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Avaliação ultrassonográfica de componentes umbilicais inflamados em bezerros da raça Holandesa com até 30 dias de vida1 1 Dissertação de Mestrado do primeiro autor pelo Programa de Pós Graduação em Clínica Veterinária na Universidade de São Paulo, São Paulo, SP.

Ultrassonographic avaliation of the inflamed umbilical structures in Holstein calves during their first 30 days of life

Resumo:

As afecções umbilicais merecem destaque entre as enfermidades que acometem bezerros no primeiro mês de vida, pela alta incidência durante essa fase da vida dos neonatos e pelas relevantes perdas econômicas, decorrentes da mortalidade, custos de tratamento e atendimento veterinário, além de sequelas que poderão determinar menores ganho de peso e produção leiteira. O diagnóstico dessas enfermidades muitas vezes é prejudicado pela dificuldade em se detectar os acometimentos das estruturas intra-abdominais do umbigo, o que afetará negativamente a escolha do tratamento mais adequado e o estabelecimento do real prognóstico para cada animal. No presente estudo, realizou-se a análise ultrassonográfica dos animais com inflamação/infecção dos componentes umbilicais sendo possível observar algumas características em relação a mensurações e ecogenicidade, presentes nos componentes umbilicais acometidos. A partir dessas avaliações concluiu-se que a medida mais adequada para identificar animais com possíveis processos inflamatórios nos componentes umbilicais é a espessura da parede dos vasos umbilicais quando comparada ao diâmetro dos mesmos. Ainda, o estudo possibilitou verificar algumas particularidades do comportamento dos componentes do cordão umbilical em bezerros sadios da raça Holandesa, bem como determinar que os vasos umbilicais intra-abdominais iniciam uma involução em porção mais interna e progridem para as extremidades próximas ao anel umbilical com o evoluir da idade. Destaca-se que o confronto desses resultados com aqueles poucos descritos na literatura disponível mostrou-se com notáveis diferenças.

Termos de Indexação:
Onfalopatia; ultrassom; bezerros neonatos; Holandesa; mensuração

Abstract:

Umbilical disorders deserve mention among the illnesses affecting calves in the first month of life. The high incidence during this phase of life of newborns and relevant economic losses arising from mortality, cost of treatment and veterinary care, beyond sequelae may determine lower weight gain and milk production. The diagnosis of these diseases is often hampered by the difficulty to detect the involvement of intra-abdominal umbilical structures, which negatively affect the choice of the most appropriate treatment and the actual outcome for each calf. In the present study, we performed ultrasound examinations of calves with inflammation/infection in the umbilical components and observed some characteristics related with measurements and echogenicity present in umbilical affected components. From these evaluation it was concluded that the wall thickness of the umbilical vessels is the more reliable standard to determine changes in these components, as compared with that of the diameter of the umbilical vessels. Furthermore, from this study we observed some peculiarities of involution of the intra-abdominal umbilical cord components in healthy Holstein calves used for the control group to characterize the behavior of the umbilical structures during the progress of the age in the newborns. It is noteworthy that the comparison of these results with those found in the rare literature available showed notable differences.

Index Terms:
Navel illness; ultrasound; newborn calves; Holstein; measurement

Introdução

As afecções umbilicais merecem destaque entre as doenças que acometem os bezerros no período neonatal, como demonstrado em levantamentos realizados em alguns Estados do Brasil, que revelaram grande incidência dessas enfermidades tanto em propriedades leiteiras como nas de corte, com variação de 28 a 42,2% (Miessa et al. 2002Miessa L.C., Amaral A., Botteon R.C.C.M. & Botteon P.T.L. 2002. Morbidade e mortalidade de bezerros leiteiros devido a processos inflamatórios do cordão umbilical. Hora Vet. 23(134):16-18., Reis et al. 2009Reis A.S.B., Pinheiro C.P., Lopes C.T.A., Cerqueira V.D., Oliveira C.M.C., Duarte M.D. & Barbosa J.D. 2009. Onfalopatias em bezerros de rebanhos leiteiros no nordeste do estado do Pará. Ciênc. Anim. Bras. 1:29-34.). Diante da premissa do cordão umbilical representar importante porta de entrada para microrganismos, as estruturas umbilicais são frequentemente acometidas por processos infecciosos e geram consideráveis perdas econômicas decorrentes da mortalidade (ao se desenvolver, não raramente, a bacteremia e a septicemia), custos de tratamento e atendimento veterinário, além de sequelas que poderão determinar menores ganho de peso e produção leiteira (Radostits et al. 2002Radostits O.M., Gay C.C., Blood D.C. & Hinchcliff K.W. 2002. Clínica Veterinária. 9ª ed. Guanabara Koogan, Rio de Janeiro. 1770p., Rengifo et al. 2006Rengifo S.A., Silva R.A., Pereira I.A., Zegarra J.Q., Souza M.M. & Botteon R.C.C.M. 2006. Isolamento de agentes microbianos a partir de amostras de sangue e umbigo de bezerros mestiços neonatos. Braz. J. Vet. Res. Anim. Sci. 43(4):442-447., Rodrigues et al. 2010Rodrigues C.A., Santos P.S.P., Perri S.H.V., Teodoro P.H.M., Anhesini C.R., Araújo M.A. & Viana Filho M.N. 2010. Correlação entre os métodos de concepção, ocorrência e formas de tratamento das onfalopatias em bovinos: estudo retrospectivo. Pesq. Vet. Bras. 30(8):618-622.).

A escolha do tratamento e o prognóstico das infecções umbilicais são estabelecidos na dependência do grau de comprometimento das estruturas umbilicais (extra e/ou intra-abdominais) e a presença ou não de complicações decorrentes da disseminação destas para outros tecidos (Trent & Smith 1984Trent A.M. & Smith D.E. 1984. Surgical management of umbilical masses with associated umbilical cord remnant infections in calves. J. Am. Vet. Med. Assoc. 185:1531-1534.). Para a obtenção de tais informações, são rotineiramente utilizados recursos semiológicos como o exame físico, com inclusão de cuidadosa palpação bimanual da região umbilical e abdominal, além de exames laboratoriais complementares, os quais demonstram limitações na identificação de alterações intra-abdominais, tanto nos componentes umbilicais propriamente ditos, como nos órgãos decorrentes das infecções ascendentes, como o fígado e bexiga. Tal fato leva o médico veterinário a lançar mão de outros métodos diagnósticos, como exame por imagens e laparotomia exploratória (Steiner et al. 1992Steiner A. , Flückiger M. & Örtle C.A. 1992. A modified technique for the marsupialization of umbilical vein abscesses with involvement of the liver in the calf: a review of thirteen cases (1987-1990). Vet. Surg. 3:184-189., Figueirêdo 1999Figueirêdo L.J.C. 1999. Onfalopatias de Bezerro. EDUFBA, Salvador. 94p., Dirksen 2005Dirksen G. 2005. Enfermedades del mesenterio, peritoneo y pared abdominal, p.618-625. In: Dirksen G., Grüner H.D. & Stöber M. (Eds), Medicina Interna y Cirugía del Bovino. Vol.4. Inter.-Médica, Buenos Aires. 1248p.). Por serem menos invasivos os recursos diagnósticos por imagem disponíveis, elegeu-se para tal finalidade a realização do exame ultrassonográfico pela praticidade e acessibilidade nas condições à campo (Behn et al. 2000Behn C. & Bostedt H. 2000. Technique of abdominal ultrasonography in newborn foals and normal findings. Berl. Münch. Tierärztl. Wochenschr. 113(9):335-343.), além de ser mais sensível para a verificação de acometimentos de estruturas umbilicais intra-abdominais em comparação com a palpação (Reef et al. 1989Reef V.B., Collatos C., Spencer P.A., Orsini J.A. & Sepesy L.M. 1989. Clinical, ultrasonographic, and surgical findings in foals with umbilical remnant infections. J. Am. Vet. Med. Assoc. 195(1):69-72. , Lischer & Steiner 1994Lischer C.J. & Steiner A. 1994. Ultrasonography of umbilical structure in calves. 2. Ultrasonography, diagnosis and treatment of umbilical diseases. Schweiz. Arch. f. Tierheilkd. 136:227-241., Flöck 2002Flöck M. 2002. Ultrasonic diagnosis of inflammation of the umbilical cord structures, persistent urachus and umbilical hernia in calves. Berl. Münch. Tierärztl. Wochenschr. 116(1/2):2-11., Steiner & Lejeune 2009Steiner A. & Lejeune B. 2009. Ultrasonographic assessment of umbilical disorder. Vet. Clin. North Am., Food Anim. Pract. 25:78-794.).

Destaca-se que apesar dessa notada importância do ultrassom como meio diagnóstico das onfalopatias, são escassos os estudos sobre o comportamento das estruturas umbilicais em involução fisiológica, em animais sadios da raça Holandesa (Lischer & Steiner 1993Lischer C.J. & Steiner A. 1993. Ultrasonography of umbilical structure in calves. 1. Ultrasonographic description of umbilical involution in clinically healthy calves. Schweiz. Arch. f. Tierheilkd. 135:221-230., Watson et al. 1994Watson E., Mahaffey M.B., Crowell W., Selcer B.A., Morris D.D. & Seginak L. 1994. Ultrasonography of the umbilical structures in clinically normal calves. Am. J. Vet. Res. 55:773-780.) e de Nelores (Sturion et al. 2013Sturion T.T., Sturion M.A.T., Sturion D.J. & Lisboa J.A.N. 2013. Avaliação ultrassonográfica da involução das estruturas umbilicais extra e intracavitárias em bezerros sadios da raça Nelore concebidos naturalmente e produtos de fertilização in vitro. Pesq. Vet. Bras. 33(8):1021-1032.), e que auxiliariam na avaliação e identificação das infecções umbilicais. Raros também são as publicações a respeito das mensurações e evidencias ultrassonográficas que caracterizassem alterações dos componentes umbilicais (Lischer & Steiner 1994Lischer C.J. & Steiner A. 1994. Ultrasonography of umbilical structure in calves. 2. Ultrasonography, diagnosis and treatment of umbilical diseases. Schweiz. Arch. f. Tierheilkd. 136:227-241., Steiner & Lejeune 2009Steiner A. & Lejeune B. 2009. Ultrasonographic assessment of umbilical disorder. Vet. Clin. North Am., Food Anim. Pract. 25:78-794.). Diante desse fato, delineou-se o objetivo da pesquisa, o qual foi de validar critérios para identificação, por meio do exame ultrassonográfico, de anormalidades umbilicais características dos bezerros com até 30 dias de vida, considerando-se animais com involução fisiológica e aqueles com processos inflamatórios dos componentes umbilicais nas suas diversas apresentações.

Material e Métodos

O projeto foi aprovado pela Comissão de Ética no uso de animais da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo (FMVZ/USP), protocolado sobre o número 2875/2013. Foram incluídos no estudo 36 bezerros, machos e fêmeas, da raça Holandesa, distribuídos em dois grupos experimentais: grupo controle, constituído por onze animais sem alterações umbilicais, alojados nas dependências da Clínica de Bovinos e Pequenos Ruminantes (CBPR) da FMVZ/USP, campus São Paulo, desde o nascimento até os 30 dias de vida; e grupo onfalopatia, constituído de 25 animais, criados em propriedade rural localizado na cidade de Araras, SP, com até 30 dias de vida.

Padronizou-se a antissepsia do umbigo para todos os bezerros inclusos no estudo, com uso de solução alcoólica de iodo a 5%, externa e internamente no primeiro dia, e externamente nos outros dias, uma vez por dia, até três dias de vida, sendo o primeiro tratamento realizado logo após o nascimento.

Todos os bezerros foram submetidos a avaliações diárias, por meio de exame físico geral (Feitosa & Benesi 2014Feitosa F.L. & Benesi F.J. 2014. Semiologia de animais recém-nascidos, p.69-97. In: Feitosa F.L. (Ed.), Semiologia Veterinária: a arte do diagnóstico. 3ª ed. Roca, São Paulo. 627p.) e específico da região abdominal (inspeção, palpação simples e bimanual), utilizando critérios estabelecidos por Figueirêdo (1999)Figueirêdo L.J.C. 1999. Onfalopatias de Bezerro. EDUFBA, Salvador. 94p. e Dirksen (2005)Dirksen G. 2005. Enfermedades del mesenterio, peritoneo y pared abdominal, p.618-625. In: Dirksen G., Grüner H.D. & Stöber M. (Eds), Medicina Interna y Cirugía del Bovino. Vol.4. Inter.-Médica, Buenos Aires. 1248p., os quais propuseram o decúbito lateral direito para realização da palpação bimanual nas direções ventrodorso-cranial e caudal, a fim de verificar possíveis alterações nos componentes umbilicais intra-abdominais, caracterizadas pelas seguintes anormalidades: aumentos de volume (difuso ou localizados), de sensibilidade e de temperatura locais; presença de aderências, consistências anormais (como flutuações e fibroses), de exsudatos ou urina eliminados pelo umbigo ou por fistulações.

A partir dos resultados desses exames físicos, os animais foram incluídos nos grupos retro mencionados, e posteriormente avaliados com o equipamento de ultrassonografia. No grupo controle foram realizados onze momentos de observação como segue: ao nascimento, aos dois dias pós nascimento (p.n.), aos três dias p.n., aos quatro dias p.n., aos cinco dias p.n., aos 10 dias p.n., aos 15 dias p.n., aos 17 dias p.n.; aos 20 dias p.n., aos 25 dias p.n. e aos 30 dias p.n.; enquanto no grupo onfalopatia, efetuou-se apenas um único exame com ultrassom realizado no momento imediatamente após a verificação das alterações umbilicais pelo exame físico. A avaliação ultrassonográfica da região do umbigo foi realizada em todos os animais, tendo como base o plano de exame proposto por Lischer & Steiner (1993)Lischer C.J. & Steiner A. 1993. Ultrasonography of umbilical structure in calves. 1. Ultrasonographic description of umbilical involution in clinically healthy calves. Schweiz. Arch. f. Tierheilkd. 135:221-230. e Buczinski (2002)Buczinski S.M.C. 2002. Étude clinique de cas de pathologie ombilicale chez le veau: comparaison de la palpation et de l'examen échographique. Thèse de Doctorat, École Vétérinaire de Maisons-Alfort., que abrangiam a região entre a cartilagem xifoide e a pelve, sendo as estruturas extra-abdominais do umbigo avaliadas em uma posição mediana do umbigo externo, e as intra-abdominais e órgãos adjacentes analisadas em sete posições, de acordo com o descrito na Figura 1. O gel de ultrassom foi utilizado topicamente a fim de aumentar o contato entre o transdutor e a superfície corpórea do animal, sem necessidade de tricotomia da região avaliada. Utilizou-se um aparelho de ultrassom (SonoSite®, modelo M-Turbo) com transdutor linear de frequência variando de 6 a 13 MHz.

Fig.1:
Posições adotadas para o exame ultrassonográfico das estruturas umbilicais extra-abdominais e intra-abdominais de bezerros. Posição ext = Região mediana do umbigo extra-abdominal; Posição 1 = Região imediatamente cranial ao anel umbilical; Posição 2 = Região mediana ao anel umbilical e o fígado; Posição 3 = Margem caudo-ventral do fígado; Posição 4 = Exploração do parênquima hepático; Posição 5 = Região imediatamente caudal ao anel umbilical; Posição 6 = Região imediatamente cranial ao ápice da vesícula urinária Posição 7 = Exploração da bexiga.

As imagens ultrassonográficas dos animais dos dois grupos (controle e onfalopatia) foram gravadas e avaliadas segundo o descrito por autores de referência (Lischer & Steiner 1993Lischer C.J. & Steiner A. 1993. Ultrasonography of umbilical structure in calves. 1. Ultrasonographic description of umbilical involution in clinically healthy calves. Schweiz. Arch. f. Tierheilkd. 135:221-230., Lischer & Steiner 1994Lischer C.J. & Steiner A. 1994. Ultrasonography of umbilical structure in calves. 2. Ultrasonography, diagnosis and treatment of umbilical diseases. Schweiz. Arch. f. Tierheilkd. 136:227-241., Steiner & Lejeune 2009Steiner A. & Lejeune B. 2009. Ultrasonographic assessment of umbilical disorder. Vet. Clin. North Am., Food Anim. Pract. 25:78-794.), de acordo com a ecogenicidade, formato da estrutura, observação do lúmen e presença de abscessos e/ou de outras alterações, e principalmente pelas mensurações do diâmetro e da espessura das paredes das estruturas umbilicais, efetuadas com uso do programa Java (ImageJ®). Nos cortes ultrassonográficos das estruturas umbilicais (transversais e longitudinais), as medidas dos diâmetros e da espessura de parede dos componentes umbilicais foram obtidas pela média de duas mensurações, quando possíveis, de maior e menor valor. Especificamente em relação as artérias umbilicais, foram obtidas as mensurações a partir das médias das medidas das artérias direita e esquerda, quando observadas.

Avaliou-se o grupo controle quanto a distribuição das observações das medidas de diâmetro total da estrutura umbilical (com sua parede) e de espessura da parede, em cada momento, para cada posição ultrassonográfica. Quando tais medidas não apresentavam distribuição normal utilizou-se as medidas em logaritimo natural (log).

De acordo com cada posição ultrassonográfica proposta foram construídas curvas de regressão linear com base nas medidas dos vasos umbilicais do grupo controle, estabelecendo-se o comportamento do diâmetro e espessura da parede dos vasos ao longo dos 30 primeiros dias de vida dos bezerros. Para as posições nas quais a curva de regressão foi significativa foram apresentadas as retas de regressão e gerados o intervalo de confiança de 95% (IC95%) e a equação da reta. Já para as posições nas quais a curva de regressão não foi significativa foram apresentados os gráficos de médias com IC95%.

Os resultados individuais das mensurações do grupo onfalopatia foram comparados com a curva de regressão ou com as médias das observações do grupo controle, admitindo-se como estruturas umbilicais inflamadas, quando os valores das medidas do grupo onfalite foram maiores que os valores de referência do grupo controle (representado pelas curvas de regressão ou médias dos animais do grupo controle junto ao IC95%) com idade similar. Os componentes umbilicais que se apresentaram com a valores dentro ou abaixo dos valores de referência do grupo controle ou mesmo aqueles que não foram passíveis de visualização, foram diagnosticados como em involução fisiológica parcial ou completa, respectivamente.

Realizou-se também a avaliação do componente umbilical segundo a ecogenicidade, de acordo com o estabelecido por Lischer & Steiner (1994)Lischer C.J. & Steiner A. 1994. Ultrasonography of umbilical structure in calves. 2. Ultrasonography, diagnosis and treatment of umbilical diseases. Schweiz. Arch. f. Tierheilkd. 136:227-241., Buczinski (2002)Buczinski S.M.C. 2002. Étude clinique de cas de pathologie ombilicale chez le veau: comparaison de la palpation et de l'examen échographique. Thèse de Doctorat, École Vétérinaire de Maisons-Alfort. e Steiner & Lejeune (2009)Steiner A. & Lejeune B. 2009. Ultrasonographic assessment of umbilical disorder. Vet. Clin. North Am., Food Anim. Pract. 25:78-794., os quais classificaram como possível alteração as estruturas que: (1) quando hipoecoicas, apresentavam-se com inflamação aguda, e (2) quando hipoecoicas com faixas ou pontos hiperecoicos ou quando hiperecoicas, com inflamação crônica. A presença de conteúdo na luz dos vasos foi utilizada como dado complementar a essa avaliação, sendo que conteúdos hipoecoicos foram considerados como sendo de possível fluido inflamatório, ou de coágulo sanguíneo.

A classificação dos processos de inflamação/infecção umbilical seguiu os critérios de Figueirêdo (1999)Figueirêdo L.J.C. 1999. Onfalopatias de Bezerro. EDUFBA, Salvador. 94p., sendo denominados como: onfalite, a inflamação da pele da região do cordão umbilical ou dos vasos somente restrita à porção extra abdominal; onfaloflebite, a inflamação intra-abdominal da veia umbilical; onfaloarterite, a inflamação intra-abdominal da(s) artéria(s) umbilical(is); uraquite, a inflamação intra-abdominal do úraco; onfaloarterioflebite, a inflamação intra-abdominal da(s) artéria(s) e veia umbilicais; Onfalouracoflebite, a inflamação intra-abdominal do úraco e da veia umbilical; Onfalouracoarterite, a inflamação intra-abdominal do úraco e da(s) artéria(s) umbilical(is); e panvasculite umbilical, a inflamação intra-abdominal de todos os componentes do cordão umbilical.

Uma análise de Análise de Sobrevivência ("Survival Analysis") dos componentes umbilicais foi realizada com intuito de inferir sobre a involução umbilical nos bezerros da raça Holandesa com até 30 dias p.n., a partir da identificação da porcentagem de animais em que não foram mais observadas as estruturas umbilicais, ao longo da idade, nas diferentes posições ultrassonográficas propostas.

A análise estatística e a preparação dos gráficos foram realizados com o software estatístico SAS 9.3 (SAS Institute, 2011SAS Institute.- 2011. SAS/STAT User's Guide. Version 9.3, SAS Institute Inc., Cary, NC.) e GraphPad 5 (GraphPad Software Inc, 2014GraphPad Software Inc. 2014. GraphPad Software, Inc. GraphPad Prism Users Guide. La Jolla, GraphPad Software, CA.) em nível de significância 0,05.

Resultados

Nos animais do grupo controle (11 animais), os sonogramas das veias umbilicais se apresentaram com formato arredondado a elíptico, com parede delgada hipoecoica, e lúmen largo de hipoecoico a anecoico, que, próximo ao anel umbilical se anastomosaram originando vaso único. Nos sonogramas do umbigo externo (Posição ext), de modo geral, houve uma diminuição progressiva das medidas dos vasos umbilicais, havendo dificuldades na visualização destas a partir do dia 20 p.n., com luz vascular menor e parede mais hiperecoica.

Observou-se uma diminuição progressiva das medidas das veias umbilicais (diâmetro e espessura de parede), havendo impossibilidade de visualização destas na porção mais próxima ao fígado (Posição 3) em 9,1% dos animais aos 15 dias, e em 45,46% a partir do 20 dia p.n., No entanto na Posição 2 a dificuldade de mensuração se iniciou apenas aos 30 dias p.n. em 27,28% dos animais, e, na porção mais próxima ao anel umbilical (Posição 1), o diâmetro e espessura de parede das veias foram mensuráveis em todos os animais até os 30 dias p.n., apesar da involução com redução do tamanho desses componentes.

As imagens ultrassonográficas das artérias umbilicais, do grupo controle, na Posição 5 apresentaram-se com um formato mais ovalado, parede hipoecoica e lúmen largo hipoecoico ou anecoico. Na Posição 6, as artérias umbilicais mostraram-se com formato arredondado, com parede hipoecoica e luz pequena ou imperceptível, por vezes hiperecoica. A involução fisiológica das artérias umbilicais foi evidente pela redução progressiva do diâmetro das suas medidas, percebida inicialmente na região mais próxima à bexiga (Posição 6) caracterizada pela impossibilidade de mensuração das estruturas a partir dos 15 dias p.n. em 9,1% dos animais, sendo que aos 30 dias p.n. essa dificuldade de visualização atingiu 18,19% e 27,28% dos animais em relação ao diâmetro e parede, respectivamente. Em contrapartida, em relação às artérias umbilicais na região mais próxima ao anel umbilical (Posição 5) o diâmetro e a parede das artérias foram mensuráveis até os 30 dias p.n. em todos os animais.

Durante a ultrassonografia do grupo controle o úraco foi encontrado em quatro dos 11 bezerros. No entanto, pode ser observado, no máximo, até o quinto dia de vida, em apenas um deles. Nos demais, apenas na primeira avaliação ultrassonográfica (1 dia p.n.). Caracterizava-se como uma estrutura disforme, vestigial, com parede delgada e hipoecoica, sem lúmen, em região próxima ao polo cranial da bexiga.

De modo geral no presente estudo, o diâmetro das veias umbilicais no grupo controle variou de 0,12 a 2,1cm, das artérias de 0,26 a 1,37cm e dos componentes do umbigo externo foi de 0,2 a 1,33cm. Em relação à espessura de parede dos vasos umbilicais obteve-se valores de 0,045 a 0,275cm para as veias umbilicais, de 0,05 a 0,295cm para as artérias umbilicais e de 0,04 a 0,24cm para os componentes do umbigo externo.

No grupo onfalopatia (25 bezerros) os animais apresentavam, à palpação abdominal, cordões cilíndricos, espessados e de consistência firme, exceto em dois animais com flutuações caracterizando presença de coleções líquidas: um com formação próximo à vesícula urinária, e outro com formação no umbigo externo; ambos com sensibilidade à manipulação. Ao exame físico geral, não se evidenciou manifestações sistêmicas (como a hipertermia) que caracterizassem um processo de bacteremia/septicemia, ou então alterações em outros tecidos ou órgãos, ou seja, complicações mais comuns decorrentes de uma infecção umbilical como poliartrites, abscessos hepáticos, etc. Na avaliação ultrassonográfica desse grupo foram encontrados variados tipos de alterações quando comparadas aos achados dos animais controles, os quais iam além dos maiores valores de mensurações, pois se caracterizavam, também, pela presença de diferentes ecogenidades de parede dos vasos e de conteúdo luminal.

Nos animais com aumentos de volume de consistência flutuante, à palpação (2/25), o exame ultrassonográfico revelou que as coleções líquidas envolviam os vasos umbilicais. O abscesso localizado na veia da porção externa do umbigo apresentou-se com cápsula espessa (hipoecoica) e bem definida, com conteúdo hipoecoico e homogêneo. O abscesso em artéria umbilical, próximo à bexiga, revelava também cápsula hipoecoica bem definida e com conteúdo heterogêneo e com partículas hiperecoicas.

Nos sonogramas dos demais animais com alterações das veias umbilicais, as paredes estavam espessadas e a ecogenicidade variava alternando-se de hiper a hipoecogênica (Fig.2). O lúmen vascular na maioria das vezes era hipoecoico, aumentado de tamanho, possivelmente pela presença de coágulo sanguíneo, ou mesmo fluido inflamatório. Em artérias umbilicais acometidas observou-se parede bem definida, espessa e com ecogenicidade semelhante àquela encontrada nas veias, variando de hiperecoica a hipoecoica. A luz vascular quando aumentada era hipoecoica (por provável coágulo sanguíneo ou fluido inflamatório), como a Figura 3, e quando reduzida era visualizada apenas como um centro hiperecoico.

Fig.2:
Sonogramas em bezerro demonstrando as veias umbilicais na Posição 1. (A) Veia umbilical em involução fisiológica (seta branca), apresenta parede delgada hipoecoica, e lúmen largo de anecoico. (B) Veia umbilical alterada (seta preta), apresenta parede espessada e hipoecoica com pontos hiperecoicos e luz vascular hipoecoica.

Fig.3:
Sonograma em bezerros com alterações em artérias umbilicais, na Posição 6. (A) Artérias umbilicais em involução fisiológica (setas brancas), simétricas, apresentam parede hipoecoica e luz pequena hipoecoica. (B) Artérias umbilicais não simétricas, uma artéria alterada (seta preta) apresenta parede hipoecoica homogênea e luz vascular aumentada com conteúdo hipoecoico e a outra artéria alterada (seta cinza) apresenta-se com parede hipoecoica, tendo porção interna mais hiperecoica e lúmen hipoecoico heterogêneo.

No exame ultrassonográfico de dois animais (Fig.4) dentre os estudados observou-se, entre as artérias umbilicais, uma imagem de estrutura disforme com parede bem definida, hiperecoica, com lúmen evidente (delgado e anecoico), e diâmetro aproximado de 1 cm, a qual foi definida como processo inflamatório no úraco (uraquite).

Fig.4:
Sonograma em bezerro com alteração em úraco (setas pretas), que se apresenta com parede bem definida, hiperecoica e lúmen evidente (delgado e anecoico), durante a avaliação por ultrassom na Posição 6, com observação de duas artérias umbilicais (A) e porção apical da vesícula urinária (VU).

Em nenhum dos animais do grupo onfalopatia foi observado, durante a avaliação ultrassonográfica das Posições 4 e 7, presença de abscessos ou outra alteração em parênquima hepático (Posição 4), bem como de alterações na bexiga (Posição 7).

Na avaliação da distribuição das observações revelou-se que os diâmetros das estruturas umbilicais em todas as posições ultrassonográficas não apresentaram comportamento normal, utilizando-se assim o log das medidas encontradas. Já as espessuras de parede dos vasos umbilicais, em todas as posições ultrassonográficas, tiveram comportamento normal.

Durante a confecção dos gráficos de regressão linear (Fig.5, 6 e 7) obteve-se que para as Posições 1, 5 e 6 de espessura da parede dos vasos umbilicais, a curva de regressão linear não foi significativa, culminando na utilização do gráfico de médias com IC95%. Entretanto em todas as Posições (Posição mediana do umbigo extra-abdominal - Posição ext, 1, 2, 3, 5 e 6) de diâmetro dos vasos e as demais posições de espessura de parede de vasos (Posição ext, 2 e 3) foram utilizadas as curvas de regressão com IC95%, e obtidas as equações da reta.

Fig.5:
Representação gráfica da curva de regressão linear (reta contínua) e intervalo de confiança (reta pontilhada) das medidas da espessura de parede e diâmetro dos vasos umbilicais na região de avaliação ultrassonográfica dos componentes extra-abdominais (Posição ext) nos animais do grupo controle com o evoluir da idade, com suas respectivas de equação da reta e r². As medidas das estruturas do grupo onfalopatia estão classificadas de acordo com a ecogenicidade (triângulo: inflamação aguda; quadrado: inflamação crônica; círculo: sem alteração inflamatória).

Fig.6:
Representação gráfica da curva de regressão linear (reta contínua) e intervalo de confiança (reta pontilhada) das medidas da espessura de parede e diâmetro das veias umbilicais intra-abdominais nas regiões de avaliação ultrassonográfica compostas pelas Posição 1, Posição 2 e Posição 3 nos animais do grupo controle com o evoluir da idade, com sua respectiva equação da reta e r². Para a medida de espessura de parede das veias umbilicais da Posição 1, a representação gráfica é das médias (reta contínua) e intervalo de confiança (reta pontilhada). As medidas das estruturas do grupo onfalopatia estão classificadas de acordo com a ecogenicidade (triângulo: inflamação aguda; quadrado: inflamação crônica; círculo: sem alteração inflamatória).

Fig.7:
Representação gráfica da curva de regressão linear (reta contínua) e intervalo de confiança (reta pontilhada) das medidas de diâmetro das artérias umbilicais na região de avaliação ultrassonográfica compostas pelas Posição 5 e Posição 6, nos animais do grupo controle com o evoluir da idade, com sua respectiva equação da reta e r². Representação gráfica das médias (reta contínua) e intervalo de confiança (reta pontilhada) das medidas de espessura de parede das artérias umbilicais na região de avaliação ultrassonográfica compostas pelas Posição 5 e Posição 6. As medidas das estruturas do grupo onfalopatia estão classificadas de acordo com a ecogenicidade (triângulo: inflamação aguda; quadrado: inflamação crônica; círculo: sem alteração inflamatória).

Na análise dessas representações gráficas observou-se uma diferença na distribuição dos resultados do grupo onfalopatia em relação a curva de regressão ou da média do grupo controle, conforme observado nas Figuras 5, 6 e 7. Obteve-se uma tendência da maioria das medidas das espessuras de parede do grupo onfalopatia estarem acima da curva de regressão ou das médias do grupo controle, como esperado nos processos inflamatórios, em contraposição a alguns valores de diâmetros que se apresentaram abaixo. Verificou-se que a variação de resultados das representações gráficas, nos quais os vasos estavam alterados na espessura de parede e normais em relação ao diâmetro, ocorreu por reações inflamatórias individuais que levam a grandes variações no diâmetro dos vasos. A partir disso adotou-se o parâmetro de espessura de parede vascular umbilical como indicador na determinação de inflamação dos componentes umbilicais.

Obteve-se diferenças nos resultados da avaliação ultrassonográfica e na palpação da região umbilical demonstradas na Quadro 1. Identificou-se durante a avaliação ultrassonográfica uma maior quantidade de estruturas umbilicais alteradas, dos quais 13 em veias umbilicais, três em artérias umbilicais, duas em úraco e uma em componentes umbilicais extra-abdominais.

Quadro 1:
Diagnóstico dos bezerros do grupo onfalopatia a partir da palpação da região umbilical e das observações ultrassonografias, segundo classificação de Figueirêdo (1999)Figueirêdo L.J.C. 1999. Onfalopatias de Bezerro. EDUFBA, Salvador. 94p..

Discussão

De acordo com a literatura consultada, poucos são os estudos que padronizaram as medidas das estruturas umbilicais em neonatos durante a involução fisiológica desses componentes (Lischer & Steiner 1993Lischer C.J. & Steiner A. 1993. Ultrasonography of umbilical structure in calves. 1. Ultrasonographic description of umbilical involution in clinically healthy calves. Schweiz. Arch. f. Tierheilkd. 135:221-230., Watson et al. 1994Watson E., Mahaffey M.B., Crowell W., Selcer B.A., Morris D.D. & Seginak L. 1994. Ultrasonography of the umbilical structures in clinically normal calves. Am. J. Vet. Res. 55:773-780., Sturion et al. 2013Sturion T.T., Sturion M.A.T., Sturion D.J. & Lisboa J.A.N. 2013. Avaliação ultrassonográfica da involução das estruturas umbilicais extra e intracavitárias em bezerros sadios da raça Nelore concebidos naturalmente e produtos de fertilização in vitro. Pesq. Vet. Bras. 33(8):1021-1032.) e que permitiriam a avaliação comparativa para identificação de anormalidades ao exame ultrassonográfico. Devido a essa escassez, utilizou-se as medidas das estruturas umbilicais do grupo controle ao invés dos dados padronizados apresentados na literatura para bezerros da raça Holandesa. O fato destes autores terem estabelecido medidas por meio de equipamento de ultrassom de menor qualidade, disponíveis na época em que essas pesquisas foram realizadas (em relação à resolução das imagens e à quantidade de recursos disponíveis), limitou-lhes a visualização das estruturas dos vasos.

A fim de possibilitar a comparação das medidas ultrassonográficas, adotou-se critérios semelhantes para a constituição dos dois grupos estudados (controle e onfalopatia), como a padronização em relação ao protocolo dos cuidados para a cura do umbigo (antisséptico e concentrações utilizadas, frequência e duração da aplicação desses cuidados), além da escolha da raça (Madigan 2002Madigan J.E. 2002. Diagnosis of umbilical disorders using ultrasound, p.285-288. In: Smith B.P. (Ed.), Large Animal Internal Medicine. 3rd ed. Mosby, St Louis. 1728p., Sturion et al. 2013Sturion T.T., Sturion M.A.T., Sturion D.J. & Lisboa J.A.N. 2013. Avaliação ultrassonográfica da involução das estruturas umbilicais extra e intracavitárias em bezerros sadios da raça Nelore concebidos naturalmente e produtos de fertilização in vitro. Pesq. Vet. Bras. 33(8):1021-1032.) e as posições ultrassonográficas pré-definidas. Nota-se que não foi padronizado o método de concepção pelos quais os bezerros advêm, sendo possível haver uma variação nas medidas dos componentes umbilicais, apesar de Sturion et al. (2013)Sturion T.T., Sturion M.A.T., Sturion D.J. & Lisboa J.A.N. 2013. Avaliação ultrassonográfica da involução das estruturas umbilicais extra e intracavitárias em bezerros sadios da raça Nelore concebidos naturalmente e produtos de fertilização in vitro. Pesq. Vet. Bras. 33(8):1021-1032. afirmarem que não há influência deste fator na involução umbilical propriamente dita.

Adotou-se a utilização de solução alcoólica de iodo 5%, pois trata-se de uma das substancias mais amplamente utilizada nas fazendas consultadas e por ser classificada como de boa eficiência antisséptica, apesar de poder ocasionar uma reação tecidual adjacente iatrogênica. Apesar de não haverem muitos estudos científicos específicos utilizando solução de iodo com essa mesma concentração, correlacionou-se à solução de iodo a 7%, a qual apresentou maior eficiência quando comparadas às soluções de menores concentrações (1 e 2%), como afirmado por Lavan et al. (1994Lavan R.P., Madigan J., Walker R. & Muller N. 1994. Effects of disinfectant treatments on the bacterial flora of the umbilicus of neonatal foals. Proc. AAEP Annual Convention, Vancouver, Canada, p.37-38.). O clorexidine tem um amplo espectro antimicrobiano e possui atividade sobre matéria orgânica, o que demonstrou sua eficiência na antissepsia do umbigo, mas possui a inconveniência do maior preço no mercado frente aos outros produtos disponíveis (Waltner-Toews Martin & Meek 1986Waltner-Toews D., Martin S.W. & Meek A.H. 1986. Dairy calf management, morbidity and mortality in Ontario Holstein herds. IV. Association of management with mortality. Prev Vet Med. 4(2):159-171.).

Em contraposição ao afirmado por alguns autores (Lischer & Steiner 1994Lischer C.J. & Steiner A. 1994. Ultrasonography of umbilical structure in calves. 2. Ultrasonography, diagnosis and treatment of umbilical diseases. Schweiz. Arch. f. Tierheilkd. 136:227-241., Watson et al. 1994Watson E., Mahaffey M.B., Crowell W., Selcer B.A., Morris D.D. & Seginak L. 1994. Ultrasonography of the umbilical structures in clinically normal calves. Am. J. Vet. Res. 55:773-780., Staller et al. 1995Staller G.S., Tulleners E.P., Reef V.B. & Spencer P.A. 1995. Concordance of ultrasonographic and physical findings in cattle with an umbilical mass or suspected to have infection of the umbilical cord remnants: 32 cases (1987-1989). J. Am. Vet. Med. Assoc. 206(1):77-82.) que recomendaram a manutenção do animal em estação como melhor posição para a realização do exame ultrassonográfico, pela maior facilidade da observação das estruturas (garantida pela proximidade destas com a parede abdominal), verificou-se que o decúbito lateral direito foi o mais adequado, tanto pela melhor contenção física do bezerro, como pela maior facilidade na visualização das estruturas umbilicais intra-abdominais, em especial a veia umbilical próxima ao fígado, com posição menos favorável e mais difícil para visualização quando o animal estava em estação. A maior facilidade para certas constatações em decúbito lateral foi também evidenciada em bezerros Nelore (Sturion et al. 2013Sturion T.T., Sturion M.A.T., Sturion D.J. & Lisboa J.A.N. 2013. Avaliação ultrassonográfica da involução das estruturas umbilicais extra e intracavitárias em bezerros sadios da raça Nelore concebidos naturalmente e produtos de fertilização in vitro. Pesq. Vet. Bras. 33(8):1021-1032.).

Devido à impossibilidade em fazer a tricotomia dos animais, para garantir o adequado contato entre o equipamento e a região avaliada, foi realizada a passagem do transdutor com grande quantidade de gel de ultrassom. Tal conduta não causou qualquer dificuldade na obtenção de imagem de boa qualidade, verificando-se maior praticidade nesta técnica sem retirada dos pelos, além de não haver necessidade de aplicação tópica de álcool (50º GL) e/ou de gel diluídos com água destilada, conforme recomendado por Sturion et al. (2013)Sturion T.T., Sturion M.A.T., Sturion D.J. & Lisboa J.A.N. 2013. Avaliação ultrassonográfica da involução das estruturas umbilicais extra e intracavitárias em bezerros sadios da raça Nelore concebidos naturalmente e produtos de fertilização in vitro. Pesq. Vet. Bras. 33(8):1021-1032..

Ao exame ultrassonográfico do grupo controle, a ecogenicidade da parede dos vasos, apresentou-se divergente dos achados em raças taurinas, observados por outros autores (Watson et al. 1994Watson E., Mahaffey M.B., Crowell W., Selcer B.A., Morris D.D. & Seginak L. 1994. Ultrasonography of the umbilical structures in clinically normal calves. Am. J. Vet. Res. 55:773-780., Lischer & Steiner 1993Lischer C.J. & Steiner A. 1993. Ultrasonography of umbilical structure in calves. 1. Ultrasonographic description of umbilical involution in clinically healthy calves. Schweiz. Arch. f. Tierheilkd. 135:221-230., Steiner & Lejeune 2009Steiner A. & Lejeune B. 2009. Ultrasonographic assessment of umbilical disorder. Vet. Clin. North Am., Food Anim. Pract. 25:78-794.), que destacavam hipoecogenicidade intensificada com o avançar da idade. No presente estudo, verificou-se o oposto, ou seja, aumento da ecogenicidade com o progresso da involução fisiológica desses vasos. No entanto, a variação na ecogenicidade destas estruturas comportou-se de acordo com os achados registrados por Sturion et al. (2013)Sturion T.T., Sturion M.A.T., Sturion D.J. & Lisboa J.A.N. 2013. Avaliação ultrassonográfica da involução das estruturas umbilicais extra e intracavitárias em bezerros sadios da raça Nelore concebidos naturalmente e produtos de fertilização in vitro. Pesq. Vet. Bras. 33(8):1021-1032. que utilizaram bezerros da raça Nelore.

Em relação aos diâmetros das veias umbilicais, pode verificar-se que eram maiores nas posições ultrassonográficas mais próximas à parede abdominal, quando comparada às mensurações em posições mais próximas ao fígado, comportamento que persistiu ao longo da involução desses vasos. Essa observação foi a mesma encontrada por autores que utilizaram bezerros de raças taurinas (Watson et al. 1994Watson E., Mahaffey M.B., Crowell W., Selcer B.A., Morris D.D. & Seginak L. 1994. Ultrasonography of the umbilical structures in clinically normal calves. Am. J. Vet. Res. 55:773-780., Lischer & Steiner 1993Lischer C.J. & Steiner A. 1993. Ultrasonography of umbilical structure in calves. 1. Ultrasonographic description of umbilical involution in clinically healthy calves. Schweiz. Arch. f. Tierheilkd. 135:221-230., Steiner & Lejeune 2009Steiner A. & Lejeune B. 2009. Ultrasonographic assessment of umbilical disorder. Vet. Clin. North Am., Food Anim. Pract. 25:78-794.), e diferente daquela constatada para bezerros Nelore, que apresentaram diâmetros menores quanto mais próximo ao anel umbilical (Sturion et al. 2013Sturion T.T., Sturion M.A.T., Sturion D.J. & Lisboa J.A.N. 2013. Avaliação ultrassonográfica da involução das estruturas umbilicais extra e intracavitárias em bezerros sadios da raça Nelore concebidos naturalmente e produtos de fertilização in vitro. Pesq. Vet. Bras. 33(8):1021-1032.). As espessuras da parede das veias umbilicais, por sua vez, mantiveram-se semelhantes por toda a extensão do vaso, como também observado por Sturion et al. (2013)Sturion T.T., Sturion M.A.T., Sturion D.J. & Lisboa J.A.N. 2013. Avaliação ultrassonográfica da involução das estruturas umbilicais extra e intracavitárias em bezerros sadios da raça Nelore concebidos naturalmente e produtos de fertilização in vitro. Pesq. Vet. Bras. 33(8):1021-1032., diminuindo com o evoluir da idade, porém de forma mais sutil quando comparado ao diâmetro. Apesar de se saber que a região intra-abdominal mais profunda pode sofrer influência da modificação da topografia dos pré-estômagos e do abomaso nessa fase de vida (Bélanger 2008Bélanger A.M. 2008. Echographie de l'ombilic chez le veau. Bull. Soc. Vét. Prat. de France 92(2):31-34.), observou-se pela análise de sobrevivência que a involução das veias umbilicais teve início na posição mais próxima ao fígado (Posição 3). Neste local, a impossibilidade de visualização ultrassonográfica começou mais recente, aos 15 dias p.n. quando comparada a posições mais próximas ao anel umbilical, sendo acompanhado progressivamente pela Posição 2 aos 30 dias p.n. e pela Posição 1, onde as veias umbilicais foram visualizados em todos os animais até o último dia de avaliação ultrassonográfica.

A observação das artérias umbilicais na Posição 5 no grupo controle confirma o visualizado em bezerros da raça Nelore (Sturion et al. 2013Sturion T.T., Sturion M.A.T., Sturion D.J. & Lisboa J.A.N. 2013. Avaliação ultrassonográfica da involução das estruturas umbilicais extra e intracavitárias em bezerros sadios da raça Nelore concebidos naturalmente e produtos de fertilização in vitro. Pesq. Vet. Bras. 33(8):1021-1032.), contrariando, no entanto, o conceito previamente firmado de que imediatamente após o nascimento as artérias sofreriam retração para o interior da cavidade abdominal, passando a ocupar posição distante e caudal ao anel umbilical (Noden & Lahunta 2001Noden D.M. & Lahunta A. 2001. Sistema cardiovascular. III. Sistema venoso e linfático, p.281-290. In: Ibid. (Eds), Embriologia de los Animales Domésticos. Acribia, Zaragoza.). Esse comportamento com retração para a cavidade abdominal foi destacado também nos exames ultrassonográficos realizados por Watson et al. (1994)Watson E., Mahaffey M.B., Crowell W., Selcer B.A., Morris D.D. & Seginak L. 1994. Ultrasonography of the umbilical structures in clinically normal calves. Am. J. Vet. Res. 55:773-780., Lischer & Steiner (1993)Lischer C.J. & Steiner A. 1993. Ultrasonography of umbilical structure in calves. 1. Ultrasonographic description of umbilical involution in clinically healthy calves. Schweiz. Arch. f. Tierheilkd. 135:221-230. e Steiner & Lejeune (2009)Steiner A. & Lejeune B. 2009. Ultrasonographic assessment of umbilical disorder. Vet. Clin. North Am., Food Anim. Pract. 25:78-794., que descreveram após uma semana de vida um término abrupto das artérias umbilicais cranialmente ao ápice da bexiga. Contudo no presente estudo houve a possibilidade de se mensurar esses vasos próximo ao anel umbilical até os 30 dias p.n. Tal fato pode ser justificado pois esses autores utilizaram, nos animais taurinos, equipamento ultrassonográfico que não permitiu a visualização das estruturas nessas posições.

Deve-se ressaltar que a tendência de regressão fisiológica das artérias, de iniciar a involução em posições mais distantes da parede abdominal (próximas a bexiga), foi semelhante ao comportamento observado nas veias umbilicais descrito anteriormente, permitindo a conclusão de que a involução dos vasos umbilicais nos taurinos se inicia em posições mais distantes ao anel umbilical, e oposto ao descrito em bezerros Nelore (Sturion et al 2013Sturion T.T., Sturion M.A.T., Sturion D.J. & Lisboa J.A.N. 2013. Avaliação ultrassonográfica da involução das estruturas umbilicais extra e intracavitárias em bezerros sadios da raça Nelore concebidos naturalmente e produtos de fertilização in vitro. Pesq. Vet. Bras. 33(8):1021-1032.), nos quais a regressão teve início mais precoce em região próxima ao anel umbilical. Isso aponta importante diferença racial no processo de involução fisiológica dos componentes umbilicais que pode influenciar nas variadas frequências de inflamações/infecções umbilicais observadas, quando estudadas raças de bezerros zebuínos e taurinos. Salienta-se que, invariavelmente, tais variações são justificadas por diferenças nos sistema de criação e manejo zootécnico. Esses achados sugerem ser decorrentes de características evolutivas e de adaptação peculiar de cada raça.

A identificação do úraco nos animais do grupo controle foi possível apenas no primeiro dia de vida, em contraposição aos achados propalados por Lischer & Steiner (1993)Lischer C.J. & Steiner A. 1993. Ultrasonography of umbilical structure in calves. 1. Ultrasonographic description of umbilical involution in clinically healthy calves. Schweiz. Arch. f. Tierheilkd. 135:221-230. e Watson et al. (1994)Watson E., Mahaffey M.B., Crowell W., Selcer B.A., Morris D.D. & Seginak L. 1994. Ultrasonography of the umbilical structures in clinically normal calves. Am. J. Vet. Res. 55:773-780.. Estes autores não conseguiram observar tal estrutura em nenhum dos bezerros taurinos sadios examinados, possivelmente pela qualidade inferior do equipamento de ultrassom utilizado na época da realização dos estudos. A possível explicação para a diferença encontrada em relação ao descrito por Sturion et al. (2013)Sturion T.T., Sturion M.A.T., Sturion D.J. & Lisboa J.A.N. 2013. Avaliação ultrassonográfica da involução das estruturas umbilicais extra e intracavitárias em bezerros sadios da raça Nelore concebidos naturalmente e produtos de fertilização in vitro. Pesq. Vet. Bras. 33(8):1021-1032., que destacaram o úraco tendo uma imagem de boa qualidade até os sete dias p.n., é a diferença racial, pois esses autores utilizaram neonatos exclusivamente zebuínos.

As curvas de regressão linear e a equação da reta permitem que se admita que a variação das medidas dos vasos umbilicais (de todos os diâmetros e das espessuras de parede nas Posições 2 e 3) decorrem da variação da idade. Já quando essas curvas não foram significativas, não foi possível identificar essa relação da diminuição ou aumento das medidas ao longo da idade, o que permite concluir que para as Posição 1, 5 e 6, não é observada diminuição da espessura da parede dos vasos ao longo do tempo, apenas uma mudança na ecogenicidade, possivelmente por alterações nos tipos celulares dessas estruturas (tecido cicatricial). Como, em relação as medidas de diâmetro dos vasos, foi possível utilizar as curvas de regressão linear e se obter a equação da reta, concluiu-se que esse parâmetro é mais adequado quando se pretende avaliar o comportamento das estruturas durante a involução fisiológica.

Os valores máximos de diâmetro encontrados no grupo controle foram diferentes dos apontados por Sturion et al. (2013)Sturion T.T., Sturion M.A.T., Sturion D.J. & Lisboa J.A.N. 2013. Avaliação ultrassonográfica da involução das estruturas umbilicais extra e intracavitárias em bezerros sadios da raça Nelore concebidos naturalmente e produtos de fertilização in vitro. Pesq. Vet. Bras. 33(8):1021-1032. que apontam valores máximos para neonatos Nelore de 10mm, 15mm e 20mm para veias, artérias e estruturas do umbigo externo, respectivamente, contra os 21mm, 13mm e 13mm do presente estudo. Tais diferenças podem ser raciais ou mesmo em função de diferenças do método de concepção, que é reconhecido como fator de interferência para ocorrência de enfermidades umbilicais, como o descrito por Rodrigues et al (2010)Rodrigues C.A., Santos P.S.P., Perri S.H.V., Teodoro P.H.M., Anhesini C.R., Araújo M.A. & Viana Filho M.N. 2010. Correlação entre os métodos de concepção, ocorrência e formas de tratamento das onfalopatias em bovinos: estudo retrospectivo. Pesq. Vet. Bras. 30(8):618-622., os quais evidenciaram vasos mais "calibrosos" em animais advindos de embriões produzidos in vitro.

Na palpação bimanual do grupo onfalopatia foram encontradas alterações nos componentes umbilicais, extra e intra-abdominais, com maior facilidade no diagnóstico de alterações no umbigo externo. Os achados de cordões aumentados na espessura e cilíndricos foram semelhantes aos encontrados na literatura consultada (Lischer & Steiner 1994Lischer C.J. & Steiner A. 1994. Ultrasonography of umbilical structure in calves. 2. Ultrasonography, diagnosis and treatment of umbilical diseases. Schweiz. Arch. f. Tierheilkd. 136:227-241., Steiner & Lejeune 2009Steiner A. & Lejeune B. 2009. Ultrasonographic assessment of umbilical disorder. Vet. Clin. North Am., Food Anim. Pract. 25:78-794.). Algumas dificuldades encontradas no exame durante a palpação, particularmente dos componentes umbilicais intra-abdominais, ocorreram pelos seguintes motivos: tensão de parede abdominal aumentada devido ao não condicionamento à manipulação; maior repleção abomasal devido à realização do exame pouco tempo após a alimentação; e animais maiores e com elevado peso ao nascimento.

No exame ultrassonográfico do grupo onfalopatia, as alterações no úraco foram observadas apenas em dois bezerros. No grupo controle, observou-se estrutura localizada entre as artérias umbilicais, no polo cranial ao ápice da bexiga, apenas no primeiro dia de vida; por sua vez, os relatos em animais das pesquisas de involução fisiológica referem que esta estrutura não foi observada em nenhum momento (Watson et al. 1994Watson E., Mahaffey M.B., Crowell W., Selcer B.A., Morris D.D. & Seginak L. 1994. Ultrasonography of the umbilical structures in clinically normal calves. Am. J. Vet. Res. 55:773-780., Lischer & Steiner 1993Lischer C.J. & Steiner A. 1993. Ultrasonography of umbilical structure in calves. 1. Ultrasonographic description of umbilical involution in clinically healthy calves. Schweiz. Arch. f. Tierheilkd. 135:221-230.). De acordo com os critérios propostos por Lischer & Steiner (1994)Lischer C.J. & Steiner A. 1994. Ultrasonography of umbilical structure in calves. 2. Ultrasonography, diagnosis and treatment of umbilical diseases. Schweiz. Arch. f. Tierheilkd. 136:227-241., que definem bezerros como portadores de processo inflamatório no úraco aqueles que apresentam estruturas de lúmen anecoico, parede hipoecoica homogênea e com mais de um centímetro de diâmetro entre o anel umbilical e a vesícula urinária, ambos os bezerros do presente estudo receberiam o mesmo diagnóstico de uraquite.

De modo geral, no grupo onfalopatia, as imagens ultrassonográficas das veias e das artérias alteradas se mostraram como estruturas de parede completamente hipoecoica; ou totalmente hiperecoica; ou hipoecoica com pontos hiperecoicos. Por sua vez, os sonogramas das veias e das artérias mostraram luz vascular com conteúdo hipoecoico, sugestivo da presença de coágulo sanguíneo ou de um acúmulo de líquido inflamatório ou purulento. A literatura consultada (Steiner et al. 1990Steiner A. , Flückiger M., Örtle C.A & Regi G. 1990. Urachal disorders in calves: clinical and sonographic findings, therapy and prognosis. Schweiz. Arch. f. Tierheilkd. 132(4):187-195., Lischer & Steiner 1994Lischer C.J. & Steiner A. 1994. Ultrasonography of umbilical structure in calves. 2. Ultrasonography, diagnosis and treatment of umbilical diseases. Schweiz. Arch. f. Tierheilkd. 136:227-241.) destacava que um conteúdo purulento denso produzia imagem de lúmen que, por ser em grande quantidade, determinava uma ampliação da luz do vaso. Tal fato dificultou a comparação dessas medidas dos diâmetros dos vasos umbilicais infeccionados, nesses estudos, com o grupo onfalopatia do presente trabalho, os quais também apresentaram estruturas inflamadas, mas sem conteúdo luminal exuberante. Supõe-se que essa variação de conteúdo luminal possa ocorrer devido à reação inflamatória individual, isto é, dependente da resposta imunológica local e do agente patogênico envolvido em cada situação. Isso demonstra que, diferente do que ocorreu nesses estudos prévios, há a possibilidade de o processo inflamatório ser menos reativo, o que não geraria essa reação exuberante e, portanto, não seria correto utilizar os valores de medidas dos doentes desses estudos prévios como parâmetro de onfalopatias, pois alguns animais podem ser admitidos, erroneamente, como em involução fisiológica dos componentes umbilicais.

A avaliação das representações gráficas (Fig.5-7) gerou uma controvérsia nos resultados, pois alguns vasos umbilicais alterados em relação a espessura de sua parede (isto é, com medida maior que o parâmetro do grupo controle) apresentavam-se normais no diâmetro. Notou-se que alguns desses casos a parede vascular possuía uma ecogenicidade característica de inflamação crônica, em que geralmente há substituição do endotélio por tecido conjuntivo (fibrose) e menor acúmulo de líquido (ou mesmo ausência) no lúmen vascular, o que geralmente gera um aumento da espessura da parede dos vasos mas, nem sempre, de seu diâmetro total. Nos outros casos de arbitrariedade dos resultados a parede vascular apresentavam alterações ecogênicas características de processo inflamatório agudo, provavelmente, por reações pouco reativas, que levaram a um aumento do endotélio vascular mas com pouco acúmulo de líquido inflamatório no lúmen vascular, o que não gerou aumento significativo no diâmetro do vaso. Essas constatações de que as reações inflamatórias individuais podem alterar muito o diâmetro dos vasos, justifica a escolha da mensuração da espessura da parede dos vasos umbilicais para identificação de estruturas afetadas, como realizado no presente estudo.

Durante a análise das medidas das artérias umbilicais no grupo onfalopatia (Fig.3), observou-se alguns animais que apresentavam alterações inflamatórias quanto ao sonograma do vaso (forma, ecogenicidade e características do conteúdo luminal). No entanto, estas alterações não eram evidenciadas quanto aos parâmetros de medida propostos, tanto de espessura da parede como de diâmetro. Tal fato deveu-se à utilização, neste trabalho, das médias dos valores observados nas artérias direita e esquerda, mesmo quando apenas uma dessas artérias mostrava-se alterada (visualizada pela assimetria dessas artérias e diferentes alterações ecogênicas). Isso demonstra uma necessidade de futuros estudos que realizem a avaliação individual de cada artéria, direita e esquerda, em animais sadios, para ser observada a involução fisiológica de cada lado e descartar uma possível variação entre essas.

As medidas de espessura da parede dos vasos observadas no estudo variaram pouco com o evoluir da idade do animal. Nas Posições externa, 2 e 3 é possível obter qual os valores de espessura em animais com regressão fisiológica, utilizando-se das equações da reta obtidas a partir da curva de regressão linear (presente nas Figuras 2 e 3). Porém as Posições 1, 5 e 6 pode se propor a utilização de uma média dos valores de espessura como parâmetro de animais controle, visto que a curva de regressão linear não foi significativa. Entretanto para se obter valores de referência em animais com involução fisiológica, são necessárias pesquisas a fim de identificar possíveis fatores que possam influenciar esses valores, como o método de concepção, soluções de assepsia do umbigo e medidas biométricas (peso, altura de cernelha e perímetro torácico).

A comparação entre os resultados obtidos por meio da palpação bimanual e da ultrassonografia dos componentes umbilicais (Quadro 1) revelou diferenças na eficiência entre estes métodos de exame semiológico realizados. Assim como o demonstrado em outros estudos (Buczinski 2002Buczinski S.M.C. 2002. Étude clinique de cas de pathologie ombilicale chez le veau: comparaison de la palpation et de l'examen échographique. Thèse de Doctorat, École Vétérinaire de Maisons-Alfort.; Bélanger 2008Bélanger A.M. 2008. Echographie de l'ombilic chez le veau. Bull. Soc. Vét. Prat. de France 92(2):31-34.), o exame por ultrassom foi mais eficaz e permitiu identificar animais com um maior número estruturas intra-abdominais alteradas (17/25). A maioria dessas alterações foram detectadas em veias umbilicais, ao contrário das observações de Bélanger (2008)Bélanger A.M. 2008. Echographie de l'ombilic chez le veau. Bull. Soc. Vét. Prat. de France 92(2):31-34. e Buczinski (2002)Buczinski S.M.C. 2002. Étude clinique de cas de pathologie ombilicale chez le veau: comparaison de la palpation et de l'examen échographique. Thèse de Doctorat, École Vétérinaire de Maisons-Alfort., os quais identificaram menor eficiência da palpação em casos de fibroses de artérias umbilicais, que estão frequentemente associadas à infecção do canal do úraco. No presente estudo, um equívoco possível de identificar somente pela ultrassonografia foi o observado em dois animais cuja palpação revelou alterações de estruturas umbilicais na porção caudal identificada em primeiro momento como artéria umbilical, porém posteriormente caracterizada como sendo uma concomitante inflamação em úraco.

A avaliação dos sonogramas do grupo onfalopatia resultou nas seguintes porcentagens dos diferentes processos inflamatórios dos componentes umbilicais: 16% com onfalite (4/25); 40% com onfalite/onfaloflebite (10/25); 8% com onfalite/onfaloarterite (2/25); 4% com onfaloarterioflebite (1/25); 24% com panvasculite (6/25); 8% com panvasculite/uraquite (2/25). Esses resultados divergiram do estudo de Reis et al (2009)Reis A.S.B., Pinheiro C.P., Lopes C.T.A., Cerqueira V.D., Oliveira C.M.C., Duarte M.D. & Barbosa J.D. 2009. Onfalopatias em bezerros de rebanhos leiteiros no nordeste do estado do Pará. Ciênc. Anim. Bras. 1:29-34. que encontraram menores porcentagens de estrutura umbilicais intra-abdominais provavelmente por esses estudo não utilizar o ultrassom para identificar as onfalopatias. Houve também diferenças nas proporções das alterações umbilicais encontradas por Buczinski (2002)Buczinski S.M.C. 2002. Étude clinique de cas de pathologie ombilicale chez le veau: comparaison de la palpation et de l'examen échographique. Thèse de Doctorat, École Vétérinaire de Maisons-Alfort. que observou metade dos animais com acometimento em úraco, provavelmente pelos modelos bovinos serem de raças taurinas, mas não necessariamente de Holandeses. O presente estudo apresentou frequência mais próxima ao observado no trabalho de Lischer e Steiner (1994)Lischer C.J. & Steiner A. 1994. Ultrasonography of umbilical structure in calves. 2. Ultrasonography, diagnosis and treatment of umbilical diseases. Schweiz. Arch. f. Tierheilkd. 136:227-241. os quais encontraram maiores porcentagens de onfaloflebite do que onfalites, porém não houve altas porcentagens de panvasculite, como verificado nesta pesquisa. Acredita-se que essa divergência nas frequências observadas deve-se, em parte, pelo fato de alguns desses estudos prévios terem sido realizados em outros países, com condições mesológicas de criação e manejo diferentes.

Conclusões

A avaliação ultrassonográfica de componentes umbilicais em bezerros Holandeses com até 30 dias de vida, submetidos a antissepsia umbilical com solução alcoólica de iodo à 5%, permitiu demonstrar a involução fisiológica progressiva com diminuição das medidas de diâmetro dos vasos umbilicais com o evoluir da idade.

Foi possível caracterizar as estruturas umbilicais em involução fisiológica em função do formato, ecogenicidade da parede e do conteúdo luminal, a partir da análise das imagens ultrassonográficas, além de identificar pela análise descritiva dos animais controle, a tendência dos vasos umbilicais intra-abdominais iniciarem a regressão em porções mais distantes ao anel umbilical e progredirem, com o evoluir da idade, a esse ponto de inserção.

A partir da reafirmação de que o exame ultrassonográfico foi o meio semiológico mais apropriado do que a palpação, para a identificação de alterações especialmente em relação a estruturas umbilicais intra-abdominais, verificou-se que a espessura de parede dos vasos umbilicais foi o parâmetro de medida mais confiável, se comparadas ao diâmetro, para observação dos processos inflamatórios dos componentes umbilicais.

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  • 1
    Dissertação de Mestrado do primeiro autor pelo Programa de Pós Graduação em Clínica Veterinária na Universidade de São Paulo, São Paulo, SP.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jun 2016

Histórico

  • Recebido
    09 Nov 2015
  • Aceito
    18 Abr 2016
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