pelo examinador de acordo com os seguintes critérios (ROMANO19, 1995):

  • 0 - ausência de lesão de cárie;

  • 1 - lesão do esmalte superficial;

  • 2 - lesão do esmalte mais profundo;

  • 3 - lesão de cárie em nível de dentina.

Estabelecido o diagnóstico do(s) sítio(s) examinado(s), o espécime foi recolocado na câmara de hidratação seguindo-se até o 20º corpo-de-prova.

Táctil (inspeção visual e sonda exploradora)

Para a realização do exame táctil, utilizou-se uma sonda exploradora nº5 (Duflex), cujo diâmetro da ponta foi modificado, através de lixamento, para 0,4mm (medidas obtidas no paquímetro digital - Digimatic caliper (Mitutoyo Corporation, Japão)).

Os examinadores foram instruídos a não utilizar pressão durante a avaliação, mas, caso fosse necessário, estavam calibrados para que a realizassem de forma leve e inclinada (e não perpendicular) à superfície examinada, apenas buscando tatear as bordas dos sítios.

Cada examinador recebeu uma cópia do mapeamento dos sítios e uma ficha de exame. Os demais procedimentos e critérios de registro da avaliação foram os mesmos descritos para o exame de inspeção visual.

Videoscópico

No sistema AcuCam utilizado, o endoscópio, com sistema de iluminação de fibra óptica, capturava a imagem em espelho e proporcionava um aumento de 28X.

O examinador teve ampla liberdade de manuseio, tanto da microcâmera quanto do espécime, a fim de adequar a melhor posição e foco para observação do sítio em questão.

De posse do mapeamento dos sítios e de uma ficha de exame, cada examinador avaliou a imagem ampliada do sítio, e o diagnóstico foi registrado obedecendo os mesmos critérios anteriormente descritos.

Exame histológico

Para a validação dos dados, utilizou-se o método considerado por WENZEL et al.22 (1994) como sendo o melhor para análise das secções, ou seja, os sítios foram seccionados com auxílio de um disco de diamante no sentido que melhor permitisse a avaliação da presença ou não da lesão. Determinada a direção da secção (paralela ao longo eixo dos dentes), o espécime foi submetido a cortes que tangenciavam o sítio em questão, utilizando o equipamento LabCut 1010 (EXTEC).

Após a secção dos 26 sítios, realizou-se a avaliação em microscópio estereoscópico (Nikon), com aumento de 40X.

O registro do diagnóstico foi realizado segundo os critérios de DOUGLASS; McNEIL6 (1983):

  • 0 - não desmineralizada;

  • 1 - desmineralização do esmalte mais superficial;

  • 2 - desmineralização no limite amelocementário;

  • 3 - desmineralização em nível de dentina.

RESULTADOS

Para a validação do método de diagnóstico, utilizou-se a classificação binária proposta por DOWNER7 em 1989, em que apenas se considera a presença ou ausência da lesão de cárie, independentemente do fato de que o critério adotado classificava a lesão quanto ao estágio de progressão em que se encontrava.

Esse teste tem sua expressão fornecida nos seguintes termos:

  • Sensibilidade - probabilidade de o teste fornecer resultados positivos quando a doença se faz presente (incluindo diagnósticos positivo verdadeiro - PV e falso negativo - FN), portanto, sensibilidade =

    PV / PV+FN;

  • Especificidade - probabilidade de o teste fornecer resultados negativos na ausência da doença (incluindo diagnósticos negativo verdadeiro - NV e falso positivo - FP), portanto, especificidade=NV / NV+FP.

A comparação dos dados foi realizada entre os achados experimentais e os resultados do exame histológico (Tabela 2).

Amostras comparadas (comparação duas a duas) Diferenças soma (postos)Valores críticos (6)Significância 0,050,010,001visual versus táctil3,000015,851521,747729,6019nsvisual versus vídeo7,500015,851521,747729,6019nsvisual versus histológico5,500015,851521,747729,6019nstáctil versus vídeo10,500015,851521,747729,6019nstáctil versus histológico8,500015,851521,747729,6019nsvídeo versus histológico2,000015,851521,747729,6019ns
TABELA 1 - Comparação entre as somas dos postos das amostras (teste de Friedman).

Teste/ExameVisualTáctilVideoscópicoSensibilidade0,780,780,83Especificidade0,500,630,38
TABELA 2 - Comparação entre os achados experimentais e o histológico.

DISCUSSÃO

A análise histológica dos 26 sítios selecionados na face palatina de 20 dentes caninos permanentes humanos demonstrou que 84,6% apresentavam lesão de cárie quando os cortes foram analisados ao microscópio estereoscópico (40X). Das lesões, 90,9% estavam em esmalte e 9,1% atingiram a dentina.

O uso da sonda exploradora não apresentou diferença estatisticamente significante em relação à inspeção visual, pois o resultado comparativo entre o histológico e os diagnósticos obtidos pelos quatro examinadores mostrou que o método de inspeção visual apresentou uma freqüência de diagnósticos positivos verdadeiros de 40,4%, enquanto que a do exame táctil foi de 38,5%. DOWNER; O'MULLANE8 (1975) e LUSSI16 (1991) também observaram resultado parecido avaliando molares permanentes e ROMANO19 (1995), molares decíduos.

Além disso, BERGMAN; LINDÉN4 (1969); VAN DORP et al.21 (1988) e BELTRAMI et al.3 (1990) consideraram que a sondagem do esmalte desmineralizado poderia causar um efeito traumático irreversível (cavitação). LOESCHE et al.13, 14 (1973, 1979) apontaram a possibilidade de a sonda servir como meio transmissor de microrganismos cariogênicos entre os dentes da mesma boca. CHAN5, em 1993, criticou os autores americanos e a Organização Mundial de Saúde17 (1991) por recomendarem o uso da sonda exploradora para o diagnóstico da lesão primária na superfície oclusal, além do que, o método somente é capaz de medir cárie quando há presença de cavitação, o que não corresponde às necessidades clínicas.

Observou-se que, quanto à especificidade, o exame videoscópico obteve o menor índice (0,38), seguido pelo exame visual (0,5) e depois pelo táctil (0,63), o que expressa uma probabilidade maior de um sítio que não apresenta lesão de cárie receber um diagnóstico positivo quando se emprega o videoscópio, seguido pelo exame visual, sendo, portanto, o exame táctil o mais específico. Resultados semelhantes foram encontrados por ROMANO19, em 1995.

No entanto, em vista de não existir diferença estatisticamente significante na capacidade de diagnosticar lesão de cárie e considerando os aspectos anteriormente descritos, entende-se que a sonda exploradora, mesmo com ponta romba, não é um instrumento que deva ser utilizado rotineiramente como auxiliar em métodos de diagnóstico de cárie superficial.

O método videoscópico (sistema AcuCam), que proporcionou um aumento da imagem em 28X do sítio a ser analisado, obteve uma freqüência de diagnósticos positivos verdadeiros concordantes com o exame histológico em 41,3%, resultado que não demonstrou diferença estatisticamente significante quando comparado aos métodos de inspeção visual e de exame táctil, embora o aumento da imagem pudesse facilitar o diagnóstico. Pode-se considerar, como fator de interferência, a dificuldade encontrada pelos examinadores devido à pouca familiaridade com o método.

Já ROMANO19 (1995), analisando a superfície oclusal de molares decíduos, obteve uma freqüência de 66,7%, resultado que demonstrou ser significante em nível de 0,1% sobre os demais métodos, talvez por ter perdido 44,6% dos sítios avaliados nessa análise. Ressaltou, ainda, que esse método aumentou a freqüência de diagnósticos falsos positivos, diminuindo a sua especificidade, sendo necessária a realização de estudos adicionais.

Quanto à sensibilidade, o exame ao videoscópio obteve o maior índice (0,83), enquanto os exames visual e táctil foram semelhantes (0,78), o que significa que a probabilidade de uma lesão de cárie positiva não ser diagnosticada é maior nos testes visual e táctil do que no realizado com o videoscópio.

Uma das principais desvantagens do videoscópio, apontada por LONGBOTTOM; PITTS15 (1990), é a necessidade de se trabalhar em um campo estritamente seco, pois qualquer quantidade de saliva pode alterar o diagnóstico devido ao aumento da imagem. Neste estudo, por ter sido realizado in vitro, esse fator inexistiu.

Constatou-se que a concordância entre os examinadores para diagnosticar todas as lesões foi baixa para todos os métodos, 40,1% de acerto (Gráfico 1), sendo que o exame ao videoscópio foi o que mais se aproximou do exame histológico, provavelmente devido ao aumento da imagem que promove (28X), seguido do visual e, depois, do táctil (Gráfico 2), embora não tenha sido encontrada diferença estatisticamente significante entre os métodos.

No Gráfico 1, notou-se também a uniformidade no índice de acerto/erro de diagnóstico nos diversos métodos por cada examinador quando comparados com o exame histológico, o que evidenciou uma correta calibragem prévia e um nível equivalente de conhecimento dos examinadores. Essa uniformidade não foi descrita por BADER; SHUGARS2 (1993), que relataram uma grande variação entre os profissionais devido às diferenças individuais quanto aos critérios de investigação e de identificação das condições da lesão, bem como do tipo de intervenção a ser adotada.

No Gráfico 2, demonstrou-se que, na ausência de lesão de cárie (0), ou quando a cárie era evidente, atingindo dentina (3), houve uma maior uniformidade de resultados. Quando a lesão de cárie ocorreu no esmalte (1 e 2), houve uma maior discordância, mostrando que os profissionais tiveram maior dificuldade em diagnosticar nessa situação.

De acordo com os resultados deste trabalho e considerando a rotina da grande maioria dos profissionais e as implicações, para a população brasileira, do ponto de vista econômico e de recursos humanos, o método de eleição para diagnosticar a lesão de cárie na superfície palatina de dentes caninos permanentes, dentre os estudados, foi o da inspeção visual.

DOWNER7, após realizar uma revista da literatura em 1989, também sugeriu, como método de eleição para o diagnóstico da lesão de cárie, a técnica visual, ao levar em consideração a lenta progressão da doença e sua baixa prevalência em países desenvolvidos, enfatizando ainda sua alta especificidade.

GRÁFICO 1
- Diagnóstico dos sítios analisados (26), por método de avaliação de cada examinador, coincidente com o resultado do exame histológico.

Entretanto, não se pode descartar as vantagens da utilização de recursos mais sofisticados, como o videoscópio (que é um equipamento específico e requer treinamento profissional adequado), como um recurso auxiliar para o diagnóstico da lesão de cárie.

SILVA et al.20 (1992) e ROMANO19 (1995) ressaltaram ainda a necessidade de se ter maior cautela na escolha de tratamentos radicais e da prática de uma observação clínica rotineira bem documentada, além da aplicação de medidas preventivas e do diagnóstico precoce, pois são pontos fundamentais, tendo em vista que a cárie é uma doença progressiva e não um estágio particular de um evento.

GRÁFICO 2 -
Curva da média dos resultados obtidos por método de diagnóstico (critério de avaliação: 0 - ausência de lesão de cárie; 1 - lesão de esmalte superficial; 2 - lesão do esmalte mais profundo; 3 - lesão de cárie em nível de dentina).

Nesse contexto, cabe realçar a importância da orientação e motivação do paciente para com os cuidados de higiene bucal, lembrando que não é somente o dente que deve ser tratado e, sim, o paciente como um todo; portanto, o risco frente à doença cárie deve sempre ser considerado.

CONCLUSÕES

Com base nos resultados apresentados no presente estudo, concluiu-se que:

1. A efetividade dos métodos de diagnóstico de lesão de cárie na face palatina de dentes caninos permanentes humanos - inspeção visual, táctil (inspeção visual e sonda exploradora com ponta romba) e videoscópico - foi estatisticamente semelhante ao exame histológico.

2. Dentre os métodos estudados, o exame videoscópico foi o que mais se aproximou do histológico, seguido pelo visual e depois pelo táctil.

3. Quanto à sensibilidade, a probabilidade de uma lesão de cárie positiva não ser diagnosticada é maior nos testes visual e táctil do que naquele realizado com o videoscópio.

4. Quanto à especificidade, existe uma probabilidade maior de um sítio que não apresenta lesão de cárie receber um diagnóstico positivo quando se emprega o exame videoscópico, seguido pelo exame visual, sendo, portanto, o exame táctil o mais específico.

5. Houve uma elevada porcentagem de diagnósticos das lesões de cárie falso positivo e falso negativo, atingindo 59,9%.

AGRADECIMENTOS

Aos Professores Doutores Fernando Xavier da Silveira e Moacyr Domingos Novelli, pela colaboração na execução deste trabalho.

KAIRALLA, E. C. et al. Evaluation of methods for diagnosing dental carious lesions. Rev Odontol Univ São Paulo, v.11, p.27-34, 1997. Suplemento.

The objective of this study was to compare in vitro the effectiveness of three methods for diagnosing carious lesions in 26 sites on palatal surfaces of 20 crowns in human permanent cuspids. Four examiners were given theoretical-practical guidance for diagnosis, by means of three methods: visual inspection, tactile (visual inspection - explorer probe with blunt tip); and videoscope (AcuCam System). To validate data, the teeth were sectioned parallel to the long axis with a diamond disk and analyzed histologically in a stereoscopic microscope with X40 magnification. Diagnoses compatible with the histological examination showed a percentile of accuracy of 40.4% for the visual inspection method, of 38.5% for the tactile examination, and of 41.3% for the videoscopic exam, results that did not demonstrate a statistically significant difference. Results obtained led to the conclusion that the three methods presented similar precision in the diagnosis of carious lesions. Of the methods studied, the videoscopic examination came closest to the histologic followed by the visual, and the furthest was the tactile; a high percentage of error in diagnosis (59.9%) was also verified that would consequently engender inadequate therapeutic conduct.

UNITERMS: Diagnosis, oral; Dental caries; Cuspid.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Recebido para publicação em 30/01/97

Aceito para publicação em 25/06/97

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  • FIGURA 1 - Mapeamento dos sítios.
  • * Aluna do Curso de Graduação da Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo.
    Aluna do Curso de Graduação da Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo.
    ** Professor Doutor da Disciplina de Endodontia do Departamento de Dentística da Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo.
    *** Professor Doutor do Departamento de Materiais Odontológicos e Prótese da Faculdade de Odontologia do Campus de São José dos Campos - UNESP.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      28 Jan 2000
    • Data do Fascículo
      1997

    Histórico

    • Aceito
      25 Jun 1997
    • Recebido
      30 Jan 1997
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