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EDITORIAL

EDITORIAL

Entretanto, seremos ainda cientistas, se nos desligamos

da multidão? Os movimentos dos corpos celestes se

tornaram mais claros; mas os movimentos dos poderosos

continuam imprevisíveis para os seus povos. (p. 165)1 1 BRECHT, Bertolt. In: ______. Teatro completo, v. 6. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1999. p. 51-170.

Caras leitoras e leitores,

Neste primeiro editorial que escrevo em Cadernos de Pesquisa, cabe destacar o desafio de substituir a colega Elba Siqueira de Sá Barretto, que por 20 anos esteve nessa função, desde o n. 85, de maio de 1993, até o n. 147, o último de 2012. Elba, agora, continua a sua contribuição como membro da Comissão Editorial. A preparação para essa substituição foi feita cuidadosamente, desde maio de 2011, quando ingressei como editor executivo, até outubro do ano passado. A partir daquele mês, iniciaram-se os preparativos deste primeiro número de 2013. Participei ainda, como editor-responsável, da reunião do Fórum de Editores de Periódicos da Educação – Fepae, durante a 32ª Reunião Anual da Anped, e cuidei da elaboração do projeto para a Chamada para apoio aos periódicos científicos brasileiros, do CNPq e da CAPES, que foi contemplada (processo n. 405785/2012-7). A Editoria Executiva também sofreu alterações no final do ano, com a entrada de Yara Lúcia Espósito e Gisela Lobo B. P. Tartuce, permanecendo Albertina de Oliveira Costa e Claudia Davis. Comissão e Conselho Editorial também começam a passar por mudanças, com a passagem de Zilma de Moraes Ramos de Oliveira para o Conselho e a entrada de Lívia Maria Fraga Vieira na Comissão. Outras mudanças, a partir deste número, são as inclusões do resumo em espanhol e de três novos indexadores: SciVerse SCOPUS; EZB – –Elektronische –Zeitschriftenbibliothek/Electronic Journals Library; e Edubase – –FE/Unicamp.

Desde o primeiro número, com único artigo, de Aparecida Joly Gouveia, sobre a pesquisa educacional no Brasil, Cadernos de Pesquisa cunhou sua marca de referência na divulgação de estudos e pesquisas relevantes e de temas emergentes na pesquisa educacional e social. O periódico agrega à temática escolar estudos que abordam questões relacionadas a políticas sociais, gênero, trabalho, família, relações raciais, grupos etários. Os enfoques também são abrangentes e envolvem as diferentes áreas de conhecimento das ciências humanas, em perspectivas teóricas e metodológicas diversas, revisões de literatura etc.

Esse caminho continuará a ser trilhado. Entende-se que é necessário compreender a educação de forma ampla, no quadro das relações sociais, proporcionando uma leitura pluridisciplinar que oxigene a reflexão no interior das várias disciplinas. Embora as pesquisas se façam segundo diferentes opções teóricas e metodológicas, a consistência no tratamento das informações possibilita o intercâmbio entre posições divergentes, tendo em vista que a produção do conhecimento funda-se em procedimentos rigorosos, que necessitam de consistência e racionalidade, constituindo uma história que não pode sofrer os descartes da apreciação aligeirada de modismos passageiros.

Neste número, a temática da avaliação, considerada como de grande relevância na última reunião de nossa Comissão Editorial, aparece em destaque e em debate. De um lado, o Tema em Destaque se ocupa da avaliação da qualidade da Educação Infantil, com artigos de Maria Malta Campos, Fúlvia Rosemberg, Thelma Harms, Richard Clifford e Edward Melhuish. De outro lado, nos Temas em Debate, as políticas de –accountability são tratadas por Luiz Carlos de Freitas e por Nigel Brooke. As apresentações, de Eliana Bhering e Beatriz Abuchaim, no primeiro caso, e de Adriana Bauer, no segundo, contextualizam a composição dos artigos, que trazem questões candentes para a área da educação. Ressoa, em todas essas leituras, a importante consideração de Campos, em relação à nossa sociedade desigual, refletida na expansão dos sistemas escolares, que não garante a mesma educação a todos ou a quase todos, educação que nem sempre corresponde às demandas e necessidades dos diversos grupos sociais, culturais e étnicos.

Sinaliza-se aqui a necessidade de aproximação entre a Educação Infantil e os outros níveis da Educação Básica, mesmo que as especificidades precisem ser levadas em conta. Embora a Constituição de 1988 tenha incorporado a Educação Infantil à estrutura educacional, fruto da demanda de educadores e do movimento social, as distâncias ainda permanecem, tanto no interior das disciplinas (da História à Didática), quanto nas articulações entre os grupos vinculados aos diferentes níveis. Isso tem implicações que fundamentalmente incidem sobre as crianças que frequentam, ou deveriam frequentar creche, pré-escola e ensino fundamental. A ampliação do ensino fundamental para nove anos de duração, com o ingresso das crianças de seis anos de idade, já provocou inúmeros problemas que têm sido debatidos, investigados e analisados, entre eles, a resistência a se incorporar a contribuição que poderia ser dada pelo avanço nas pesquisas sobre a educação das crianças pequenas. A iminência da obrigatoriedade da pré-escola, a partir dos quatro anos de idade, decorrente da Emenda Constitucional n. 59, anuncia novos problemas que poderão afetar da creche ao ensino médio. São essas questões objetivas que exigem maior conversa da área educacional, que não pode olhar a distância as transformações que ocorrem na realidade, com o andar das políticas.

O artigo de Maria Fernanda Rezende Nunes, Patrícia Corsino e Sonia Kramer compara informações sobre políticas municipais de Educação Infantil, no Rio de Janeiro, em 1999 e 2009, indicando avanços na expansão das matrículas nas creches públicas, bem como na organização e funcionamento das Secretarias. No entanto, questões relacionadas à formação cultural e às condições de trabalho de professores permanecem na agenda das demandas a serem atendidas.

A autoridade como ação legitimada ou como exercício da violência sobre as crianças é tema do artigo de Mariane Inês Ohlweiler e Rosa Maria Bueno Fischer, que se coaduna com o precedente, de Axel Horn, Mariela Helman, José Antonio Castorina e Marcela Kurlat, que trata do direito das crianças à privacidade nos intramuros das escolas, muitas vezes expostas com humilhação.

O artigo de Márcia Buss-Simão suscita o questionamento dos estereótipos maniqueístas de gênero, que obscurecem a sensibilidade, a afetividade e as emoções masculinas, assim como as dimensões guerreiras e heroicas femininas, ou então que minimizam a inspiração e o prazer proporcionado pelas diferenças. Se o texto trata de pesquisa que olha meninos e meninas na creche, nos interstícios do artigo de Maria Celeste Reis Fernandes de Souza e Maria da Conceição Ferreira Reis Fonseca também se pode refletir sobre essas questões, em um grupo de mulheres e homens que trabalham na dura condição de catadores, mas que encontram espaço, em sua associação, para frequentar a Educação de Jovens e Adultos e aí buscar se apropriar do conhecimento matemático escolar que, de algum modo, parece contribuir para as práticas de numeramento que enfrentam na sua vida sofrida.

No estudo comparado sobre a educação sexual no Brasil e em Cuba, de Denise Quaresma da Silva e Oscar Ulloa Guerra, identifica-se a dificuldade de a escola exercer o seu papel emancipador, furtando-se a tratar de questões como: homo, bi ou transexualidade; aborto; masturbação; o prazer e os sentimentos nas relações sexuais; a responsabilidade paterna e os atributos de gênero.

A assessoria ou supervisão às escolas é tratada por Ilich Silva-Peña, Isabel Salgado Labra e Ana Sandoval, com base no conceito de acompanhamento entre pares, que procura estabelecer essa relação externa com a escola respeitando e apoiando os atores fundamentais, que são as equipes dirigentes e docentes que trabalham diretamente na sala de aula.

O artigo de Verônica Toste Daflon, João Feres Júnior e Luiz Augusto Campos, por fim, faz uma análise de caráter exploratório das políticas de ação afirmativa praticadas no ensino superior público.

Para viabilizar o acesso a esse conjunto de textos, subjaz o trabalho de todas as profissionais da produção editorial, bem como das pes–soas envolvidas na avaliação dos artigos, na tradução e revisão de textos e resumos e na edição final. Espera-se que a leitura seja instigante.

Moysés Kuhlmann Jr.

  • 1
    BRECHT, Bertolt. In: ______.
    Teatro completo, v. 6. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1999. p. 51-170.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      25 Jun 2013
    • Data do Fascículo
      Abr 2013
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