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Chá-mate e café como fontes de hidrocarbonetos policíclicos aromáticos (HPAs) na dieta da população de Campinas

Coffee and mate tea as a dietary source of polycyclic aromatic hydrocarbon (PAHs) in Campinas

Resumos

Com o objetivo de determinar os níveis dos contaminantes hidrocarbonetos policíclicos aromáticos (HPAs) em chá-mate e café e avaliar a contribuição desses produtos como fonte de HPAs na dieta da população de Campinas, três marcas com três diferentes lotes de chá-mate e café em pó, totalizando 18 amostras, foram analisadas. Os dados de consumo de chá-mate e café foram obtidos de uma pesquisa de hábitos alimentares feita no ano de 1993 junto à população local, através do método de freqüência de alimentos. A determinação de HPAs foi conduzida por cromatografia líquida de alta eficiência com detecção por fluorescência. A presença de diferentes hidrocarbonetos foi observada em todas as amostras de café analisadas, em níveis variando tanto entre as marcas quanto em função da técnica de preparo da bebida. A quantidade média de HPAs totais encontrada no café (bebida pronta para consumo) foi de 10,12mig/kg, enquanto que o chá-mate apresentou um nível de contaminantes significativamente menor (sigma=0,70mig/kg). Considerando-se a estimativa de consumo diário médio per capita de 69,79g de chá-mate e de 86,77g de café, pode-se considerar que o chá-mate e o café aportam diariamente cerca de 0, 05mig e 0, 88mig de HPAs totais, respectivamente, na dieta da população estudada (n=600 indivíduos).

hidrocarboneto policíclico aromático; chá-mate; café


In order to estimate the contribution of mate tea and regular coffee as a source of PAHs in the diet of the population of Campinas, SP, Brazil, different batches and brands of these products, totaling 18 samples, were analysed for PAH. The consumption data were obtained from a dietary survey (frequency recall), which took place in Campinas in 1993. PAH levels in the products were determined by high performance liquid chromatography with fluorescence detection. Different PAHs were detected in all samples of coffee, at levels varying with the brands and the beverage preparation technique. The mean total PAH content in coffee was 10.12mug/kg, while mate tea showed a relatively lower level of contamination (sigma=0.70mug/kg). Considering the per capita average daily consumption estimates of 69.79g of mate tea and 86.77g of coffee, one can assume that mate tea and coffee contribute with approximately 0.05mug and 0.88mug of total PAHs, respectively, to the dietary intake of these contaminants by the studied population (n=600).

Polycyclic aromatic hydrocarbons; coffee; mate tea


Chá-mate e café como fontes de hidrocarbonetos policíclicos aromáticos (HPAS) na dieta da população de Campinas

Coffee and mate tea as a dietary source of polycyclic aromatic hydrocarbon (PAHs) in Campinas

Mônica Cristiane Rojo de Camargo; Maria Cecília Figueiredo Toledo

Faculdade de Engenharia de Alimentos, Departamento de Ciência de Alimentos, Universidade Estadual de Campinas, CP 6121, CEP 13087-970, Campinas, SP, Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência Mônica Cristiane Rojo de Camargo Faculdade de Engenharia de Alimentos Departamento de Ciência de Alimentos, Universidade Estadual de Campinas, CP 6121 CEP 13087-970, Campinas, SP, Brasil E-mail: mcr@bestway.com.br

RESUMO

Com o objetivo de determinar os níveis dos contaminantes hidrocarbonetos policíclicos aromáticos (HPAs) em chá-mate e café e avaliar a contribuição desses produtos como fonte de HPAs na dieta da população de Campinas, três marcas com três diferentes lotes de chá-mate e café em pó, totalizando 18 amostras, foram analisadas. Os dados de consumo de chá-mate e café foram obtidos de uma pesquisa de hábitos alimentares feita no ano de 1993 junto à população local, através do método de freqüência de alimentos. A determinação de HPAs foi conduzida por cromatografia líquida de alta eficiência com detecção por fluorescência. A presença de diferentes hidrocarbonetos foi observada em todas as amostras de café analisadas, em níveis variando tanto entre as marcas quanto em função da técnica de preparo da bebida. A quantidade média de HPAs totais encontrada no café (bebida pronta para consumo) foi de 10,12mg/kg, enquanto que o chá-mate apresentou um nível de contaminantes significativamente menor (S=0,70mg/kg). Considerando-se a estimativa de consumo diário médio per capita de 69,79g de chá-mate e de 86,77g de café, pode-se considerar que o chá-mate e o café aportam diariamente cerca de 0, 05mg e 0, 88mg de HPAs totais, respectivamente, na dieta da população estudada (n=600 indivíduos).

Palavras-chave: hidrocarboneto policíclico aromático; chá-mate, café.

SUMMARY

In order to estimate the contribution of mate tea and regular coffee as a source of PAHs in the diet of the population of Campinas, SP, Brazil, different batches and brands of these products, totaling 18 samples, were analysed for PAH. The consumption data were obtained from a dietary survey (frequency recall), which took place in Campinas in 1993. PAH levels in the products were determined by high performance liquid chromatography with fluorescence detection. Different PAHs were detected in all samples of coffee, at levels varying with the brands and the beverage preparation technique. The mean total PAH content in coffee was 10.12mg/kg, while mate tea showed a relatively lower level of contamination (S=0.70mg/kg). Considering the per capita average daily consumption estimates of 69.79g of mate tea and 86.77g of coffee, one can assume that mate tea and coffee contribute with approximately 0.05mg and 0.88mg of total PAHs, respectively, to the dietary intake of these contaminants by the studied population (n=600).

Key words: Polycyclic aromatic hydrocarbons; coffee; mate tea.

1 – INTRODUÇÃO

Os hidrocarbonetos policíclicos aromáticos (HPAs) são um grupo de compostos que têm sido continuamente objeto de muito interesse, devido aos seus potenciais mutagênicos e carcinogênicos [7, 8].

Quatro fontes são consideradas como as principais responsáveis pela presença de HPAs em alimentos e bebidas: fontes naturais (queimadas em florestas, processos geoquímicos); poluição ambiental (tráfego, sistemas de aquecimento, atividades industriais, vazamentos de óleo); alguns tipos de processamentos (defumação, secagem direta com madeira, torrefação) e materiais de embalagem [1, 5, 8, 10, 11].

A contaminação do café por HPAs ocorre durante o processo de torrefação dos grãos [9]. LICKINT (1938), citado por KRUIJF, SCHOUTEN, VAN DER ETEGEN [9], foi o primeiro pesquisador a sugerir a possível formação de HPAs durante a torrefação. Depois disso, vários pesquisadores estudaram a presença desses hidrocarbonetos em café (KURATSUNE & HUEPER, 1960; FRITZ, 1968; LINTAS et al. 1979; BORIES & GASC, 1980; GUYOT et al. 1982, citados por HISCHENHUBER & STIJVE [6]). Inicialmente, acreditava-se que grande parte dos HPAs presentes no pó passasse para a bebida [6]. No entanto, pesquisas posteriores sugeriram que apenas 20 a 30% (ou até menos) dos HPAs são extraídos do pó, resultado este confirmado por HISCHENHUBER & STIJVE [6], KRUIJF, SCHOUTEN, VAN DER ETEGEN [9] e LARSSON [10].

Segundo LARSSON [10], o chá, em geral, apresenta níveis superiores de HPAs em relação ao café torrado, sendo a poluição ambiental, aliada à secagem direta das folhas de chá os responsáveis pela contaminação. Ainda, segundo o mesmo autor, apenas pequena quantidade desses compostos passa para a bebida após o processo de infusão. Entretanto, estudos com a erva-mate realizados pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, em parceria com o Laboratório de Toxicologia da Faculdade de Engenharia de Alimentos da Unicamp, evidenciaram níveis bastante elevados de benzo(a)pireno no chimarrão, bebida feita com erva-mate (Ilex paraguarensis), típica da região Sul do país [14]. De acordo com os autores, tal fato pode ser justificado pela presença do pó da erva na infusão, já que a bomba não dispõe de um mecanismo de filtragem apropriado.

O presente estudo teve por objetivos investigar a presença de HPAs em amostras de chá-mate e café em pó, disponíveis comercialmente, e avaliar sua importância como fonte desses contaminantes na dieta da população de Campinas, SP.

2 – MATERIAL E MÉTODOS

2.1 – Obtenção de dados de consumo

A participação do chá-mate e do café na dieta da população de Campinas, SP, foi obtida a partir de uma pesquisa feita em 1993, onde 600 indivíduos, com idade entre 9 e 80 anos, foram questionados sobre seus hábitos alimentares em relação aos respectivos produtos [4]. A partir de dados obtidos pelo método da freqüência de alimentos, foram estimados os consumos médio e máximo de café e chá-mate, conforme apresentado na Tabela 1.

2.2 – Amostras

Amostras de três marcas de pó de café e de chá-mate a granel foram obtidas no comércio local, em épocas distintas, perfazendo três lotes diferentes de cada marca, num total de 18 amostras. As amostras foram preparadas para a análise como descrito a seguir:

Chá-mate a granel: pesaram-se 25g de chá num béquer de 1L, onde foram adicionados 500mL de água destilada fervente, ficando em infusão por 5 minutos, de acordo com as recomendações do fabricante. Em seguida, o chá pronto foi filtrado por gravidade em papel de filtro e o volume concentrado a 250mL por meio de fervura.

Café: a extração dos HPAs foi feita diretamente do pó de café e da bebida pronta para o consumo. Esta por sua vez foi preparada de duas maneiras distintas: filtragem direta da água fervida sobre o pó de café e fervura do pó com a água antes da filtração, reproduzindo em ambos os processos a proporção caseira de café/água normalmente utilizada. Apesar da maioria dos consumidores não ferver o pó de café junto com a água antes da filtração, esta técnica ainda é utilizada por muitos consumidores, o que determinou sua inclusão no estudo.

Para o preparo do café coado, em processo direto, 25g de pó foram transferidos para um funil de vidro com papel de filtro, através do qual se escoaram 250mL de água destilada fervente. Para o café fervido, as mesmas quantidades de pó e água foram aquecidas até fervura antes da filtração.

2.3 – Procedimento analítico

Dez HPAs foram selecionados para a determinação nas amostras de chá e café: fluoranteno (Flu), pireno (Py), benzo(a)antraceno (B(a)A), criseno (Chy), benzo(e)pireno (B(e)P), benzo(b)fluoranteno (B(b)F), benzo(k)fluoranteno (B(k)F), benzo(a)pireno (B(a)P), dibenzo(ah)antraceno (D(ah)A) e benzo(ghi)perileno (B(ghi)P). Desses, segundo o IARC [7], B(a)A, B(b)F, B(k)F, B(a)P e D(ah)A são comprovadamente carcinogênicos em animais experimentais. O B(a)P e B(e)P foram obtidos, respectivamente, da Sigma e da Aldrich Chemical Co., enquanto que os demais padrões foram adquiridos da Supelco Inc.. Todos os solventes utilizados na extração foram da marca Mallinckrodt, grau cromatográfico (CLAE).

2.3.1 – Saponificação, extração e purificação do extrato

A etapa de saponificação foi realizada de acordo com o procedimento descrito por HISCHENHUBER & STIJVE [6] para a determinação de benzo(a)pireno em café.

a) pó de café

Pesaram-se 25g de pó em um balão de fundo redondo de 500mL. Adicionaram-se 200mL de KOH etanólico 1,0mol/L e o material permaneceu sob refluxo por 40 minutos. Em seguida, adicionaram-se pelo condensador 200mL de cicloexano permitindo-se uma ebulição de mais 5 minutos. Após a solução atingir a temperatura ambiente, o material saponificado foi transferido para um funil de separação de 1L. Adicionaram-se 200mL de água e agitou-se o funil por aproximadamente 2 minutos. Após esse procedimento, o funil ficou em repouso para permitir a separação das 2 fases (aquosa e orgânica). Descartou-se a fase aquosa e o extrato orgânico foi lavado com 3 porções de água.

b) bebida pronta (café e chá-mate)

Uma alíquota de 200mL de bebida foi transferida para um balão de fundo redondo de 500mL. Dissolveram-se 11,2g de pastilhas de KOH e o material ficou sob refluxo durante 30 minutos. Após o resfriamento do mesmo, adicionaram-se 100mL de KOH etanólico 1mol/L mais 200mL de cicloexano pelo condensador. Ebuliu-se a mistura por mais 30 minutos e procedeu-se da mesma forma como descrito para o pó.

O material saponificado obtido em a) e b) foi submetido à partição líquido-líquido com dimetilformamida-água (9:1, v/v) e a seguir purificado por cromatografia em coluna de sílica-gel, como descrito por SPEER et al. [16]. Todas as amostras foram analisadas em duplicata.

2.3.2 – Desenvolvimento cromatográfico

As análises dos compostos foram feitas por cromatografia líquida de alta eficiência (CLAE), utilizando-se um cromatógrafo Waters constituído por bomba quaternária modelo 600, injetor automático modelo 717 e detector de fluorescência modelo 474, operando com comprimentos de onda de excitação/emissão de 290/430nm. Em todas as separações utilizou-se coluna cromatográfica C18 (5mm, Vydac 201 TP) de 25cm x 4,6mm d.i., acoplada a uma coluna de guarda também de 5mm (0,46mm x 1,0cm), ambas termestáveis a 30ºC. As amostras foram injetadas (30mL) no cromatógrafo e eluídas com acetonitrila-água (75:25, v/v), a uma vazão constante de 1,0mL/minuto. Os sinais foram registrados em integrador Spectraphisics (modelo SP4400), acoplado ao sistema cromatográfico. A quantificação dos HPAs foi feita por padronização externa. O limite de detecção foi calculado segundo MILLER & MILLER [15].

Os HPAs foram identificados por comparação dos tempos de retenção dos picos obtidos com os dos respectivos padrões nas mesmas condições de análise, por adições padrão com a sobreposição dos cromatogramas (co-cromatografia) e através dos espectros de absorção obtidos com a utilização de detector de arranjo de diodos.

2.3.3 – Recuperação

Os testes de recuperação foram feitos adicionando-se quantidades conhecidas de cada HPA à amostras de café, por ser esta uma matriz mais complexa do que a de chá-mate. As análises foram feitas em duplicata.

2.4 – Estimativa da ingestão de HPAs

A ingestão diária média de HPAs (mg/pessoa/dia) pela população de Campinas foi calculada multiplicando-se as quantidades de chá-mate e café consumidas (g/pessoa/dia), pela concentração média de cada HPA (mg/kg) determinada nesses produtos.

3 – RESULTADOS E DISCUSSÃO

3.1 – Dados Analíticos

A utilização dos procedimentos analíticos recomendados por HISCHENHUBER & STIJVE [6] e SPEER et al. [16] resultou em recuperação na faixa de 66,9 a 99% para os diferentes HPAs. Apesar da grande variabilidade, os resultados podem ser considerados satisfatórios para a determinação dos HPAs em níveis de mg/kg, uma vez que os coeficientes de variação obtidos individualmente foram menores do que 10% (Tabela 2).

A Tabela 3 compara os teores médios de HPAs extraídos do pó de café e da bebida pronta. Essas duas formas de preparo foram incluídas no estudo pois para o consumidor é importante saber o quanto é ingerido através da bebida e ainda é hábito de muitas pessoas, ao fazer o café, ferver o pó junto com a água.

A quantidade de HPAs totais encontrada no café coado por processo direto (3,06mg/kg) foi bem menor do que aquela obtida diretamente pela extração do pó (20,04mg/kg), concordando com dados obtidos anteriormente por outros pesquisadores para o benzo(a)pireno [6,9]. Por outro lado, quando o pó foi fervido junto com a água durante o preparo do café, a quantidade de HPAs individuais e totais presentes na bebida foi muito próxima da quantidade existente no pó, indicando que a técnica de preparo influencia na extração dos contaminantes.

Estudos feitos por HISCHENHUBER & STIJVE [6] demonstraram que a presença da cafeína faz com que a solubilidade do benzo(a)pireno em água aumente bastante, devido à formação de um complexo benzo(a)pireno-cafeína, que é solúvel em água. Conforme citado pelos mesmos autores, esse fenômeno já havia sido explorado por GERTZ (1981), que utilizou 15% de cafeína em solução de ácido fórmico na extração aquosa de benzo(a)pireno a partir de vários alimentos. Ainda, segundo HISCHENHUBER & STIJVE [6], embora vários autores tenham empregado diferentes condições de extração durante o preparo do café, todos consideraram que a cafeína presente no pó poderia arrastar o benzo(a)pireno e os demais HPAs para a bebida. Na tentativa de confirmar essa teoria, HISCHENHUBER & STIJVE [6] determinaram os níveis de benzo(a)pireno tanto no pó de café quanto na bebida pronta (café coado), utilizando no preparo desta diferentes proporções de café/água. As quantidades de benzo(a)pireno encontradas no pó de café variaram de 0,1 a 3,0 mg/kg, sendo que na bebida a concentração determinada foi menor do que 10ng/L [6]. Outros autores encontraram para o pó de café teores de benzo(a)pireno variando de 0,1 a 0,5mg/kg [9]. HISCHENHUBER & STIJVE [6], inclusive, contaminaram as amostras com o HPA de interesse, a fim de favorecer a formação do complexo solúvel, e também testaram a influência do conteúdo de cafeína na eficiência da extração. Para tanto, os autores extraíram o benzo(a)pireno de bebidas feitas com os cafés Robusta e Arabica que possuem, respectivamente, alto e baixo teor de cafeína. Em ambos os ensaios não houve diferença significativa na quantidade de benzo(a)pireno extraído.

Entretanto, CAMARGO & TOLEDO [3] evidenciaram que a quantidade de cafeína extraída de café fervido era 19 a 30% superior àquela obtida do café apenas coado. Esses dados sugerem que a fervura, procedimento não testado por outros autores, contribui para a formação do complexo solúvel HPA-cafeína, facilitando a passagem dos hidrocarbonetos para a bebida (Tabela 3).

A Tabela 4 mostra a concentração média de HPAs em amostras de chá-mate, que variou na faixa de <0,07 a 0,31mg/kg. Os níveis de contaminação foram baixos comparativamente ao café fervido, que apresentou maior número e concentrações mais elevadas de HPAs.

Os resultados obtidos concordam com observações feitas na literatura de que embora a erva-mate possa estar bastante contaminada com HPAs, estes são pouco extraídos para a bebida durante o processo de infusão [9, 17]. O mesmo parece não ocorrer com o chimarrão. MACHADO et al. [14] encontraram no chimarrão níveis de até 0, 22mg de benzo(a)pireno nos primeiros 250mL da bebida, valor que excede aproximadamente 90 vezes o limite máximo permitido para a água pura pela legislação brasileira (0,01ug/L) [2].

Segundo os mesmos autores, a presença de elevada concentração de benzo(a)pireno no mate se deve principalmente às características rudimentares do beneficiamento da erva, já que a etapa da sapecagem das folhas ainda é feita com chama direta da combustão incompleta da madeira [14]. Amostras de erva-mate submetidas a esse tipo de tratamento apresentaram níveis de benzo(a)pireno entre 15,35 e 91,07mg/kg [13].

Cabe ainda ressaltar que o chá-mate (especialmente a granel) apresenta baixo teor de cafeína e que, diferentemente do que se observou com o café, não houve aumento da extração deste alcalóide após fervura prolongada ou após um maior tempo de infusão da erva [4].

3.2 – Ingestão de HPAs

De acordo com a pesquisa realizada por CAMARGO, TOLEDO, FARAH [4], 75% dos indivíduos entrevistados consumiam diariamente cerca de 5 "cafezinhos", equivalentes à quantidade média diária de 284,50mL. Foram ainda identificados consumidores extremos, cujo consumo diário chegava a 2 litros de café. Ao contrário do observado em relação ao café, a maioria da população não tinha hábito de tomar chá. Entre os consumidores de chá (37%), a preferência recaía sobre o chá-mate, com um consumo médio de 263,34mL ou 2 xícaras por dia.

Com base nestes dados e nos teores médios de HPAs encontrados nos produtos analisados, estimou-se a ingestão média e máxima de HPAs através dos respectivos produtos, como mostra a Tabela 5.

Conforme os resultados apresentados, observa-se que a técnica de preparo do café influencia a maior ou menor ingestão de HPAs. Assim, o consumidor que tem por hábito ferver o pó de café junto com a água poderá estar consumindo cerca de 5,5 vezes mais HPAs totais do que aqueles indivíduos que tomam apenas o café coado. Quanto ao chá, sua contribuição como fonte de HPAs pode ser considerada pouco representativa, tendo em vista os baixos valores de ingestão identificados. Cumpre ressaltar que os dados de ingestão de HPAs através do chá não se aplicam aos consumidores de chimarrão os quais, conforme discutido anteriormente, parecem estar expostos à quantidades mais elevadas destes contaminantes. Neste sentido, recomenda-se que pesquisa semelhante seja realizada junto a esses indivíduos, de forma a avaliar a exposição aos HPAs através desta bebida.

Comparando-se com dados da literatura observa-se que a ingestão média diária de HPAs resultante do consumo de café coado equivale a quase o dobro daquela estimada por LODOVICI et al. [12] na Itália (0,15mg/pessoa/dia), podendo ser ainda maior caso se considere o café fervido.

4 – CONCLUSÕES

Os resultados apresentados indicam que o café pode ser uma importante fonte de HPAs para a população brasileira, embora outros autores não considerem esta bebida como uma fonte potencial destes contaminantes na dieta de seus respectivos países [6, 9]. Apesar dos dados de consumo utilizados na estimativa de ingestão tenham sido obtidos há algum tempo, o hábito de tomar café é tão característico de nossa cultura que se acredita que mudanças significativas neste hábito dificilmente tenham ocorrido desde então. Da mesma forma, como o chá não faz parte dos hábitos alimentares da população entrevistada, dificilmente esse perfil mudará a curto prazo.

5 – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

6 – AGRADECIMENTOS

À FAPESP, pela concessão de bolsa de doutorado no país, Processo 96/2045-4.

À FAPESP, pela concessão de auxílio financeiro à pesquisa, Processo 97/5535-5.

Recebido para publicação em 30/04/01.

Aceito para publicação em 11/09/01.

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  • Endereço para correspondência
    Mônica Cristiane Rojo de Camargo
    Faculdade de Engenharia de Alimentos
    Departamento de Ciência de Alimentos, Universidade Estadual de Campinas, CP 6121
    CEP 13087-970, Campinas, SP, Brasil
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      23 Abr 2003
    • Data do Fascículo
      Jan 2002

    Histórico

    • Recebido
      30 Abr 2001
    • Aceito
      11 Set 2001
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