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Editorial

2015 é um ano bastante significativo, em termos de efemérides, para os estudiosos da perspectiva dialógica da linguagem. Dentre elas, destaca-se, de imediato, o aniversário de Mikhaïl M. Bakhtin e Valentin N. Volochínov, dois dos mais conhecidos pensadores do Círculo: ambos nasceram em 1895 e, se vivos, estariam comemorando120 anos. Além disso, alguns importantes trabalhos também devem ser lembrados por sua primeira edição em russo. Há exatamente meio século, 1965, A Cultura popular na Idade Média e no Renascimento: o contexto de Rabelais(Творчество франсуа РабЛе и народная куЛЬтура средневековЬя и ренессанса) vinha à luz; há 40 anos, 1975, a coletânea Questões de literatura e de estética: a teoria do romance (ВопросЫ ЛитературЫ и эстетики: иссЛедования разнЫх Лет) oferecia os clássicos O problema do conteúdo, do material e da forma na arte verbal (пробЛема содержания, материаЛа и формЫ в сЛовесном), O discurso no romance (СЛово в романе), Da pré-história do discurso romanesco (Из предЫстории романного сЛова), Epos e romance: sobre a metodologia do estudo do romance (Эпос и роман(О методоЛогии иссЛедования романа)), Rabelais e Gogol: arte do discurso e cultura cômica popular (РабЛе и ГогоЛЬ(Искусство сЛова и народная смеховая куЛЬтура)); há 20 anos, 1995, foi publicado Sobre Maiakóvski1 1 BAKHTIN, M. M. Sobre Maiakóvski. In: BRAIT, B.(org.) Bakhtin: dialogismo e polifonia. Tradução do russo feita por Fátima Bianchi. São Paulo: Contexto, 2009, p.191-203. , sem título no original, por V. V. Kójonov, na revista Dialog. Karnaval. Khronotop [Diálogo. Carnaval. Cronotopo], intitulado Esboços para um artigo sobre V. V. Maiakóviski (Наброскам к статЬе о Маяковском). E há exatos 40 anos (1975), morria em Moscou M. M. Bakhtin.

Essas efemérides constituem o pano de fundo do número 10 (2) de Bakhtiniana, que ora publicamos. Reconhecendo que o Círculo sempre se ocupou da discussão dos fenômenos da linguagem, sem prescindir da ética e da estética, propusemos aos pesquisadores estudos e reflexões sobre linguagem, ética e estética, tema que perpassa o conjunto da obra bakhtiniana. Como sempre, acatamos trabalhos realizados não apenas sob a perspectiva dialógica do discurso, mas também aqueles fundamentados em outras concepções teórico-discursivas.

Como resposta a essa instigante proposta, foram submetidos inúmeros textos, advindos de variadas instituições nacionais e estrangeiras. Desse conjunto, nossos pareceristas de Língua Portuguesa e Língua Inglesa, a quem agradecemos o constante e inestimável trabalho, selecionaram 8 artigos e duas resenhas, provenientes de onze IES, 9 nacionais e duas estrangeiras.

Os dois primeiros artigos dedicam-se eminentemente a questões teóricas. O texto que abre o número - O que poderia significar o "Grande Tempo"? - é de Tatiana Bubnova, conhecida e reconhecida tradutora e estudiosa da obra bakhtiniana, professora da Universidad Nacional Autónoma do México (UNAM). Nele a autora discute um conceito fundamental e bastante complexo da obra do Círculo: o "Grande Tempo", considerando aspectos éticos e estéticos da noção e colocando-os em diálogo com experiências pessoais e profissionais. O segundo - Embate dialógico entre leitura e escrita: caminhos éticos a partir do Círculo bakhtiniano, de autoria de Angela Fanini (Universidade Tecnológica Federal do Paraná/UTFPR), apresenta a relação leitura-escrita, mostrando a ética discursivo-dialógica do processo a partir da compreensão das dimensões filosóficas de conceitos centrais do Círculo.

Outro conjunto de artigos trata, sobretudo, de questões ético-estético-culturais: música, comunicação midiática e literatura. Em termos de cultura popular, o texto A polêmica do samba entre Noel Rosa e Wilson Batista: a intertextualidade e os meandros da composição, de Mônica L. S. Fernandes (Universidade Estadual do Paraná/UNESPAR), Leandro M. da Luz (Faculdade Integrada de Campo Mourão/CIES) e Bruno F. L. Fagundes (Universidade Estadual do Paraná/UNESPAR), retoma interessantes aspectos da música e da história brasileira no período getulista. Ainda tratando de música, mas em perspectiva diversa, temos o artigo O papel da música nas atividades de trabalho, no qual Ana Raquel Motta (Faculdade de Campinas/ FACAMP; Pontifícia Universidade Católica de São Paulo/ PUCSP) mostra, de forma bastante inovadora, relações entre música e trabalho. Fazendo dialogar a cultura francesa do pós-guerra e a cultura da contravenção nos morros cariocas e enfocando a punição de delatores por meio de cabeças raspadas, o artigo Notas sobre uma estética do trauma, de autoria de João Kogawa e Anderson Salvaterra Magalhães, ambos da Universidade Federal de São Paulo/UNIFESP, aborda aspectos éticos e estéticos de uma prática que, distanciada no tempo e no espaço, se reinventa perversamente. Ainda neste conjunto, o artigo de Luiz Gonzaga Marchezan (Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho"/UNESP-Araraquara), intitulado Vozes no conto de Machado de Assis sobre um incêndio em Montevidéu, retoma diferentes vozes no conto machadiano, revelando diálogo original entre diferentes personagens da vida cultural e literária brasileira.

Os dois últimos artigos tratam de questões da educação e das redes digitais. Ética na perspectiva bakhtiniana e na formação crítica docente: uma experiência no estágio supervisionado de língua inglesa, de Viviane Pires Viana Silvestre (Universidade Estadual de Goiás/UEG); Carla Janaína Figueredo (Universidade Federal de Goiás/UFG); Rosane Rocha Pessoa (Universidade Federal de Goiás/UFG), lendo a prática docente pelas lentes dialógicas, apresenta reflexão sobre uma experiência singular na disciplina. E Cristian Berrio-Zapata, Fábio Mosso Moreira e Ricardo César Gonçalves Sant'Ana, todos da Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho"/UNESP, Marília, relacionam, de maneira pertinente e original, as redes digitais e os processos de mitificação a partir do conceito de mitologia de Roland Barthes, aliado a obra de outros pensadores.

Além dos artigos, este número de Bakhtiniana apresenta duas resenhas de obras recentemente lançadas e diretamente ligadas, do ponto de vista teórico e prático, ao tema linguagem, ética e estética: La palabra y el puño: perfiles de la retórica nazista en el Mein Kampf de Adolfo Hitler, de Gerardo Ramírez Vidal, e Discurso citado e memória - Ensaio bakhtiniano sobre Infância e São Bernardo, de Gilberto de Castro.

Agradecemos, mais uma vez, o auxílio que temos recebido do MCTI/CNPq/MEC/CAPES e da PUC-SP na edição do periódico Bakhtiniana. Revista de Estudos do Discurso, na certeza da produtividade acadêmica e científica da leitura.

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    BAKHTIN, M. M. Sobre Maiakóvski. In: BRAIT, B.(org.) Bakhtin: dialogismo e polifonia. Tradução do russo feita por Fátima Bianchi. São Paulo: Contexto, 2009, p.191-203.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    May-Aug 2015
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