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Ocorrência de larva migrans na areia de áreas de lazer das escolas municipais de ensino infantil, Araçatuba, SP, Brasil

Presence of larva migrans in sand boxes of public elementary schools, Brazil

Resumos

A areia das áreas de lazer de escolas podem constituir vias de transmissão para várias zoonoses parasitárias, representando risco potencial para as crianças que brincam nesses locais. Foi avaliada a ocorrência de agentes de larva migrans em 28 escolas municipais de ensino infantil de Araçatuba, SP. Foram colhidas 535 amostras de areia das áreas de lazer dessas escolas nos meses de janeiro (verão) e julho (inverno) de 1997 para estabelecimento da freqüência de isolamento de larvas e/ou ovos de Ancylostoma spp. e de ovos de Toxocara spp., pelos métodos de centrífugo-flutuação e de Baermann, respectivamente. A presença de larvas de Ancylostoma spp. foi observada, em pelo menos uma das amostras, em 35,7% (10/28) das amostras da primeira colheita (verão) e em 46,4% (13/28) quando da segunda colheita (inverno). Ovos de Toxocara spp. não foram encontrados e a presença de ovos de Ancylostoma spp. foi observada em 0,56% (3/535) das amostras.

Cuidado da criança; Saúde escolar; Larva migrans visceral; Larva migrans; Toxocara canis; Ancylostoma; Microbiologia do solo; Areia


There are sandboxes in public elementary school playground areas in Brazil, which can be harmful to children. They are at risk of cutaneous and visceral larva migrans infection caused by Ancylostoma spp. and Toxocara spp., respectively. The study was designed to investigate contamination by Toxocara spp. and/or their eggs and Ancylostoma spp. larvae in sand samples collected from the schools' sandboxes. Five hundred and thirty-five sand samples from 28 public elementary schools were collected during summer and winter and analyzed by both Baermann´s method and centrifugal flotation technique. Ancylostoma spp. larvae were found in 35.7% (10/28) schools in summer time and in 46.4% (13/28) schools in the winter time. Eggs of Toxocara spp. could not be recovered from the samples analyzed and eggs from Ancylostoma spp. were seen in 0.56% (3/535) of the samples.

Child care; School health; Larva migrans; Larva migrans; Toxocara; Ancylostoma; Soil microbiology; Sand


Ocorrência de larva migrans na areia de áreas de lazer das escolas municipais de ensino infantil, Araçatuba, SP, Brasil* * Pesquisa financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo ¾ Fapesp (Processo n o 97/09701-7) e pela Fundação Unesp (Processo n o 148/98-DFP).

Presence of larva migrans in sand boxes of public elementary schools, Brazil

Cáris M Nunes, Fernanda C Pena, Giuliano B Negrelli, Cristiano GS Anjo, Mauro M Nakano e Neusa S Stobbe

Departamento de Apoio, Produção e Saúde Animal do Curso de Medicina Veterinária da Universidade Estadual de São Paulo ¾ Unesp. Araçatuba, SP, Brasil

DESCRITORES
Cuidado da criança#. Saúde escolar#. Larva migrans visceral, transmissão#. Larva migrans, transmissão#. Toxocara canis, isolamento. Ancylostoma, isolamento. Microbiologia do solo. Areia. RESUMO:
A areia das áreas de lazer de escolas podem constituir vias de transmissão para várias zoonoses parasitárias, representando risco potencial para as crianças que brincam nesses locais. Foi avaliada a ocorrência de agentes de larva migrans em 28 escolas municipais de ensino infantil de Araçatuba, SP. Foram colhidas 535 amostras de areia das áreas de lazer dessas escolas nos meses de janeiro (verão) e julho (inverno) de 1997 para estabelecimento da freqüência de isolamento de larvas e/ou ovos de Ancylostoma spp. e de ovos de Toxocara spp., pelos métodos de centrífugo-flutuação e de Baermann, respectivamente. A presença de larvas de Ancylostoma spp. foi observada, em pelo menos uma das amostras, em 35,7% (10/28) das amostras da primeira colheita (verão) e em 46,4% (13/28) quando da segunda colheita (inverno). Ovos de Toxocara spp. não foram encontrados e a presença de ovos de Ancylostoma spp. foi observada em 0,56% (3/535) das amostras. KEYWORDS
Child care#. School health#. Larva migrans, visceral transmission#. Larva migrans, transmission#. Toxocara, isolation. Ancylostoma, isolation. Soil microbiology. Sand. ABSTRACT:
There are sandboxes in public elementary school playground areas in Brazil, which can be harmful to children. They are at risk of cutaneous and visceral larva migrans infection caused by Ancylostoma spp. and Toxocara spp., respectively. The study was designed to investigate contamination by Toxocara spp. and/or their eggs and Ancylostoma spp. larvae in sand samples collected from the schools' sandboxes. Five hundred and thirty-five sand samples from 28 public elementary schools were collected during summer and winter and analyzed by both Baermann´s method and centrifugal flotation technique. Ancylostoma spp. larvae were found in 35.7% (10/28) schools in summer time and in 46.4% (13/28) schools in the winter time. Eggs of Toxocara spp. could not be recovered from the samples analyzed and eggs from Ancylostoma spp. were seen in 0.56% (3/535) of the samples.

Nas escolas de ensino infantil, a areia das áreas de lazer pode constituir via de transmissão para várias zoonoses parasitárias, representando risco potencial para as crianças que brincam nesses locais. Dentre essas zoonoses estão a larva migrans visceral (LMV), causada principalmente pela migração de larvas de Toxocara spp. nos tecidos, e a larva migrans cutânea (LMC), causada pela migração de larvas de Ancylostoma spp. na pele.

Os seres humanos, especialmente as crianças, infectam-se ao ingerirem acidentalmente ovos larvados de Toxocara spp. presentes no solo, em fômites e em mãos contaminadas. Perversões do apetite, como a geofagia, são relatos freqüentes em pacientes com LMV, sugerindo que a contaminação ambiental é o melhor indicador do risco de a população humana contrair a infecção.1

A LMC manifesta-se quando larvas infectantes dos nematóides penetram na pele do homem e vagueiam no tecido subcutâneo provocando uma erupção linear e tortuosa da pele, geralmente muito pruriginosa. No Brasil, esta dermatose tem sido assinalada em vários Estados e freqüentemente está relacionada a pacientes que tiveram contato com areia de praias, de depósitos peridomiciliares ou de áreas de recreação.6

O grau de contaminação de solos por ovos de Toxocara spp. e/ou por larvas de Ancylostoma spp. tem sido objeto de estudo de vários pesquisadores. Entretanto, a maioria dos trabalhos pesquisa áreas externas, como praças e passeios públicos aos quais os cães e os gatos têm livre acesso.2,3

O objetivo do presente trabalho foi avaliar a ocorrência de agentes de larva migrans nas areias das escolas municipais de ensino infantil (EMEI) de Araçatuba por meio do estabelecimento da freqüência de isolamento de larvas e/ou ovos de Ancylostoma spp. e de ovos de Toxocara spp.

Colheram-se amostras de areia das áreas de lazer de 28 EMEI distribuídas em todos os bairros da zona urbana de Araçatuba, na proporção de uma amostra/15-20m2 do pátio de areia, perfazendo 535 amostras. A primeira colheita foi realizada no mês de janeiro de 1997 (verão) e a segunda no mês de julho do mesmo ano (inverno). As colheitas foram feitas preferencialmente em áreas úmidas e sombreadas, com auxílio de um tubo de PVC, a aproximadamente 5 cm de profundidade em relação à superfície. As amostras, com cerca de 100 g de areia, foram acondicionadas em sacos plásticos e conservadas em geladeira (4°C) para posterior processamento.

A recuperação das larvas foi realizada pelo método de Baermann modificado, utilizando-se 30 g de cada uma das amostras colhidas. Após o período de 16-18h, as larvas sedimentadas no fundo do cálice foram colhidas e colocadas em lâmina para visualização ao microscópio óptico.

A avaliação da presença de ovos de Toxocara spp. e de Ancylostoma spp. foi realizada pelo método de centrífugo-flutuação segundo Dada4 (1979), com modificações brevemente descritas a seguir: utilizou-se 10 g de areia de cada uma das amostras, as quais foram lavadas com água, sob agitação, por um minuto, em tubos plásticos de 50 ml. Após sedimentação por pelo menos seis horas, desprezou-se o sobrenadante e adicionou-se solução de dicromato de sódio (d=1.350) para promover a flutuação dos ovos, agitando-se por um minuto. A fim de aumentar a chance de visualização dos ovos, dividiu-se o conteúdo em quatro tubos de 15 ml. Após centrifugação (2.000 g, 5 min.), completou-se o volume dos tubos com a solução de dicromato de sódio até a borda, para a colocação das lamínulas. A leitura foi feita em microscópio óptico, após dez minutos.

A presença de larvas de Ancylostoma spp. em pelo menos uma das amostras colhidas foi observada em 35,7% (10/28) das EMEI, quando da primeira colheita (verão), e em 46,4% (13/28), quando da segunda colheita (inverno). Tal diferença revelou-se estatisticamente não significante.

Não se observou presença de ovos de Toxocara spp. em nenhuma das amostras de areia analisadas. A presença de ovos de Ancylostoma spp. foi observada somente em 0,56% (3/535) das amostras, todas provenientes de uma mesma escola na qual também se observou larvas do parasita. A baixa percentagem de ovos de Ancylostoma spp. encontrada no presente trabalho pode ter sido decorrente da liberação das larvas do parasita de dentro dos ovos, ocorrida anteriormente à colheita das amostras.

Beugnet & Gadat2 (1993) avaliaram a presença de ovos de Toxocara spp. e de larvas de Ancylostoma spp. em amostras de solo de áreas de lazer externas da Numéia, Nova Caledônia, e observaram 50% de positividade para Toxocara spp. e 40% de positividade para Ancylostoma spp. Costa-Cruz et al3 (1994) realizaram pesquisa de ovos de Toxocara spp. em solo de praças públicas da cidade de Uberlândia, MG, e observaram 23% de positividade. A alta percentagem de positividade encontrada por esses autores pode ter sido decorrente da contaminação oriunda não apenas de gatos como também de cães domésticos e errantes, já que se tratavam de áreas abertas. O presente trabalho avaliou amostras de áreas fechadas às quais somente gatos adultos têm acesso.

Em estudo sobre a freqüência de parasitas intestinais em amostras de fezes de gatos da região de Araçatuba, Farias et al5 (1995) observaram 21,9% (7/32) de positividade para ovos de Ancylostoma spp. e apenas 6,3% (2/32) para ovos de Toxocara spp., em gatos de todas as idades. Como os gatos adultos são os animais que têm acesso aos pátios de areia das EMEI, a ausência de ovos de Toxocara spp. pode ser explicada pela baixa infecção desses animais na idade adulta.

Em conclusão, a contaminação das areias das EMEI por Ancylostoma spp. é alta, aumentando o risco de as crianças adquirirem larva migrans cutânea. Porém, o risco de ocorrência de larva migrans visceral é mínimo, uma vez que não se observou a presença de ovos de Toxocara spp. nas amostras de areia analisadas.

Correspondência para/Correspondence to:

Cáris M. Nunes

Curso de Medicina Veterinária ¾ Unesp

Rua Clóvis Pestana, 793 Jd. D. Amélia

16050-680 Araçatuba, SP, Brasil

E-mail: caris@fmva.unesp.br

Edição subvencionada pela Fapesp (Processo no 00/01601-8).

Recebido em 10/1/2000. Reapresentado em 22/8/2000. Aprovado em 19/9/2000.

  • 1. Barriga OO. A critical look at the importance, prevalence and control of toxocariasis and the possibilities of immunological control. Vet Parasitol 1988;29:195-234.
  • 2. Beugnet F, Gadat R. Recherche d'eufs de Toxocara spp. et de larves d'Ankylostoma spp. dans le sol a Nouméa, Nouvelle-Calédonie. Rev Med Vet 1993;144:523-5.
  • 3. Costa-Cruz J, Nunes Rs, Buso AG. Presença de ovos de Toxocara spp. em praças públicas da cidade de Uberlândia, Minas Gerais, Brasil. Rev Inst Med Trop Săo Paulo 1994;36:39-42.
  • 4. Dada BJO. A new technique for the recovery of Toxocara eggs from soil. J Helminthol 1979;53:141-4.
  • 5. Farias NA, Christóvăo ML, Stobbe NS. Freqüęncia de parasitas intestinais em căes (Canis familiaris) e gatos (felis catus domestica) em Araçatuba, Săo Paulo. Braz J Vet Parasitol 1995;4:57-60.
  • 6. Lima WS, Camargo MCV, Guimarăes MP. Surto de larva migrans cutânea em uma creche de Belo Horizonte, Minas Gerais (Brasil). Rev Inst Med Trop Săo Paulo 1984;26:122-4.
  • *
    Pesquisa financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo ¾ Fapesp (Processo n
    o 97/09701-7) e pela Fundação Unesp (Processo n
    o 148/98-DFP).
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      07 Ago 2001
    • Data do Fascículo
      Dez 2000

    Histórico

    • Recebido
      10 Jan 2000
    • Revisado
      22 Ago 2000
    • Aceito
      19 Set 2000
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